Festa de Exu é demonstração de alegria e agradecimento pelas conquistas do ano
Noite no terreiro reúne muitos jovens, famílias com crianças e entidades incorporadas
A noite reúne todos em uma varanda de casa. Saias rodadas, pretas e vermelhas, acessórios na cabeça e até um homem de capa aparece pela frente. Em um sábado, no terreiro de Umbanda Reino da Mamãe Oxum, o som dos atabaques e os cantos deixam claro que a noite é de celebração bem brasileira.
O convite estava aberto ao público no Facebook como "Festa de Exu-2017". O nome faz referência a entidade que, por inúmeras vezes, tem seu nome associado a coisas ruins e até mesmo ao diabo, pela ignorância de quem não abre espaço para conhecer a religião.
Sempre de portas de abertas, o lugar é uma casa simples e quem chega é recebido com alegria por uma jovem, que se identifica como Camila e pede para todos ficarem à vontade. Ela nos permite fotografar com celular, mas com discrição para não incomodar quem chega e também não 'expor' as entidades ali presentes no ritual.
Algumas cadeiras são organizadas em fileiras para quem vem de fora sentar. O público é pequeno e aparentemente, se sente super à vontade. O que surpreende é a quantidade de jovens e também adultos com crianças, que prestam bem atenção nos rituais que acontecem na varanda.
No público, quem sente a energia dos cantos até começa a dançar na fila a espera do passe. Para a energia correr bem, é preciso tirar os sapatos para falar com uma das entidades. A conversa é abafada pelas canções que chegam para saudar Exu, sempre representado pelas cores vermelha e preta.
Nadya Arce da Silva, de 44 anos, é sacerdote e dona da casa onde trabalha espiritualmente. Com espaço aberto há 15 anos, ela diz que a festa é um agradecimento à entidade que ajudou nas batalhas travadas e também pelas conquistas deste ano. "É a nossa festa de encerramento e para nós, Exu é o nosso guardião. Entidade que abre nossos caminhos e nos acompanha, nos protege e livra de toda pertubação", esclarece Nadya. "Por isso, hoje é o dia dele. E nós fazemos uma homenagem para agradecer".
Bebidas, colares, pulseiras e maçãs colocadas à mesa são algumas oferendas também à pomba gira, outra entidade espiritual que faz parte da noite.
A dona da casa tem consciência que é preciso enfrentar a resistência de quem vem de fora e acha que tudo ali é "coisa do mal". "Não é fácil porque muita gente acredita que fazemos o mal a outras pessoas. E isso não é verdade. Mas por incrível que pareça, nesta casa, nunca tivemos problemas com nenhum dos vizinhos", afirma. E isso é real, enquanto a cantoria segue animada no terreiro, ao lado os vizinhos assistem televisão ou batem papo com as cadeiras na calçada.
Filha de pai protestante, Nadya enfrentou um longo caminho até chegar às religiões de matrizes africanas. "Era um preconceito que também existia em mim, eu achava que tudo isso era coisa do demônio. Mas quando meu pai faleceu eu não me encontrava em outro lugar, até que fui para o terreiro e estou até hoje".
O mesmo fez dona Leia de Sousa Feronato, de 49 anos, que levou a neta de cinco anos de idade para conhecer a festa. "Venho neste Centro há 2 meses e sempre me senti muito bem. Falo com os guias e os caboclos e agora trouxe a família. Principalmente porque hoje é dia de festa", diz.
Odilon Wagner da Silva, de 28 anos, segue na religião ao lado da mãe, Nadya, principalmente contra a desigualdade e intolerância. "As pessoas só precisam entender que também temos a nossa fé, apenas louvamos de um jeito diferente, assim como tantas outras religiões. E a festa é aberta para isso, para não esconder nossos rituais e dar a oportunidade a quem busca conhecer a casa".