Na região mais cara da cidade, boom imobiliário causa danos ambientais
As pistas de caminhada do Parque da Nações Indígenas, a ciclovia da avenida Afonso Pena e a diversidade da fauna e da flora. O combo "qualidade de vida" é o principal apelo comercial das construtoras para vender imóveis na região, a mais valorizada de Campo Grande, onde um apartamento de alto padrão pode chegar a custar R$ 2 milhões.
O boom imobiliário da região, que teve início com a Plaenge, incentivou investimentos de outras construtoras, como a paulista Helbor e a Construbase. Hoje, pelo menos 300 famílias moram em apartamentos de alto padrão no entorno do Parque das Nações, e pelo menos outros 250 estão em fase de obras.
Em 2010 - ano da entrega da última das quatro torres do condomínio Jardins do Jatobá, em frente ao Shopping Campo Grande - um temporal destruiu a Praça das Águas, vizinha do empreendimento. As avenidas Afonso Pena, Ricardo Brandão e a rua Ceará também foram tomadas pela água, e uma cratera literalmente engoliu o asfalto de três quadras da região.
O fato de a conclusão da obra coincidir com a enchente de grandes proporções não é coincidência. Na época, um estudo apontou que a Plaenge, até então soberana no mercado, já havia ocupado uma área que representaria 1% de toda a Bacia do Prosa; quatro anos depois, a ocupação fugiu ao controle e já não se sabe qual o impacto da urbanização no entorno do Parque.
Região complexa - Apesar de nos últimos anos a cidade estar lotada de novos empreendimentos, a região do Prosa é a mais complexa em termos de subsolo, o que exige projetos de drenagem diferenciado das demais, explica o arquiteto urbanista Ângelo Arruda. No entanto, acrescenta ele, a legislação municipal não trata das particularidades da área.
"Desde o bairro Mata do Jacinto até o Jardim Noroeste, são 40 mil hectares de subsolo com uma capacidade de absorção muito ruim. Qualquer obra a ser implantada ali tem que ter um projeto de drenagem muito eficiente. Mesmo sabendo disso, o poder público não criou mecanismos técnicos para que o empreendedor dê esse tratamento especial", afirma Arruda.
A ocupação do entorno começou há cerca de 15 anos, com o prolongamento da Afonso Pena, e mesmo tendo se intensificado recentemente, não há monitoramento ou elaboração de cartas de drenagem, ou outros documentos técnicos. "O assunto volta à tona só quando tem enchente e fica aquela correia. O certo seria ter um planejamento antes de autorizar qualquer obra. Mas, como não isso não aconteceu, que o poder público corra atrás do prejuízo agora, porque a tendência é piorar nos próximos anos: que façam um trabalho de reconhecimento com imagens de satélite, obtenham os impactos e notifiquem as empresas, com prazos para que cumpram os projetos de recuperação", sugere.
Poluição - Junto com o problema das enchentes, a urbanização no entorno do Parque tem outros desdobramentos: o assoreamento do córrego Prosa. Diretor da Ecoa (instituição campo-grandense voltada para ações ambientais), Alcides Faria explica que a impermeabilização excessiva do solo leva à poluição das águas. "Quando chove, ao invés de a água penetrar no solo, ela vai escoar, se concentrar, e levar os poluentes das ruas e sedimentos para córrego", aponta.
O biólogo cita, ainda, que o aumento da frota de veículos que passa a circular pela região é outra fonte de poluição. "Não é considerado pela sociedade, mas, a longo prazo, vai enterrando a preservação dos recursos naturais do parque. Não é proibido construir, mas que a lei estabeleça contrapartidas para as construtoras, que têm condições de estabelecer projetos de compensação ambiental, como o plantio de árvores", pondera Faria.