Pouca obra e muito problema: os males para quem cruza a rota dos treminhões
Na viagem, o trecho mais tortuoso é a quarenta e sete quilômetros de Água Clara
Rota da celulose, que respondeu por US$ 1 bilhão das exportações de Mato Grosso do Sul de janeiro a agosto, a BR-262 reserva uma viagem de solavancos, buracos e trepidações. Os usuários resumem a rodovia em uma palavra: “péssima”.
No trecho entre Ribas do Rio Pardo e Água Clara, por 92 quilômetros, 30 placas alertam para a circulação de veículos “longos e lentos” – os treminhões de nove eixos -, mas não há empenho proporcional para dar à via, condições seguras de circulação. O trecho mais tortuoso é a quarenta e sete quilômetros de Água Clara.
A equipe do Campo Grande News percorreu a rodovia na última sexta-feira (dia 10). Num cenário, em que o Cerrado vira eucalipto, em que se passa pelo canteiro de obras da Suzano, maior fábrica de celulose de linha única de eucalipto do mundo, a rodovia se divide entre pouca obra e muitos problemas.
No quilômetro 195, a viagem para por 20 minutos numa obra do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), formando uma fila de veículos. Depois, quando a distância de Água Clara cai para menos de 50 quilômetros, se potencializam a trepidação e o solavanco.
“A rodovia está péssima. É que passa muito nove eixos, são pesados demais”, diz o caminhoneiro Lucas Santos da Silva, 29 anos. “A BR-262 está péssima. À noite, está bem perigoso”, afirma o caminhoneiro Lucênio Mafra, que conduzia um caminhão que transporta maquinário de Campo Grande a São Paulo.
Caminho livre para excesso de peso
Outra constatação de quem está no trecho, é a ausência de balanças para monitorar o peso. Os treminhões que circulam pela via, vazios ou carregados de toras de eucalipto, chegam a 30 metros de extensão. A reportagem questionou o Dnit sobre os dispositivos existentes, mas não obteve resposta até a publicação da matéria.
De acordo com denúncia do MPF (Ministério Público Federal), que move ação contra o Dnit na Justiça Federal de Três Lagoas, o departamento informou que não há previsão de instalar balança fixa na BR-262, no trecho entre Três Lagoas e Água Clara. Ainda conforme dados da autarquia encaminhados à Procuradoria, houve duas ações de pesagem com unidades móveis: a primeira em dezembro do ano passado e a segunda em maio deste ano.
Na primeira ação, entre os dias 14 e 18 de dezembro, foram fiscalizados 70 veículos. Do total, 30 tinham excesso de PBT (Peso Bruto Total). Contudo, “todos constam como justificados, ou seja, sem atualização/fiscalização”.
De 24 a 28 de maio deste ano, de 71 veículos pesados, 39 circulavam com excesso de peso. Mais uma vez, “todos foram considerados justificados”. A ação pede que o Dnit seja obrigado a retomar obras nos 127 km entre Três Lagoas e Água Clara. O processo tramita desde o mês passado, ainda sem decisão.
O Campo Grande News solicitou ao Dnit dados sobre investimentos na BR-262 e as obras em curso. A reportagem também questionou a PRF (Polícia Rodoviária Federal) sobre as regras para circulação dos treminhões. Nos dois casos, não houve resposta.
Atenção constante
Engenheiro civil, especialista em infraestrutura rodoviária e conselheiro do Crea-MS (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Mato Grosso do Sul), Maurício Faustino Gonçalves avalia que a maior falha, que leva a atual situação da BR-262 , é a demora na manutenção. “A manutenção é essencial. Se tiver uma trinca, tem que correr, fazer fechamento com material asfáltico. Vedação para que não entre água. Entrando água na base, ocorre o afundamento, defeitos”.
De acordo com o especialista, esse pente-fino no asfalto se insere no Crema (Programa de Contratação, Restauração e Manutenção). Conservação é limpar o acostamento, não deixar água empossar nas canaletas. Já a restauração é o trabalho periódico de tapar buracos, vedar trincas.
A deterioração do asfalto segue o roteiro: fissura, trinca e buracos. Num trajeto de cidades com nomes líquidos – Ribas do Rio Pardo, Água Clara e Três Lagoas-, é preciso monitorar pontos com maior acúmulo de água.
Segundo o especialista, a via também deveria receber terceira faixa nos aclives (subidas). “Deixa o trânsito mais fluente e mais seguro. O caminhão entra para a direita e o carro leve passa”.
Outro ponto fundamental é o monitoramento do peso dos veículos, pois o pavimento é projetado para suportar um limite de carga.
“De Ribas para a frente, até Três Lagoas, é um perigo, um risco. E sempre tem problema. Precisa de investimentos. As fábricas, as plantações de eucalipto aumentaram muito nessa região. Agora, com a implantação da Suzano, em Ribas, não tem mais como questionar, o tráfego vai crescer e muito”.