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Quando a raiva é saudável?

Por Cristiane Lang (*) | 28/10/2024 13:31

A raiva, frequentemente vista como uma emoção negativa e destrutiva, pode, na verdade, ser saudável e transformadora quando compreendida e expressada de forma adequada. Raiva saudável não é aquela que explode sem controle ou que é reprimida até corroer por dentro, mas sim a que surge como uma resposta legítima a uma injustiça, um desrespeito ou uma frustração, e é canalizada de maneira produtiva.

O papel da raiva

A raiva é uma emoção natural, primitiva, que tem uma função importante na autopreservação. No passado, ela ajudava nossos ancestrais a responder a ameaças externas. Embora hoje não enfrentemos as mesmas ameaças físicas, a raiva ainda desempenha um papel na proteção dos nossos limites emocionais, sociais e até físicos. Ela nos alerta quando algo está errado, quando nos sentimos desrespeitados ou ameaçados, e, quando expressa de maneira construtiva, pode nos ajudar a corrigir essas situações.

No entanto, muitas pessoas têm uma relação complicada com a raiva. Ou aprendem que expressá-la é inaceitável, reprimindo-a até que ela se manifeste de maneiras prejudiciais, ou a deixam escapar de maneira descontrolada, causando danos a si mesmos e aos outros. O conceito de “raiva saudável” envolve encontrar um meio-termo, em que a raiva é reconhecida, sentida e expressa de maneira que sirva para resolver problemas e fortalecer relacionamentos, em vez de destruí-los.

Características da raiva saudável

    1.    Reconhecimento e validação: A primeira característica da raiva saudável é o reconhecimento de que ela existe. Muitas vezes, as pessoas se sentem culpadas ou envergonhadas por estarem com raiva, especialmente se foram ensinadas que essa emoção é inapropriada. A raiva saudável começa com a aceitação de que sentir raiva é uma reação legítima e natural a certas situações. Validar essa emoção é o primeiro passo para lidar com ela de forma produtiva.

    2.    Expressão assertiva: A raiva saudável envolve expressar o que se sente de maneira clara e assertiva, sem agressividade ou passividade. Isso significa comunicar os seus sentimentos e necessidades sem tentar intimidar ou manipular o outro. Por exemplo, em vez de gritar ou atacar alguém verbalmente, uma pessoa que expressa raiva saudável pode dizer: “Estou muito frustrado com o que aconteceu, e isso me fez sentir desrespeitado”. Essa abordagem busca resolver o problema em vez de escalá-lo.

    3.    Respeito pelos limites dos outros: Raiva saudável reconhece e respeita os limites dos outros. Mesmo em momentos de raiva intensa, é possível expressar o que se sente sem violar os direitos ou a dignidade de outra pessoa. Em vez de usar a raiva como uma ferramenta de controle, ela é vista como uma forma de estabelecer limites claros para si mesmo, ao mesmo tempo em que se mantém respeitoso com os outros.

    4.    Canalização positiva: A raiva saudável pode ser uma força impulsionadora para mudanças construtivas. Muitas grandes mudanças sociais e pessoais nasceram de um profundo senso de indignação e raiva justa. Quando canalizada para ações produtivas, a raiva pode inspirar pessoas a agir contra injustiças, lutar por seus direitos ou mudar situações que estão causando sofrimento. Ao invés de ser uma emoção destrutiva, a raiva pode ser o combustível que motiva ações transformadoras.

Quando a raiva se torna destrutiva

A raiva torna-se prejudicial quando não é expressa de maneira saudável. Existem dois extremos que representam o mau manejo da raiva: a repressão e a explosão.

    •    Repressão: Muitas pessoas acreditam que não têm o direito de sentir raiva ou que expressá-la é errado. Elas internalizam seus sentimentos, acumulando ressentimentos. A longo prazo, isso pode levar a problemas como depressão, ansiedade e até doenças físicas. Além disso, a raiva reprimida tende a surgir de maneiras inesperadas e prejudiciais, como explosões emocionais ou comportamentos passivo-agressivos.

    •    Explosão: Por outro lado, quando a raiva é liberada de forma descontrolada, ela pode ser extremamente destrutiva. Ataques verbais ou físicos, agressividade, insultos e comportamentos violentos são expressões de raiva não saudável. Essa forma de expressão danifica relacionamentos, causa arrependimentos e, muitas vezes, cria um ciclo de conflito e culpa que é difícil de romper.

Como cultivar a raiva saudável

    1.    Autoconhecimento: O primeiro passo para cultivar a raiva saudável é aumentar o autoconhecimento. Isso envolve aprender a identificar quando e por que você está com raiva. Pergunte-se: O que desencadeou minha raiva? Essa situação é uma repetição de algo que sempre me incomoda? Refletir sobre esses pontos ajuda a entender os padrões de comportamento e a reagir de maneira mais consciente.

    2.    Tempo de reflexão: Às vezes, o melhor a se fazer é dar um passo para trás e respirar antes de reagir. Reservar alguns minutos para processar a raiva antes de responder ajuda a evitar ações impulsivas das quais você pode se arrepender mais tarde. Isso permite que a raiva seja processada e expressa de maneira mais controlada.

    3.    Praticar a romunicação assertiva: Aprender a comunicar o que se sente sem atacar os outros é fundamental para a raiva saudável. A prática de dizer frases como “Eu me sinto frustrado quando isso acontece” ou “Eu preciso de mais clareza sobre essa situação” permite que você expresse seus sentimentos sem ser agressivo ou passivo.

    4.    Buscar roluções: Em vez de se concentrar no que está errado, a raiva saudável envolve focar em como a situação pode ser melhorada. Quais mudanças práticas podem ser feitas? Como a situação pode ser resolvida de forma que atenda às suas necessidades e respeite os outros?

Raiva saudável é aquela que reconhece a emoção como válida e a utiliza de forma construtiva. Em vez de ser uma força destrutiva, a raiva pode ser uma ferramenta poderosa para estabelecer limites, buscar justiça e provocar mudanças positivas. Quando expressa de maneira controlada, assertiva e respeitosa, a raiva se torna uma aliada no nosso crescimento pessoal e nos relacionamentos.

(*) Cristiane Lang é psicóloga clínica, especialista em Oncologia pelo Instituto de Ensino Albert Einstein de São Paulo. 

Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.

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