Exclusão do ramal de 355 km até Ponta Porã é polêmica na relicitação de ferrovia
“Vamos considerar fazer investimentos mais para frente, mas não matar esse ramal”, diz deputado
A exclusão de 355 quilômetros do ramal de Campo Grande a Ponta Porã, ativado na década de 50, provocou polêmica na audiência pública sobre a relicitação da Malha Oeste, a ferrovia que liga Corumbá a Mairinque (São Paulo). O debate foi realizado na manhã desta quarta-feira (dia 3), na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), em Brasília.
Ao todo, são 1.978 quilômetros de trilhos, mas a nova licitação vai abranger somente 1.623 quilômetros da linha tronco, excluindo a ligação de Campo Grande a Ponta Porã, que corresponde a 17% da Malha Oeste, por inviabilidade financeira. Nesse trecho que ficou de fora, a movimentação de cargas (granel e contêiner) corresponderia a 5,4%. O estudo técnico ainda mostra impacto negativo de R$ 582 milhões com a incorporação do ramal.
A análise da ANTT é de que a região poderá ser atendida pela Ferroeste, vista como mais viável e que tem previsão de entrar em operação no ano de 2035.
Primeiro a falar na audiência pública, o deputado estadual Pedro Pedrossian Neto (PSD) foi enfático para que o estudo sobre o ramal de Campo Grande a Ponta Porã seja reavaliado, inclusive com audiência no município que faz fronteira com o Paraguai.
“Imploro para vocês, vamos reabrir o estudo de demanda porque está errado. Existe subestimação muito importante do potencial de demanda nesse trecho. Estamos descartando uma ferrovia dizendo que é inviável, mesmo com essa revolução agrícola”, diz.
De acordo com Pedrossian Neto, o estudo de viabilidade aponta que o ramal foi classificado como de volume reduzido, com projeção de 200 mil toneladas por ano em 2035. Mas 80% da produção agrícola de MS, que foi de 22 milhões de toneladas, se localiza nessa área.
“Como aceitar que vamos transportar apenas 200 mil toneladas numa área perto de 22 milhões, vai captar apenas 1%? Vamos considerar colocar a obrigação de investimentos mais para frente, considerar aportes do governo, mas não matar essa ramal”, disse o parlamentar.
Ministro de Relações Exteriores, João Carlos Parkinson, destacou que Mato Grosso do Sul é um Estado que não deve ser visto somente da perspectiva brasileira, mas de integração com os vizinhos Paraguai e Bolívia. “Se desconhece que Campo Grande e Cuiabá se constituem no centro da América do Sul”.
Conforme o ministro, o desenho da Malha Oeste se volta para os portos do Oceano Atlântico, em detrimento do Oceano Pacífico. Ele destacou o projeto da Rota Bioceânica, corredor rodoviário que vai ligar MS com porto do Chile, encurtando as exportações para a China.
Titular da Semadesc (Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação), Jaime Verruck também pontuou a necessidade de reavaliar o volume de carga no ramal Campo Grande a Ponta Porã, levando em consideração que o escoamento dos grãos deixaria o modal rodoviário pelo trem.
Ainda conforme Verruck, outro ponto fundamental é a questão do acesso ao Porto de Santos, que fique claro no edital o direito de passagem. O secretário ainda destacou que Mato Grosso do Sul tem pressa e que a ferrovia tem capacidade de retomada imediata.
Representante da Transfesa (Transporte e Serviços Ferroviários), Luiz Antônio Sola Filho também endossou o pedido para incluir o ramal Campo Grande a Ponta Porã na relicitação. “Excluir o ramal de Ponta Porã é grave. Fui chefe de divisão da Malha Oeste, eram 1.250 graneleiros para puxar a safra toda, grande parte da carga era do ramal de Ponta Porã”.
Roberval Duarte Place, do Sindicato dos Ferroviários, defendeu a volta do trem dos passageiros, como forma de garantir que a ferrovia continue na ativa. O transporte de pessoas chegou ao fim em 1995. A ANTT destacou que o traçado e velocidade dificultariam a aceitação do modal pelos viajantes.
Um exemplo é deslocamento de Campo Grande a Aquidauana, que duraria quatro horas pelos trilhos, enquanto que a viagem de ônibus teria duração de 2h50. De carro, o tempo cai para 1h40.
Porto Esperança – Representante da J&F Mineração, Mayara Gasparoto Tonin sugeriu a exclusão do ramal de Corumbá a Porto Esperança, que tem previsão de investimento somente em 2029. Ela destacou que o trecho tem 46 km e se destina apenas ao minério. “Apesar da importância, o projeto prevê realização de investimentos apenas em 2029, mas há interessados que podem fazer investimento hoje”.
A relicitação prevê a concessão da Malha Oeste por 60 anos, até 2083. O cronograma prevê o lançamento do edital, leilão e assinatura do contrato no próximo ano. Pela ferrovia, passam grãos, minérios, celulose, açúcar, ureia e combustível.
A empresa que assumir a concessão futuramente terá que investir aproximadamente R$ 20 bilhões para operação e modernização da ferrovia, que estava sob gestão Rumo Malha Oeste S.A, mas que foi devolvida ao poder público em 21 de julho de 2020.
Além disso, o contrato prevê a modernização, ampliação e construção dos pátios de cruzamento; sinalização e CCO (Centro de Controle Operacional), que visam permitir a comunicação por satélite; investimento em oficinas, instalações e aquisições de equipamentos de via; minimização de conflitos urbanos através da instalação de intervenções e um contorno ferroviário; e melhoramento da frota, através da renovação e aquisição de novos veículos para que a empresa possa garantir a eficiência das operações.
O edital não deve exigir a mudança na bitola, que pode ser a métrica (atual, com um metro) ou a bitola larga (1m60).