Moro “escolheu data” para Lava Jato prender Bumlai, revela diálogo
Conversas entre procuradores e o ex-juiz vazadas também mostram que Dellagnol deu dica ao magistrado para manter pecuarista preso
Dois trechos de diálogos entre Sergio Moro e membros da força-tarefa da Lava Jato divulgados nesta sexta-feira (5) revelam que o ex-juiz federal conduziu ao menos duas situações relacionadas à prisão pecuarista, José Carlos Bumlai. A intenção, segundo publicado em reportagem da Veja, era evitar que crimes pelos quais o produtor rural de Mato Grosso do Sul foi condenado depois prescrevessem.
As conversas vazadas por uma fonte anônima, conforme o site The Intercept, estão na matéria publicada nesta última edição da revista e é a segunda vez em uma semana que a Veja traz informações que respingam em Mato Grosso do Sul. Na sexta-feira passada, outro trecho de diálogos do magistrado no Telegram citam contador e empresário de Campo Grande.
Desta vez, as mensagens indicam que foi Moro quem “escolheu a data” da fase da Lava Jato que levou Bumlai preso e também pressionou o procurador Deltan Martinazzo Dallagnol a se posicionar logo sobre o pedido de revogação da prisão para que ele pudesse dar sua decisão, que no caso, foi de manter o alvo na cadeia.
Uma das conversas evidencia ainda que Dallagnol deu dicas ao magistrado sobre que argumentos usar na manutenção da prisão.
“O papel de líder da Lava-Jato em Curitiba é exercido em diversas oportunidades pelo ex-juiz. Em mais de uma ocasião, Moro aparece nos chats do Telegram interferindo na agenda dos procuradores da força-tarefa, outra atitude que gera a suspeição de qualquer magistrado”, diz a reportagem da Veja no trecho em que se refere à Operação Passe Livre, que prendeu Bumlai.
A matéria traz conversa ocorrida entre 13 de outubro de 2015 entre os procuradores Paulo Galvão e Roberson Pozzobon sobre uma suposta orientação do juiz. “Estava lembrando aqui que uma operação tem que sair no máximo até por volta de 13/11, em razão do recesso e do pedido do russo (Sergio Moro) para que a denúncia não saia na última semana”, escreve Galvão. “Após isso, vai ficar muito apertado para denunciar”, completa e Pozzobon concorda: “uma grande operação por volta desta data seria o ideal. Ainda é próximo da proclamação da república. rsrs”.
Bumlai foi preso no dia 24 de novembro e conforme apurou a Veja, a denúncia do MPF (Ministério Público Federal) contra ele chegou às mãos do então juiz federal em 14 de dezembro, na última semana antes do recesso da Justiça Federal do Paraná. “No dia seguinte, Moro recebeu a denúncia, a tempo de impedir que os crimes prescrevessem no fim de 2015”, completa a reportagem.
Mais tarde, no dia 17 de dezembro daquele ano, o magistrado e Dallagnol conversam sobre o pedido de revogação de prisão feito pela defesa do pecuarista. É nesta conversa que o procurador dá “dicas ao chefe” sobre como garantir que Bumlai fique na cadeia.
Moro informa que precisa de manifestação do MPF “até amanhã meio-dia”. Dallagnol responde que vai ser feita e acrescenta: “seguem algumas decisões boas para mencionar quando precisar prender alguém…”.
“À luz do direito, é tão constrangedor quanto se Cristiano Zanin Martins fosse flagrado passando a Moro argumentos para embasar um habeas corpus a favor de Lula”, completa a Veja, fazendo um paralelo.
Situação jurídica – Bumlai, que é amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi acusado de ser “laranja” do PT.
O pecuarista foi sentenciado pelos crimes de gestão fraudulenta de instituição financeira e corrupção porque, conforme a acusação, em 2004, teria intermediado um empréstimo de R$ 12 milhões do banco Schain em nome do Partido dos Trabalhadores.
O caso foi julgado na primeira instância por Sergio Moro em 15 de setembro de 2016. Bumlai recorreu em liberdade até que em 16 de maio deste ano, o TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) determinou que ele começasse a cumprir a pena de 9 anos e 10 meses.
A prisão é domiciliar. Aos 74 anos, Bumlai vive em apartamento em São Paulo (SP), onde trata um câncer na bexiga. O produtor rural também é cardiopata.