Para turismo, 2020 será de sobrevivência e aposta são atrativos regionais
Turistas remarcaram pacotes e passagens para segundo semestre, mas retomada real deve vir somente em 2021
O planejamento de dois anos da servidora pública Lenice Joboji, 36 anos, começou a dar sinais de que cairia por terra em janeiro, com as crescentes notícias de casos do novo coronavírus (covid-19) na China. Ela e mais três amigos tinham marcado viagem de 23 dias pelo Japão em março e resolveram desistir, prevendo que talvez não conseguissem voltar ao Brasil.
“Foi uma frustração muito grande, mas a gente viu que era coisa muito grave, entendeu que ia passar aperto se viajasse ”. O grupo ainda esperou até o último momento, mas, em março, adiou as férias e remarcou passagens para novembro. Conseguiram reembolso pelos shows e tickets de trem e vão deixar para depois o aluguel do apartamento no país. O alento é que o roteiro está cuidadosamente organizado e pronto para viagem.
A remarcação feita por Lenice é a tábua de salvação para o trade turístico no Brasil em 2020. Este é o ano classificado como de sobrevivência para o setor, drasticamente afetado pela pandemia e que somente deve ganhar sobrevida a partir de agosto, segundo estimativa de empresários e órgãs públicos.
“O momento oportuno ainda está à frente; o turismo foi para a última prateleira das pessoas, mas, depois que tudo se estabilizar, volta a ser um dos principais interesses”, avalia o presidente da Fundtur-MS (Fundação de Turismo de MS), Bruno Wendling.
A retomada, ainda lenta, está sendo prevista para meados deste ano, mas ainda na dependência dos indicadores da infecção da covid-19. O presidente da fundação estima que os feriados de outubro e o fim de ano serão termômetros para essa volta. “Não adianta, é preciso controlar a pandemia antes de botar o pé na rua, temos que saber o momento certo para retornar”.
Para este retorno, segundo ele, o setor em MS se organiza com foco em três campanhas: de atrair o turista sul-mato-grossense, o turista de fora do Estado que desistiu de viagem para fora do País e, por último, o turismo internacional, este, que depende de protocolos sanitários e da situação mundial.
Esse planejamento é a saída depois dos impactos econômicos causados pelo novo coronavírus: decretos municipais determinaram o fechamento de atrativos turísticos e de empresas, tendo como efeito dominó o estrangulamento das atividades.
Para mapear esses impactos, a fundação também está fazendo levantamento dos efeitos da covid-19 em MS. O resultado regional vai para pesquisa nacional e teve participação de 400 integrantes do trade do Estado, entre donos de hotéis, pousadas, restaurantes e agentes de viagens. Os dados ainda estão sendo tabulados, mas, preliminarmente, já se sabe que 53,5% dos entrevistados já demitiram ou ainda vão dispensar funcionários por conta da pandemia.
A segunda fase dessa pesquisa, iniciada ontem, segundo Wendling, é como está a saúde financeira e o que o setor precisa para acessar linhas de crédito.
A Braztoa (Associação Brasileira das Operadoras de Turismo) estima que as operadoras de turismo brasileiras já soma R$ 3,9 bilhões em adiamentos e cancelamentos de viagens.
Remarcações – enquanto a crise pandêmica paira sobre o mundo, o momento é de ajustes. A proprietária da agência Viaje Mais Turismo, Alessandra Duailibi, adotou a campanha da associação nacional de convencer o cliente a adiar a viagem.
“A idéia é não tirar fluxo de caixa e manter a esperança do cliente”, disse a empresária. Segundo ela, a estratégia deu certo e 80% deles remarcaram os pacotes para outubro ou novembro, alguns, já para fevereiro de 2021.
Alessandra diz que o cliente ainda se sente inseguro e a tendência é que novos pacotes sejam vendidos somente para 2021. Outro problema é o calendário escolar dos filhos, o que irá travar qualquer negociação para início do segundo semestre. “Até julho estamos muito truncados, aposta será mais para réveillon e a partir de janeiro”. A empresa já trabalha com promoções, como 50% de desconto para segundo passageiro e ampliou parcelamento de 10x para 15 x na compra antecipada.
Em Bonito, cidade conhecida mundialmente pelos atrativos turísticos naturais, o setor também espera retomar as atividades, mas de forma gradual. “As primeiras duas semanas de quarentena foram dramáticas”, disse o presidente do IDB (Instituto de Desenvolvimento de Bonito), Guilherme Miguel Poli.
Segundo ele, as agências e hoteis somente devem retomar as atividades em junho, mesmo se o decreto municipal que suspendeu as visitações perdure até 20 de maio, como está previsto. “Entendemos que maio ainda é muito cedo”.
O IDB é instituto que reúne seis associações, entre hotelaria, agências de turismo, bares, restaurantes e atrativos turísticos. Dos 21 hoteis que compõem a associação, 50% conseguiram com que os clientes remarcassem as viagens para o fim do ano.
Poli reconhece que os impactos da covid-19 avancem no segundo semestre. “Este ano não é para ter lucro, e para sobreviver no mercado”, disse, contando como perdida a temporada de julho, mas com a esperada retomada a partir dos meses subseqüentes.
A aposta, também, é pelo turista que não vai querer pegar avião, os desistentes de viagens internacionais e, ainda, os que vão optar por roteiros com belezas naturais, ao ar livre e com restrições de pessoas. Por isso, Bonito seria o destino mais visado pelos turistas.
Poli cita como exemplo os residentes em Mato Grosso do Sul, que vão eleger o próprio Estado ou os eu moram no interior de São Paulo e Paraná, que vão buscar destinos próximos. O público interno, aliás, representa 50% do turismo na cidade e apenas 10% são de estrangeiros.
O presidente do IBD diz que já há reservas nos hotéis marcadas a partir de setembro e até em janeiro.
Nas agências de turismo de Bonito, o índice de remarcação chega a 80%, de acordo com o presidente da Abaetur (Associação Bonitense dos Proprietários de Agências de Ecoturismo), Gustavo Diniz Romeiro.
Além de garantir o caixa, ainda há expectativa da venda de novos pacotes e, por isso, as promoções do primeiro semestre foram estendidas, mantendo preços de baixa temporada até dia 18 de dezembro. Isso representa desconto de 20% a 30% nos preços, chegando a 50% a 70% para os sul-mato-grossenses, dentro do projeto “MS+Bonito”.