Quando a mulher rompe, o agressor avança; tornozeleira é aliada da prevenção
No Estado, há 180 homens utilizando tornozeleira e 20 mulheres com botão do pânico
A terça-feira seria mais um dia de trabalho para Albyna Freitas Ribas, de 49 anos. Ela seguia no começo da tarde para a escola onde trabalhava como monitora de alunos, na saída para Cuiabá, em Campo Grande. No bairro Nova Lima, a pé, ela se deu conta de que o ex-companheiro seguia-a. Tentou se proteger em um centro comercial, mas não conseguiu. O pintor Jair Paulino da Silva cercou-a e começou a desferir golpes de faca, causando a morte de Albyna. Toda a violência foi registrada pelas câmeras do local.
Albyna já havia registrado boletim de ocorrência e obtido medida protetiva para que ele não se aproximasse. A delegada que atendeu o caso, Karen Viana de Queiroz, revelou que foi apurado que ele não aceitava o fim da relação e culpava a vítima. A situação que atingiu Albyna e tirou sua vida não é exceção. O instituto Datafolha divulgou pesquisa que mostra que as mulheres que rompem um relacionamento abusivo ficam mais vulneráveis à violência por ex-companheiros.
Realizada a pedido do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a pesquisa "Visível e Invisível: A Vitimização de Mulheres no Brasil" ouviu 2.017 pessoas acima de 16 anos em 126 cidades, sendo 1.042 mulheres. Com base no levantamento, a conclusão foi que a média de agressões é três vezes maior com mulheres que romperam o relacionamento, em relação às casadas, viúvas e às solteiras.
Para autoridades, manter o homem que ameaça ou agride monitorado com tornozeleira eletrônica é um meio importante de intimidação. No Estado, há 3.300 pessoas monitoradas; deste grupo, são 180 monitorados por situações descritas na Lei Maria da Penha. As mulheres também podem utilizar um dispositivo; 20 pediram para utilizar uma espécie de controle remoto, apelidado de botão do pânico, que acionam quando veem o agressor se aproximar.
A Agepen (Agência estadual do Sistema Penitenciário) controla o sistema permanentemente. Todos os homens são monitorados, a tornozeleira de cada um tem registrada a zona em que não pode circular. Se ele chega a 300 metros, de imediato o sistema alerta e ele é contatado. O mesmo ocorre se percebem que ele se aproxima da usuária do botão, situação em que ela também é alertada da presença do homem. Sendo necessário, os agentes acionam a patrulha Maria da Penha, da Guarda Civil, ou a Polícia Militar e comunicam ao Judiciário.
O diretor da unidade mista de monitoramento virtual, Ricardo Teixeira, relata que não houve caso de feminicídio envolvendo as pessoas expostas ao monitoramento. Neste ano, no Estado, foram cinco mortes. Em 2022, foram 44 mulheres mortas, 12 em Campo Grande. Na página de estatísticas do Sigo, o sistema utilizado pela Polícia Civil, este ano foram 3,2 mil registros de violência doméstica, majoritariamente mulheres adultas entre as vítimas.
A juíza que analisa os pedidos de medidas protetivas na Capital, Liliana de Oliveira Monteiro, considera a tornozeleira “uma ferramenta eficaz para salvaguardar a integridade física e psicológica da vítima”. E, enquanto permanece monitorado, o homem é obrigado a assistir série de 16 palestras para provocar reflexão e tentar romper o ciclo da violência. São abordados temas como o machismo, violência moral, sexual e psicológica e dependência afetiva.
A magistrada acredita que as mulheres que não utilizam o serviço ficam mais expostas. As demais, diz, estão mais informadas e, portanto, menos vulneráveis. Para definir qual medida protetiva aplicar, a mulher presta informações e dessas declarações extrai-se a gravidade da situação.
Para tentar fortalecer a repressão as condutas agressivas, a Lei Maria da Penha foi alterada em 2018 e incluído um crime específico para aquele que desrespeita as medidas protetivas, com pena de três meses a dois anos de reclusão. Isso não excluiu as outras condutas, como ameaça, lesão corporal, caso ele venha a cometer.