“Tem alvará para matar?”, questiona familiar de morto pela PM com 4 tiros
José Antônio Souza Prado, de 36 anos, morreu após atirar duas vezes contra policiais, segundo registrou a equipe da PM
No velório de José Antônio Souza Prado, conhecido como “Cheiro”, de 36 anos, familiares oscilavam entre a tristeza e a revolta. A família quer explicações sobre como a PM (Polícia Militar) agiu na manhã de terça-feira (17) quando o homem foi morto, durante troca de tiros, segundo os policiais da Força Tática da 10ª CIPM (Companhia Independente da PM).
O confronto aconteceu por volta das 8h30 numa mata no Portal Caiobá, bairro da região sudoeste de Campo Grande.
Naquela manhã, o tenente Vinicius Duarte disse à imprensa que “Cheiro” é “velho conhecido da polícia”, por ter diversas passagens por furtos, roubos e tráfico. Em pesquisa no sistema on-line de consultas processuais do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), o Campo Grande News encontrou quatro processos contra José Antônio, três deles por furtos cometidos na Capital e um por uso de documentos falsos em Rochedo. Segundo a família, o José Antônio era usuário de pasta-base de cocaína, talvez daí venha o apelido.
Segundo o PM, só na segunda-feira (16), o homem teria cometido quatro furtos e roubos na região do Caiobá. O policial disse ainda que o alvo andava armado e recentemente trocou tiros com a polícia.
Conforme o relato do tenente, naquele dia, após denúncia de que José Antônio andava pelo bairro, equipe foi até o local. Na Rua Poética, se depararam com “Cheiro” em uma bicicleta, tentaram abordá-lo, mas ele fugiu para uma mata, atravessando a Avenida Rosana Aparecida Espíndola Jordão. Policiais disseram que tentavam negociar a rendição do rapaz, quando ouviram dois disparos e reagiram.
Para a família, a história está mal contada. Os parentes dizem desconfiar que“Cheiro” tenha sido vítima de uma “perseguição seguida e execução”, pelo fato dele ter levado quatro tiros no peito.
Todos os que conversaram com a reportagem pediram para ter os nomes e grau de parentesco preservados por medo de possíveis retaliações, mas dizem que vão “até o fim” em busca de explicações, de uma investigação imparcial e justiça.
Um familiar disse que tudo o que eles ficaram sabendo foi pela imprensa ou por terceiros. Quase não tiveram contato com a polícia, mas dizem que vão atrás da delegacia responsável pela apuração e Corregedoria da PM.
“A polícia não tem algema para prender? Agora só resolve atirando nas pessoas? Mudou a lei? Agora é só pena de morte?”, questiona um dos familiares.
Outro parente afirma que é falsa a informação de que José Antônio andava armado, embora, segundo a polícia, arma tenha sido apreendida com ele depois da troca de tiros. “Ele tinha os erros dele, era usuário de drogas, mas nunca foi violento e nunca andou armado. É preciso esclarecer melhor, a gente quer saber a verdade, porque a dor de não saber o que aconteceu é a pior possível”.
Os familiares também questionam a quantidade de tiros. “Não tem ser humano que fique de pé com tiro de .40. Isso não entra na nossa cabeça. O que queremos é justiça. Se foi um erro dele, vamos entender, mas se não foi? Vai fica impune?”.
A dependência e a despedida – Segundo a família, José Antônio era o terceiro de sete irmãos e começou a trabalhar aos 9 anos, mas conheceu as drogas ao 17. Mesmo lutando contra a dependência química, foi atendente de açougue, trabalhador rural e operador de máquinas agrícolas.
No sistema do Judiciário, conta que “Cheiro” estava foragido desde 2014, quando cumpria pena no Centro Penal Agroindustrial da Gameleira.
No velório, a não ser nos momentos de revolta, os familiares mantinham o silêncio. A reportagem acompanhou de longe o cortejo até o túmulo. O choro veio na hora da despedida, por volta das 10h desta quinta-feira (19).
Mais sobre a ocorrência – Segundo a PM, com José Antônio, policiais encontraram um revólver calibre 22 com quatro munições intactas e duas deflagradas. Com uma das munições, aconteceu o que a polícia chama de picote, quando há a tentativa de atirar, mas a arma falha.
O ferido chegou a ser socorrido, mas não resistiu. A PM não divulgou quantos e onde foram os tiros que o atingiram. Também não detalhou onde “Cheiro” morreu, se em hospital ou a caminho do socorro.