Casas de loteamento mostram pressa de Bernal: metade nem dá para morar
Bernal inaugurou moradias na sexta-feira, mas nem todas tem condições de habitação
Sem reboco, forro, portas ou contra-piso, com paredes tortas e telhado inacabado. Esta é a situação de algumas das casas do loteamento Vespasiano Martins – localizado no sul de Campo Grande – para onde foram levadas 42 famílias removidas em março da favela Cidade de Deus.
As moradias foram entregues na sexta-feira (1) pelo prefeito Alcides Bernal (PP), em cerimônia realizada no local, um dia antes do fim do prazo para que pré-candidatos participem de inaugurações e outros eventos. Mas, segundo estimativa dos próprios moradores, só metade dos imóveis realmente está ocupada, porque o restante ainda não tem condições de ser habitado.
A outra metade das famílias continua vivendo nos barracos de madeira e lona, erguidos nos fundos dos lotes onde estão as residências. As casas foram projetadas por engenheiros da prefeitura e construídas pelos próprios moradores em 45 dias, durante o que a administração municipal chama de “mutirão assistido”.
Contudo, o tempo de construção é um dos pontos criticados por quem ainda não conseguiu sair debaixo da lona. “Ergueram isso aqui em oito dias. Não tem como entrar, não sei se alguma coisa vai cair na minha cabeça”, afirmou Aparecida Guimarães, de 57 anos, mostrando uma parede visivelmente torta.
Ela também não se mudou ainda para o “novo teto” porque justamente o telhado está com uma abertura, porque faltou instalar a cumeeira. “Como vou botar as minhas coisas para dentro? Se cai uma chuva, molha tudo”, questiona.
Aparecida vai morar na casa, assim que ela tiver pronta, com o filho. Mas, ainda espera a instalação do vaso sanitário, pia e torneiras. “Hoje que colocaram essa porta aqui do fundo”, destacou.
O clima é tenso no loteamento. Há moradores satisfeitos com o resultado do trabalho e que não querem que vizinhos reclamem da qualidade.
Por conta disso, um morador, de 22 anos, que pediu para ter a identidade preservada com medo de sofrer represálias, afirma que o trabalho foi mal feito. “Está tudo torto, o portal do meu banheiro está amassado, o contra-piso ainda não secou. Não tem como entrar”.
Desempregado, ele trabalhou como servente no mutirão e afirma que o problema foi a pressa para concluir a obra antes do dia da inauguração. “Ficaram acelerando a gente”.
A mulher dele, de 23 anos, teme pela segurança da família. O casal vai viver no local com uma filha. “A gente não sabe se numa chuva, numa ventania, esse telhado, essas paredes vão aguentar”.
“A casa só tem beleza, não tem estrutura, não tem coluna”, emendou outra moradora, que pediu para ter o nome preservado.
Vida nova – Apesar da qualidade das construções ter sido colocada “em xeque” por alguns, há quem pense diferente. Mariana Gonçalves, 23, e o marido Rodrigo, 31, já estão vivendo com as quatro filhas – de 3, 5, 6 e 7 anos – na casa de alvenaria, embora ainda tenham de usar o banheiro e lavar a louça na parte de fora. “Não tem nada mal feito, só não tem reboco. Falta acabamento, mas isso é o de menos”, afirma Mariana.
“Para quem viveu quatro anos numa favela, isso aqui é ótimo. Acabamento a gente vai fazendo aos poucos”, continuou Rodrigo, que trabalha como pedreiro e foi um dos que colocou a mão na massa durante o mutirão.
Ele fez questão de mostrar à reportagem como era o barraco onde morou com a família desde março deste ano até sexta-feira, local semelhante com o que viveu durante quatro anos na Cidade de Deus. “O povo reclama de barriga cheia, estão querendo demais”. A casa do casal já foi rebocada.
José Fabiano de Lima, 32, que também trabalhou na construção dos imóveis tem a mesma opinião. “Melhor do que viver na lona”.
Outro lado – A prefeitura informou, por meio da assessoria de imprensa, que “não inaugurou uma coisa inacabada, mas o que foi combinado”.
Durante a cerimônia de entrega, a secretária-adjunta de Planejamento, Finanças e Controle, Maria do Amparo, afirmou que ficou acordado com as famílias que cada uma faria o acabamento das moradias como quisesse. O material básico como cimento e areia, além dos vasos sanitários, pias e torneiras seriam disponibilizados pela prefeitura, mas o piso, o forro e a pintura ficariam por conta dos moradores.
A comunicação do Executivo afirmou que a obra foi acompanhada pelos técnicos da prefeitura e que os moradores que trabalharam no mutirão passaram por capacitação. A assessoria do Executivo informou ainda que ausência do reboco “dá a impressão de que há problemas”.
As moradias de 46 metros quadrados com dois quartos, sala, cozinha e copa, um banheiro e uma área de serviço externa, mas coberta.
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