Longe do centro, boates geram medo até em quem não frequenta
Depois da tragédia em Santa Maria no último dia 27, que matou 235 jovens, o questionamento sobre a segurança em locais onde as pessoas vão para se divertir está em todos lugares. Em Campo Grande, longe do centro, até quem não frequenta boates e afins cobra mais fiscalização.
Além de expor os frequentadores ao perigo eminente, a falta de inspeção e a ausência de medidas de segurança podem também atingir estabelecimentos e residências próximas a esses locais como afirmaram os entrevistados pelo Campo Grande News.
“Se tivesse acontecido aqui o que aconteceu em Santa Maria, quem pode garantir que não o fogo não se alastraria para minha casa? E isso poderia ter acontecido em Santa Maria também, atingindo os prédios, sei lá”, disse a estudante que preferiu não se identificar, e que mora próximo a casa de shows Santa Fé, na rua brilhante.
A dona de casa Helen Thais, 18 anos, diz que a preocupação com as irregularidades nesses ambientes cresceu depois da tragédia. “A gente fica preocupada com as pessoas e também com a nossa casa e com a gente”.
Mesmo não frequentando um karaokê próximo a sua casa, Helen diz que o lugar tem apenas uma saída de emergência. “Além disso, meu muro é muito próximo ao estabelecimento. Imagina se acontece alguma coisa, posso acaber prejudicada”.
“Quem não tem medo? Quando acontece uma tragédia como a de Santa Maria ninguém escapa. Se não houver prevenção, todo podemos ser vítimas”, disse Eremita Gomes, 72 anos. A casa da pensionista faz fundo com o karaokê, o que motiva ainda mais a preocupação.
Morando ao lado de uma boate, a estudante Juliana dos Santos Araripe, 17 anos, diz que o medo sempre existe, seja por causa de brigas ou por outros motivos, como um incêndio. O antigo Tapera, na rua Manoel da Costa Lima, já foi palco de bagunça e muito barulho, mas hoje a realidade é outra. "Hoje está bem tranquilo, não acontece nada. Há alguns anos mudou o dono e mesmo antes, já tinha acabado a bagunça".
Morar ao lado de casas noturnas ou bares sempre peocupou a dona de casa Meire Jami, 37 anos. "Depois da tragédia a gente fica ainda mais tensa. Não só por causa das pessoas que podem morrer, mas sabemos que existe o risco de que a gente ainda leve a pior, dependendo da situação".
Santa Fé: Na casa de shows Santa Fé, a equipe de reportagem flagrou o momento em que os extintores de incêndio retornavam da manutenção. Um dos proprietários, Adílson Santerio da Silva, 43 anos, afirmou que a manutenção dos extintores é feita constantemente, já que alguns frequentadores estragam de propósito os lacres.
A casa está com a licença em dia e o alvará vence no próximo dia 13 de abril. O Santa Fé ficou fora da lista de locais fiscalizados pelo Crea (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia) e pelo Corpo de Bombeiros. Segundo Adílson, a regularidade da casa é responsável por isso. “Eles até já sabem que estamos certos que nós até ficamos fora da lista”.
No local existem três saídas de emergência, além de um amplo espaço externo que poderia servir como refúgio em uma tragédia como a de Santa Maria, segundo Adilson. Nas saídas de emergência as luzes sinalizam o local e, além disso,
Adilson confirma que serão instaladas mais 12 lâmpadas de emergência que não fazem parte da exigência. Os novos proprietários, que assumiram no ano passado, gastaram cerca de R$ 120 mil para reformar a casa,e entre os gastos estão revestimento e projeto dos bombeiros.
O revestimento acústico do local é feito com lã de vidro, material que não inflamável, segundo o proprietário. São quase 20 extintores espalhados pela casa. Além da vistoria anual, responsável pela licença, Adílson lembra que outras fiscalizações são solicitadas para manter a segurança do local.
“Principalmente antes dos shows nacionais a gente pede que os bombeiros façam a vistoria. Tanto é, que nós nem estávamos na lista da fiscalização”. As vistorias acontecem, segundo Adílson, no período entre quatro e seis meses.
Bom D+: Palco de tragédias e reclamações, a boate Bom D+, no bairro Tijuca, hoje está mais tranquila.
“O que mais incomodava era o som alto, além das brigas e mortes que já aconteceram aqui”, disse a dona de casa Vanda Carla, 50 anos, que mora em frente ao bar. Segundo ela, hoje a situação tem sido diferente. “Está bem tranquilo”.
O dono do local, Alan Antunes, 28 anos, lembra que comprou a boate em fevereiro de 2012 e, desde então, o foco da casa é a terceira idade. A mudança brusca de eventos resultou em um local mais tranquilo para os moradores. “Agora o meu foco é a terceira idade”.
Na manhã de quarta-feira (30), Alan aguardava a fiscalização, que segundo ele seria feita de forma tranquila, já que ele está de acordo com a lei. “Eles disseram que viriam fiscalizar hoje. Nós estamos na lista dos bombeiros”.
A boate, com capacidade para 400 pessoas, tem quatro portas de emergência e está com a licença em dia, conforme Alan.
Ele acredita que depois da tragédia as pessoas passam a prestar mais atenção ao que deve ser prioridade. “Tanto no centro, como nos bairros existem lugares irregulares, como lugares que estão certos. Isso depende da pessoa. É a consciência dela”, afirmou.
Clube da Amizade: A dona do tradicional Clube da Amizade, Maria de Almeida Matelo, 79 anos, diz que a fiscalização esteve no clube na segunda-feira após a tragédia. Segundo ela, está tudo certo no local. “Eu pago todas as taxas e faço tudo certinho. Aqui está tudo certo. O homem que veio me deu parabéns e disse que minha nota é maior que 10”, brincou.
Para Maria, a tragédia na cidade de Santa Maria poderia ter sido evitada. “O proprietário da boate tem que pagar pela tragédia. Imagina o quanto de dinheiro eles têm, o quanto eles não ganham em um fim de semana. Não tem desculpa. Aqui não tem uma vírgula errada. Nunca recebi reclamação de ninguém”, contou.
O local tem capacidade para até 1 mil pessoas, mas Maria garante que prefere fazer eventos menores, o que acha, inclusive mais gostoso. São quatro portas de emergência, além de um fumódromo separado do espaço comum. “É muito arejado”.