Referência da covid, HR já está sem principal sedativo para entubar pacientes
Hospital corre contra o tempo em 4 diferentes processos de compra, mas falta dos medicamentos atende todo o Brasil
Ainda que haja aparelhos para a ventilação mecânica de casos graves de covid-19, os respiradores, sozinhos, não auxiliam pacientes que precisam de interferência rápida. Essencial para que o paciente seja auxiliado na respiração do organismo, o principal medicamento utilizado para a entubação, um sedativo, já está em falta no Hospital Regional Rosa Pedrossian, em Campo Grande, referência estadual para tratar a doença do novo coronavírus.
Prestes a inaugurar hospital de campanha para aliviar o já pressionado sistema de alta complexidade, lotado com 90% de casos confirmados e suspeitos na UTI (Unidade de Terapia Intensiva), o HR corre contra o tempo e participa de quatro diferentes processos de compra para conseguir o Atracúrio e outros medicamentos, entre anestésicos e sedativos, necessários à entubação com ventilação mecânica.
É o que explicou a diretora do HR, Rosana Leite de Melo. A situação não é exclusividade de Mato Grosso do Sul e atinge todo o Brasil, conforme mostrou reportagem do Estadão, com dados do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde). O jornal aponta que ao menos dois hospitais de referência para tratamento de covid-19 no país são investigados por suspeita de que a morte de alguns pacientes tenha sido causada pela falta de medicamentos utilizados na entubação. As unidades citadas não ficam em Mato Grosso do Sul.
O motivo da falta, entre outras razões, se explica pela pandemia. Sem matéria prima, empresas brasileiras importam os componentes necessários para a fabricação dos medicamentos e há alta demanda de outros países. Além disso, no Brasil, a alta do dólar aumenta ainda mais a dificuldade das secretarias de saúde.
De forma geral, esses medicamentos são comprados em processos licitatórios geridos pelos próprios Estados e municípios, mas com a corrida contra o tempo, os gestores tem pressionado o Ministério da Saúde para intervir junto à Anvisa e aos fabricantes para facilitar a compra.
“Ontem tive reunião com nosso secretário a respeito disso. Somos instancia pública, o hospital tinha todo um planejamento, atas vigentes, ou seja, naquela quantidade, era suficiente para ter um resguardo de quatro meses de pandemia”, comenta Rosana.
A diretora afirma que a alta demanda ocorre em meio ao relaxamento das medidas de distanciamento social, considerada, até agora, a única medida efetiva já que não há tratamento consolidado ou vacina contra o novo coronavírus. Dessa forma, a pressão nos sistemas públicos e privados de saúde tem aumentado com a necessidade de tratamentos complexos porque há evolução para casos graves.
Medicamentos – O atracúrio atua como um bloqueador neuromuscular. Em cirurgias é utilizado como complemento de anestesia e facilitador da intubação endotraqueal, ou seja, atua para relaxar a musculatura antes da ventilação mecânica.
Além desse medicamento, que Rosana explica “que já está em falta pela quantidade irrisória”, a quetamina, anestésico, tem estoque “para no máximo 20 dias”. Ela também afirma que o anestésico Propofol, ainda que possa ser substituído por outros em estoque, também tem quantidade “para no máximo 20 dias”.
“Com a pandemia, abriu processo licitatório, ocorre que, esses com ata já vigente, que iam entregar uma quantidade, está em atraso. Notificamos três vezes, pedimos para a PGE [Procuradoria-geral do Estado] para fazer a requisição. As empresas são de outo estado, a PGE não pode requisitar”, disse a diretora do HR.
Atualmente, na tentativa de acessar os medicamentos, o HR integra quatro diferentes compras: uma pela Funsau (Fundação de Saúde), gestora do HR, outra pela SES (Secretaria Estadual de Saúde), uma pelo Consórcio Brasil Central, dos Estados do centro-oeste, e a última pela Conass. Rosana afirma que as empresas fornecedoras estão em Estados como São Paulo e Goiânia.
A diretora do HR disse, ainda, que outros hospitais “estão piores do que a gente”. “Como fizemos o planejamento anterior, nossas cirurgias só fazemos urgência emergência e essencial”, citou. Questionada sobre episódios de “colapso” com os medicamentos, explicou que “ainda não ocorreu”. “Estamos fazendo malabarismo”, comentou a médica.
Para ela, a situação tem, também, relação com o comportamento inconsequente das pessoas, entre as aglomerações, visitas aos amigos etc. “Se a população fizesse como parece que tinha feito no começo, mas não, parece que está todo mundo enlouquecendo”, disse ela.