Sem apoio "adequado", moradores de rua se tornam vilões e vítimas
Levantamento feito pelo Conselho Comunitário de Segurança do Centro entre 2011 e 2014, aponta que o número de moradores de rua da região central cresceu 116% neste período, e hoje chega a aproximadamente 1.300. Sem a assistência adequada, eles acabam se tornando um “problema” e sofrendo retaliações.
Vivendo nas ruas há mais de 10 anos, Maria, como foi identificada, fez um relato emocionado em audiência realizada pelo MPE-MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) nesta quarta-feira (11) para debater a situação de centenas de pessoas, que assim como ela, tem a rua como sua morada.
Com a voz embargada e lagrimas nos olhos, ela revelou ser vitima de truculência, falta de respeito e violência policial. Situações, que segundo ela, são enfrentadas diariamente por quem está exposto, não por opção, e sim por ser o único meio de “seguir vivendo”.
“ Somos atacados, sem fazer nada. Não estamos ali (na rua )porque nós queremos e sim porque alguma coisa aconteceu em nossas vidas. Todo mundo tem uma história que deve ser respeitada. Eu já tive minha casa, minha família e hoje estou nas ruas. Somos tratados com indiferença, falta de respeito. Não é porque moramos na rua que temos que ser tratados como qualquer coisa. Sofremos muito com as ações repreensivas, tanto da polícia quanto da Guarda Municipal. Eles chegam batendo e a gente nem sabe o porque está apanhando. A gente trabalha duro, vende aqui, pede ali pra conseguir alguma coisa. E quando pegam eles jogam fora o que conseguimos”, disse.
A “falta de opção”, repreensão e ausência de assistência descrita pela moradora de rua, há tempos está sendo observada “In loco” pela titular da 67ª Promotoria de Justiça De Campo Grande, Jaceguara Dantas da Silva Passos.
Para ela, o problema aumenta ainda mais quando existe a “inercia” do Poder Executivo em relação a implementação de politicas para a assistência aos moradores de rua.
Conforme a promotora, dezenas de recomendações foram feitas a Prefeitura para melhorar a assistência aos moradores de rua, que no entanto, não foram “seguidas”. Recomendações estas, que são frutos de investigações que apontaram a fragilidade do “sistema”.
Uma das ponderações é quanto às melhorias no Cetremi (Centro de Triagem e Encaminhamento ao Migrante), que funciona na saída para Três Lagoas, entre o Parque dos Poderes e o bairro Maria Aparecida Pedrossian e recebe em média 80 pessoas por dia.
Segundo a promotora, a estrutura que hoje funciona em um local de “difícil acesso”, deveria ser estabelecida no Centro da cidade para atender um número maior de moradores de rua.
Outro ponto mencionado é quanto a falta de melhorias no Creas Sul (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), localizado na Rua Arquiteto Vilanona Artigas, no bairro Aero Rancho, onde funciona uma base da Guarda Municipal em anexo.
“Hoje existe uma base da Guarda funcionando em um local que deveria ser destinado a Assistência Social. Isso reduz e inviabiliza o atendimento. E é alvo de questionamento, tendo em vista que aquele local é destinado a este fim”, ponderou.
De acordo com Jaceguara, somente em 2014 o Creas Sul recebeu cerca de R$ 300 mil do fundo nacional de assistência social e não funciona plenamente.
A promotora lembra que o município por diversas vezes foi notificado e até então nenhuma providência foi tomada. Segundo ela, a Prefeitura pode ser alvo de ação civil pública e ter todos os recursos destinados a SAS (Secretaria de Assistência Social) bloqueados.
Na Capital, a rede atendimento aos moradores de rua tem o Centro POP (Centro Especializado em Atendimento a População em Situação de Rua), o Seas (Serviço Especializado em Abordagem Social) e o Cetremi (Centro de Triagem e Apoio ao Migrante). Além de parcerias com Cedami (Centro de Apoio aos Migrantes) e Lar São Francisco de Assis.