Sem emprego ou aposentadoria: a vida de impossibilidades do ex-gari Antônio
Ele relata que fazia muito esforço e foi perdendo a cartilagem dos joelhos. Hoje, anda se apoiando nas paredes da casa de madeira

Com sérios problemas nos joelhos, que lhe obriga um caminhar vagaroso e se apoiando nas paredes, o ex-gari Antônio de Souza Campos, 44 anos, já não consegue mais correr atrás de emprego e nem brigar na Justiça para ter direito à aposentadoria.
Ele contou a sua história de impossibilidades ao Campo Grande News na casa de madeira onde mora no Parque do Sol. Um imóvel que tem panos nas frestas do telhado para conter a entrada de água nos dias chuvosos e onde o alimento que entra é fruto de caridade. O cardápio diário é arroz, feijão e ovo.
“Fico nessa situação vendo minha esposa passar dificuldade. O básico não consigo ter. Fico me sentindo como se eu fosse um ninguém na vida. A minha revolta maior é que nós prestamos serviço, nós pagamos o INSS durante a vida toda, mas quando mais precisamos eles negam para nós”, diz Antônio, com a fala entrecortada pelas lágrimas que escorrem pelo óculos de grau falsificado e que não ameniza seus problemas oftalmológicos.
Ele conta que começou a trabalhar como gari aos 24 anos. Antônio morava em Mauá (São Paulo) e já era casado com Cristiane Luíza Marques Campos, sua companheira há 26 anos.
Com o passar do tempo, a saúde começou a ficar prejudicada. Antônio relata que corria muito atrás de caminhão, fazia muito esforço e foi perdendo a cartilagem dos joelhos. O resultado foi artrose, três hérnias de disco e rompimento dos ligamentos dos joelhos.
No final de 2009, Antônio foi afastado pelo médico do trabalho e conseguiu receber o auxilio doença no começo de 2010. Mas, em 2016, sua situação passou por revisão e teve o auxilio suspenso. Tentou dois recursos na Justiça, não obteve sucesso e agora perdeu o direito de recorrer novamente.
Em janeiro deste ano, o casal vendeu tudo o que tinha dentro de casa e viajou a São Paulo para que Antônio pudesse fazer ressonância magnética dos dois joelhos e da coluna. O custo foi de R$ 1.500. Depois dos exames, amigos e irmãos de igrejas em São Paulo fizeram vaquinha para que eles retornassem a Campo Grande, onde moram há um ano e quatro meses.
“Eu já cheguei várias vezes na frente dos peritos com os dois joelhos inchados, a coluna ruim e eles dão o resultado da perícia indeferido. Eu fico me perguntando: nós que somos cidadãos não temos direito de adquirir alguma coisa que nós passamos a vida pagando. Eu não sou vagabundo, eu sempre trabalhei, até ano passado mesmo empurrado, com dor eu ia fazer meus bicos. Na hora que eu mais preciso de um socorro, de um auxilio que eu passei a vida pagando, agora não tenho esse direito”, desabafa Antônio.
O último registro na Carteira de Trabalho foi em 2010, quando pediu demissão. Há seis meses teve que encerrar os trabalhos esporádicos, impossibilitado pelas dores nos joelhos e coluna. Ele conta que desde o ano passado espera vaga no SUS (Sistema Único de Saúde) para se consultar com um especialista.
“Nós só queríamos que a Justiça reconhecesse a doença dele, que está totalmente debilitado, que não tem condições de defender o pão. O próprio juiz determinou que não podemos mais recorrer, se nós não podemos recorrer à Justiça, vamos recorrer a quem?”, questiona a esposa Cristiane.
O auxilio emergencial do Antônio está em analise desde abril. O de Cristiane foi aprovado e ela usou a primeira parcela dos R$ 600 para pagar as contas de luz atrasadas.
O processo – Em 2009, Antônio ingressou com ação no Juizado Federal Previdenciário de São Paulo e passou a receber benefício por incapacidade temporária. Em outra frente, entrou na Justiça comum, mas a perícia apontou que não cabia incapacidade laborativa classificada perante a lei acidentária. A defesa recorreu, mas teve o pedido negado e o processo chegou ao fim.
De acordo com a advogada Ana Stoppa, quer atuou no caso quando Antônio ainda morava em Mauá, o caminho agora é ele voltar a contribuir ao INSS e comprovar que houve agravamento no quadro de saúde ou tentar o beneficio da Loas (Lei Orgânica da Assistência Social). “Mas como a pessoa sem renda vai pagar INSS?”, lembra a advogada.
Outra exigência é que ele apresente exames médicos atualizados. A reportagem pediu informações à prefeitura de Campo Grande sobre a demora para consulta com especialista, mas não obteve resposta até a publicação da matéria.
O contato para quem quiser ajudar é (67) 99107-3812. O telefone de Cristiane foi publicado com autorização da mesma.
