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Interior

Da produtividade ao abandono vivem 22 comunidades quilombolas de MS

O Incra é responsável pela regularização dos territórios quilombolas, mas o processo esbarra na morosidade

Tatiana Marin | 15/01/2019 08:19
Plantação na Comunidade Quilombola Buriti, em Campo Grande. (Foto: Arquivo/André Bittar)
Plantação na Comunidade Quilombola Buriti, em Campo Grande. (Foto: Arquivo/André Bittar)

Mato Grosso do Sul tem 22 comunidades quilombolas certificadas pela Fundação Cultural Palmares, entidade ligada à Secretaria Especial da Cultura, do Ministério da Cidadania. Enquanto algumas já possuem pelo menos a titulação parcial do território e são bem sucedidas na produção, outras sofrem com a falta de políticas públicas.

O certificado de comunidade quilombola é apenas o primeiro documento de um longo e burocrático processo realizado pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), que fica sob a tutela do Mapa (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento). “A certificação é obtida depois que a comunidade se reúne, conta sua história para a Fundação, por escrito, e solicita reconhecimento como comunidade quilombola”, explica Cláudia Pereira Gonçalves, antropóloga do serviço de regularização de territórios quilombolas do Incra.

Com o certificado, pode ser dado o pontapé inicial para abrir o processo de regularização do território junto ao Incra e colocar as terras oficilamente em nome dos moradores.

A Comunidade Quilombola São Benedito - conhecida como Tia Eva -, em Campo Grande, é uma das que está com processo aberto de regularização de território. (Foto: Arquivo/Viviane Oliveira)
A Comunidade Quilombola São Benedito - conhecida como Tia Eva -, em Campo Grande, é uma das que está com processo aberto de regularização de território. (Foto: Arquivo/Viviane Oliveira)

Das 22 comunidades certificadas, 18 deram entrada no Incra para processo de regularização de seus territórios. Elas estão tanto em Campo Grande, como nos municípios de Corguinho, Jaraguari, Maracaju, Dourados, Nioaque, Rio Brilhante, Corumbá, Pedro Gomes, Bonito, Sonora e Aquidauana. No total, abrigam cerca de 840 famílias.

Apenas 4, das 18 comunidades que abriram processo receberam título de propriedade, mesmo que  parcialmente: Furnas do Dionísio, em Jaraguari, Furnas da Boa Sorte, em Corguinho, Chácara do Buriti, em Campo Grande e Colônia São Miguel, em Maracaju.

Segundo o Incra, pequenos detalhes faltam para finalizar o processo, mas com as últimas declarações do presidente Jair Bolsonaro, sobre o pente-fino nesses processos, o que era demorado pode ser inviabilizado. 

Produtos da Comunidade Quilombola de Furnas do Dionísio, em Jaraguari. (Foto: Divulgação)
Produtos da Comunidade Quilombola de Furnas do Dionísio, em Jaraguari. (Foto: Divulgação)

As 14 restantes estão em diferentes fases do processo, que pode levar anos. “Não depende só do Incra, às vezes vai para decisão judicial, tem recurso, mas o processo é moroso mesmo”, avalia Cláudio Roberto, chefe da divisão de ordenamento da estrutura fundiária do Incra. Depois de todos os requisitos satisfeitos, o Incra compra o território. “A terra é comprada. É pago em dinheiro, em valor de mercado. O juiz pede perícia para dar um preço justo”, descreve Cláudia.

Ao final, também é definida a dimensão da área que a comunidade vai ocupar. Ainda, as famílias que pleiteiam uma área, não podem escolher qualquer lugar. “Tem que ter um histórico de ocupação, ligado com a escravidão, com algum ancestral que viveu naquele local. São grupos que viveram no meio rural, normalmente em terras que não tinham cerca, eles não tinham título de domínio. Às vezes compravam, alguns negros alforriados compravam terras. Tem áreas que a prefeitura, o estado ou a união deram. São várias situações”, detalha a antropóloga.

As outras quatro comunidades que não possuem processo de regularização de seus territórios aberto no INCRA, apesar de serem reconhecidas pela Fundação Cultural Palmares, são as comunidades quilombolas Ourolândia, em Rio Negro, dos Pretos, em Terenos, São João Batista, em Campo Grande e Santa Tereza/Família Malaquias, em Figueirão. Segundo o Incra, suas demandas principais são políticas públicas e não titulação territorial.

Entretanto, mesmo que o processo não esteja finalizado, as comunidades já vivem em nas áreas, mas não ocupando a sua totalidade. Algumas delas estão dentro do território urbano das cidades. Há uma exceção, que é o caso da família Jarcem, que reivindica uma área em Rio Brilhante. “É provável que as terras foram tomadas, ou perderam porque não tinham documentação e alguém registrou. Pode até ser que eles tenham o título, mas não registraram no cartório. São situações que vem lá de 1800”, analisa Cláudia.

Mulher cozinha na Comunidade Quilombola Furnas do Dionísio. (Foto: Arquivo/João Garrigó)
Mulher cozinha na Comunidade Quilombola Furnas do Dionísio. (Foto: Arquivo/João Garrigó)

As comunidades rurais são as mais bem sucedidas, entre elas os destaques ficam para Furnas do Dionísio, em Jaraguari, e Colônia São Miguel, em Maracaju. Plantam e produzem diversos produtos, que são vendidos. Entretanto as comunidades que foram engolidas pelo crescimento das cidades enfrentam problemas de conflitos com vizinhos.

“Vivem em situação difícil, com pouca área, os moradores próximos não aceitam a presença deles no local. Sem dinheiro para regularizar ou por não saber o que fazer, eles foram sendo cercados”, afirma a antropóloga.

Segundo Cláudio, a última área adquirida pelo Incra cumprindo o processo de regularização de territórios quilombolas foi a de Furnas do Dionísio, em 2012. No período posterior, o Incra tem atuado nos diversos passos do processo. Para o futuro, a autarquia aguarda as resoluções do novo governo.

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