Sindicato briga por salários, mas esquece respaldo a professor em sala
No dia-a-dia, professores nadam contra a maré para ensinar alunos com dificuldades de aprendizado
A população de pelo menos 12 estados assiste a greve que mobilizou o setor de educação nos últimos dias. Os professores saíram às ruas para cobrar melhores salários e cruzaram os braços nos estados do Acre, Alagoas, Amapá, Ceará, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rondônia, Sergipe, Tocantins e Santa Catarina. Entretanto, apesar de exigir valorização salarial, os sindicatos não mantêm o mesmo afinco quando se trata de melhorar as condições desse mesmo professor dentro de sala de aula.
O movimento grevista em Mato Grosso do Sul é ligado a Fetems (Federação dos Trabalhadores em Educação), que por sua vez é ligada a CUT (Central Única dos Trabalhadores) e ao PT. O próprio presidente da Fetems, professor Roberto Botarelli é filiado ao PT, principal adversário político da sigla que está gerindo o governo: o PSDB.
A politização do movimento ficou ainda mais evidente após as declarações do presidente da Fetems, Roberto Botarelli, de que os professores estaduais estão “em situação um tanto privilegiada”. Atualmente, o Governo de MS paga o piso nacional para os professores em 38,84% acima do valor. Cálculos da Secretaria de Educação revelaram que, enquanto o piso nacional é de R$ 1.917,78, o Estado repassa R$ 2.662,82, mas 99,67% dos profissionais tem curso superior e recebe em média R$ 5.561,90 para carga horária de 40 horas semanais.
Somente em 2015, o Estado autorizou o reajuste de 13,01% antecipado pelo ex-governador André Puccinelli (PMDB), ofereceu mais 4,34%, a partir de outubro e negociou o aumento de salário ao dobro até 2022. Mas a proposta não agradou a categoria que saiu as ruas, mas acabou barrada pela Justiça.
Apesar da briga ter ido parar nos tribunais, na outra ponta que atinge diretamente a sociedade e as famílias - a qualidade do ensino público - o professorado permanece desguarnecido. Dados do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), mostram que a qualidade do ensino na rede pública no Brasil só deve chegar próximo ao nível dos países desenvolvidos em 2022.
Na avaliação da professora Doutora em Educação com pesquisa em formação de professores, Maysa Brum, a educação ainda não é prioridade, o que deixa muitos professores mal qualificados e sem condições de educar nossas crianças.
“Claro que a questão salarial é muito importante, mas não adianta brigar só pelo salário. Precisamos de condições detrabalho, infraestrutura,apoio institucional, físico, administrativo e pedagógico. A realidade que vemos hoje é de uma grande parte de professores mal formados, que não conseguem dar conta de formar nossos filhos e lá na frente os deixam muitas vezes sem saber ler, escrever, interpretar e sem visão crítica. Falta acirrar a briga também na outra ponta e elencar prioridades que não foram alcançadascomo investir nas condições de trabalho e principalmente na formação de professores”, elencou.
A educadora salientou ainda a questão dos alunos que ‘passam de ano’ sem ter conhecimento para avançar as séries, apenas para atingir a meta de aprovação das escolas. Maysa explicou que isso se deve a má interpretação da Lei.
“Quem comete esse tipo de crime contra a educação não entendeu o propósito da Lei. A ideia de que não pode haver reprovação quer dizer que vamos ter que suprir a necessidade do aluno: se não está aprendendo vou dar um reforço no contraturno, reforço psicológico, mas não é assim que a gente vê acontecer e muitas vezes essas professoras precisam reduzir o nível dos estudos para nivelar por quem sabe menos. Então, vemos que é urgente uma formação continuada remunerada aos professores, no seu horário de trabalho, porque não há quem trabalhe dois, três turnos e ainda tenha disposição e ânimo para fazer um aperfeiçoamento”, finalizou.