A telemedicina: um avanço necessário
Constantemente sou questionado por clientes, sejam eles médicos ou não, sobre a telemedicina. O assunto ganhou maior importância em virtude do momento de isolamento decorrente do atual cenário de pandemia.
Recentemente, em 16.04.2020, foi publicada a Lei 13.989/2020, que possibilita a utilização da telemedicina durante o período de pandemia do coronavírus. O texto considera como telemedicina o "exercício da medicina mediado por tecnologias para fins de assistência, pesquisa, prevenção de doenças e lesões e promoção de saúde".
Art. 1º Esta Lei autoriza o uso da telemedicina enquanto durar a crise ocasionada pelo coronavírus (SARS-CoV-2).
Art. 2º Durante a crise ocasionada pelo coronavírus (SARS-CoV-2), fica autorizado, em caráter emergencial, o uso da telemedicina.
Parágrafo único. (VETADO).
Art. 3º Entende-se por telemedicina, entre outros, o exercício da medicina mediado por tecnologias para fins de assistência, pesquisa, prevenção de doenças e lesões e promoção de saúde.
Não há dúvidas que a telemedicina é um método importante que ajuda a impedir a propagação e transmissão do vírus ao evitar a sobrecarga dos serviços públicos e privados de saúde. Protege paciente e médico da exposição a riscos desnecessários causados por deslocamentos que devem ser evitados. Pessoas podem ser diagnosticadas e orientadas sem precisar ir ao pronto atendimento, onde ficariam vulneráveis a infecções mais graves.
Todavia, não se trata de uma novidade propriamente dita. A citada lei ampliou o conceito de telemedicina outrora estabelecido pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), autarquia competente para disciplinar e regular a matéria (Lei 3.268/1957). De fato, o vigente Código de Ética Médica (Resolução 2.217/2018) estabelece em seu art. 37, §1º, que “o atendimento médico à distância, nos moldes da telemedicina ou de outro método, dar-se-á sob regulamentação do Conselho Federal de Medicina”.
Ocorre que a regulamentação existente foi feita no ano de 2002, de forma tímida, por meio da Resolução 1.643/2002, evidentemente defasada. Em 2002 a qualidade das transmissões de vídeos e conferência online de informações eram totalmente inferiores às existentes hoje, quase 20 anos depois. Havia também à época uma grande resistência por parte da classe médica, aliás ainda há!
Talvez por isso a definição daquela época trazida por essa resolução restringiu a telemedicina, nos seguintes termos:
Art. 1º - Definir a Telemedicina como o exercício da Medicina através da utilização de metodologias interativas de comunicação audio-visual e de dados, com o objetivo de assistência, educação e pesquisa em Saúde.
Perceba que a resolução então vigente permite o exercício da telemedicina apenas pela realização de videoconferência durante procedimento, para que o médico obtenha opinião de colegas, em ação executada sempre com a presença de um médico ao lado do paciente. Por seu turno, a Lei 13.989/2020, de aplicação temporária, ou seja, “enquanto durar a crise ocasionada pelo coronavírus”, ampliou sobremaneira às possibilidades ante ao estado emergência:
Art. 3º Entende-se por telemedicina, entre outros, o exercício da medicina mediado por tecnologias para fins de assistência, pesquisa, prevenção de doenças e lesões e promoção de saúde.
Pela lei, o médico deverá informar ao paciente todas as limitações sobre o uso da telemedicina. As consultas devem seguir os mesmos padrões normativos e éticos do atendimento presencial.
No atual cenário, a telemedicina já está sendo utilizada para transferir laudos, diagnósticos e exames de maneira digital, além de viabilizar o recebimento dessas análises em estabelecimentos do setor da saúde que não contam com especialistas em determinada área médica. Para se adaptar a essa nova realidade, principalmente com segurança e sigilo de informações, inúmeras empresas de tecnologia e prestadoras de serviços médicos desenvolveram softwares e plataformas digitais com soluções voltadas a telemedicina, em seu conceito mais amplo.
Em que pese de vigência temporária, a recente Lei 13.989 consolida uma tendência já existente e traz relevantes avanços. Esses avanços devem ser levados também para o período posterior à validade da lei, ou seja, quando passado o atual cenário de pandemia. No entanto, a fim de resguardar médico e paciente, há iminente necessidade de melhor regulamentação por parte do Conselho Federal de Medicina. A ausência de uma correta regulamentação traz insegurança para vários profissionais das mais diversas especialidades médicas quanto ao correto uso da telemedicina. É imperioso que tanto os médicos, quanto a sociedade, tenham uma melhor compreensão das possibilidades e dos limites do exercício da telemedicina de forma mais compatível com a realidade tecnológica atual.
Guilherme Brito - Advogado com forte atuação no direito médico. Especialista em direito processual civil (PUC/SP), pós graduando em Gestão Tributária (MBA USP/Esalq). Formação executiva em Direito do Agronegócio pelo INSPER. Ex- presidente da Comissão de Estudo do Código de Processo Civil da OAB/MS. Membro da Comissão Mista (TJMS e OAB/MS) de Estudos do Código de Processo Civil.