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Compartilhando Justiça

Direitos dos Passageiros de Companhias Aéreas I

Dr João Rodrigo Arce Pereira | 19/02/2020 11:00
(Foto: Divulgação)
(Foto: Divulgação)

Conforme dados da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) no ano 2019 a malha aérea do Brasil transportou a expressiva quantia de R$ 104,4 milhões de passageiros*. Esses mesmos dados demostram que o mês de maior movimento de passageiros no Brasil normalmente é o mês de dezembro, onde foram transportados 8,9 milhões, mês em que muitas famílias saem de férias.

Janeiro já passou, e agora no carnaval, nova onda de pessoas são esperadas nos aeroportos do país. Considerando a expressiva quantia de passageiros transportados, traremos neste e em outro artigo, nas próximas semanas, os principais problemas que podem ocorrer e os direitos dos passageiros em cada caso.

Voo Atrasado ou Voo Cancelado


Um dos problemas mais comuns aos passageiros de transporte aéreo é o atraso ou cancelamento de voo.


Para estes casos, segundo as normas reguladoras do transporte aéreo nacional, em especial as regras estabelecidas pela Resolução 400/2016 da Anac**, uma série de direitos devem ser respeitadas pelas companhias aéreas.


Aos passageiros que comparecerem ao embarque e se depararem com o atraso ou cancelamento de seu voo surge direito à assistência material, que envolve três pontos: comunicação, alimentação e acomodação***.


Todas as medidas independem do motivo do atraso ou do cancelamento (inclusive para casos em que a companhia aérea não foi a responsável, como por exemplo condições meteorológicas adversas), sendo responsabilidade da companhia aérea minimizar o desconforto dos passageiros enquanto aguardam seu voo, atendendo suas necessidades imediatas, oferecendo gradualmente, de acordo com o tempo de espera para sua realocação.

A partir de 1 hora de atraso deverá fornecer comunicação (acesso à internet, telefonemas, etc.). A partir de 2 horas de atraso deverá fornecer alimentação (voucher, lanche, bebidas, etc.).

A partir de 4 horas de atraso a companhia aérea tem a obrigação de fornecer acomodação ou hospedagem (a depender do caso) e transporte do aeroporto ao local da acomodação. Não é obrigação da companhia aérea o fornecimento de acomodação/hospedagem caso o passageiro esteja em seu local de domicílio, sendo que neste caso em particular, continua a obrigação do fornecimento de transporte (aeroporto-residência-aeroporto).

Para casos de atraso superior a 4 horas a empresa aérea deverá oferecer ao passageiro, além da assistência material tratada acima, opções de reacomodação ou reembolso de todos os gastos, inclusive das taxas/tarifas aeroportuárias e de embarque.

A assistência material e as opções de reacomodação ou reembolso devem ser oferecidas também quando a empresa aérea já tenha a confirmação ou estimativa de que o voo atrasará esse tempo.

Preterição de Embarque e Perda de Conexões

A preterição de embarque ocorre quando o passageiro que cumpriu todos os requisitos tem seu embarque negado.

Isso ocorre por diversos motivos, mas os mais comuns são por troca não programada de aeronave (troca de uma aeronave maior por uma menor por problemas técnicos por exemplo), junções ou cancelamentos de voos (cancelamento de um voo em razão de problemas climáticos que gera a necessidade de realocação de passageiros prioritários), acomodações de passageiros que perderam suas conexões (passageiros que perderam sua conexão, por estarem em trânsito tem embarque preferencial) e overbooking (prática proibida, mas que pode ocorrer com venda de mais passagens do que a capacidade do avião por erro de cálculo de índice médio de “no show” que é quando o passageiro não aparece), dentre outras causas possíveis.

Em qualquer dos casos, no Brasil, a empresa aérea responderá integralmente pelo bem estar do passageiro e deverá fazer tudo que estiver a seu alcance para minimizar os transtornos causados, devendo prover as opções de acomodação e assistência.

A princípio a companhia aérea tem a obrigação de procurar voluntários que aceitem embarcar em outro voo, mediante a oferta de compensações (dinheiro, bilhetes extra, milhas, diárias em hotéis, etc) para solucionar a impossibilidade de embarque imediato de quem comprou e garantiu sua reserva de passagens, chegou pontualmente, realizou o check-in corretamente e compareceu ao embarque.

Infelizmente no Brasil, ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos, essa oferta de compensação nem sempre é realizada de maneira clara e transparente, o que não favorece uma solução rápida para problemas do tipo.

Caso não seja resolvida a situação e seu embarque não seja realizado, surgem os mesmos direitos de quem teve atraso ou cancelamento de seu voo, entretanto, caberá à empresa aérea pagar uma compensação financeira, no valor correspondente a 250 DES, no caso de voos domésticos, e 500 DES, para voos internacionais. DES significa Direito Especial de Saque, que é uma moeda do FMI (Fundo Monetário Internacional), cujo preço varia diariamente e pode ser consultado no site do Banco Central do Brasil (www.bcb.gov.br). Em 12 de fevereiro de 2020 o 1 DES equivalia a R$ 5,9416.

Importante destacar que no caso de reembolso de valores, independente do motivo que o autorizou (atraso ou cancelamento de voo ou ainda preterição de embarque), deve ser feito de acordo com a forma de pagamento utilizada na compra da passagem.

Se a compra foi realizada à vista em dinheiro, cheque compensado ou débito em conta corrente a devolução deverá ser da mesma forma no prazo máximo de 7 dias de acordo com o artigo 29 da resolução 400/2016 da Anac. Se a passagem aérea foi comprada por cartão de crédito e tem parcelas a vencer, o reembolso obedecerá às regras da administradora do cartão. De qualquer forma as providências para o reembolso devem ser imediatas.

Se for interesse do passageiro o reembolso poderá ser realizado por meio de créditos em programas de milhagem.

Vejamos o quadro explicativo disponibilizado pela ANAC para os casos de Atraso de voo superior a 4 horas, cancelamento de voo ou preterição de embarque:

Fonte: Anac www.anac.gov.br
Fonte: Anac www.anac.gov.br

Caso você tenha os direitos desrespeitados sugerimos os seguintes passos imediatos****:

• Analise com atenção a proposta da companhia aérea e tome uma decisão sem pressa, caso a situação permita;
• Verifique voos próximos no painel do aeroporto ou pela internet e analise se a solução ofertada é a mais favorável à sua situação e exija a melhor opção;
• Se o atendente da empresa aérea não resolver ou se negue, solicite para falar com o supervisor e tente a melhor solução com esse responsável;
• Se não for possível a solução pelos agentes da companhia aérea, procure o escritório da Anac e/ou do Juizado Especial Cível existente em alguns aeroportos do país. Se não for possível pessoalmente, entre em contato com a Anac por seus canais de atendimento***** (telefone 163 - O atendimento telefônico é diário, das 8h às 20h, em português, inglês ou espanhol).

Apesar da tentativa de solução pela via administrativa ser a mais rápida, principalmente para resolver ou amenizar o problema na mesma hora em que ele acontecer, alguns casos somente se resolverão pela via judicial e para tanto se faz necessário provar os problemas que você teve.

As empresas aéreas são rés conhecidas nos tribunais brasileiros e, portanto, sua chance de obter sucesso em uma demanda contra uma delas é alto quando comprovadamente ocorrer uma violação aos seus direitos.

Para o caso de atraso, cancelamento de voo ou preterição de embarque, os tribunais brasileiros tem entendido que são cabíveis indenizações por danos morais, além dos danos materiais que você tiver, como por exemplo perda de diárias em hotel reservado, congressos, passeios e diárias de aluguel de veículos perdidos, transporte, alimentação e hospedagens não previstas, dentre outros.


Veja o entendimento no Estado do Mato Grosso do Sul que condenou companhia a indenizar passageiro em R$ 10.000,00 por danos morais, além de danos materiais comprovados:

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – TRANSPORTE AÉREO – DESVIO DE ROTA – ALEGAÇÃO DE MAU TEMPO – NÃO COMPROVADO – CONCLUSÃO PARCIAL DA VIAGEM POR VIA TERRESTRE – TRATAMENTO DESIGUAL ENTRE PASSAGEIROS – FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – DANO MORAL IN RE IPSA - QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. A responsabilidade civil decorrente da prestação do serviço ao consumidor é de ordem objetiva, respondendo o fornecedor de serviço pelos danos causados ao consumidor, decorrentes da falha na prestação do serviço, nos termos do art. 14 c/c18 c/c 25,§ 1º, 2º do CDC. Restando claramente evidenciada a conduta ilícita da companhia aérea, que em face da necessidade de cancelamento do voo por razões climáticas, não proveu tratamento igualitário aos passageiros, limitando-se a disponibilizar transporte terrestre até outro aeroporto, o que culminou em uma viagem terrestre de cerca de 10 horas até a chegada ao seu destino de conexão, inafastável o reconhecimento do dano e do dever de indenizar. Para a fixação do quantum da indenização pelo dano moral, o julgador deve aproximar-se criteriosamente do necessário a compensar a vítima pelo abalo sofrido e do valor adequado ao desestímulo da conduta ilícita, atento sempre ao princípio da razoabilidade e proporcionalidade. Revela-se como justo e coerente o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), suficiente para recompensar o desconforto sofrido, sem caracterizar um prêmio indevido à vítima ou mesmo a impossibilidade do apelante em cumprir a obrigação ora imposta. Recurso de apelação conhecido e não provido. (TJ-MS - AC: 08004779220198120008 MS 0800477-92.2019.8.12.0008, Relator: Juiz Luiz Antônio Cavassa de Almeida, Data de Julgamento: 21/01/2020, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 23/01/2020).


Apesar de toda comprovação necessária, os danos não são difíceis de serem demonstrados em razão de que normalmente em atrasos de grande monta, cancelamentos e preterição de embarque, é corriqueiro o passageiro aéreo perder compromissos inadiáveis e não ter todos os seus direitos atendidos e garantidos pelas companhias aéreas, gerando o dever de indenizar.

Por isso, a recomendação é que tudo que acontecer seja devidamente registrado como prova para uma futura ação de indenização por danos morais e materiais, seja por documentos, vouchers, fotografias, filmagens ou testemunhas, enfim, por qualquer meio que seja possível naquele momento.

• Guarde todo e qualquer comprovante de gastos que teve em razão da negativa de assistência (gastos com alimentação, hospedagens, deslocamentos, transporte, etc).
• Guarde os bilhetes de embarque, tire fotografias e/ou filmagens da situação vivenciada, do painel de informações dos aeroportos, arquive troca de mensagens e e-mail, etc)
• Guarde os comprovantes de prejuízos financeiros decorrentes da perda de diárias de hotel, aluguel de carro, ingressos para passeios turísticos, taxas de inscrição em congressos, etc.
No próximo artigo trataremos sobre um dos mais temidos problemas para passageiros aéreos. Chegar na esteira do desembarque e se perguntar: “Onde foi parar minha mala?”

 

* https://www.anac.gov.br/noticias/2020/empresas-aereas-brasileiras-transportam-104-4-milhoes-de-passageiros-em-2019
** https://www.anac.gov.br/assuntos/legislacao/legislacao-1/resolucoes/resolucoes-2016/resolucao-no-400-13-12-2016/%40%40display-file/arquivo_norma/RA2016-0400%2520-%2520Retificada.pdf+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br&client=firefox-b-d
*** https://www.anac.gov.br/assuntos/passageiros/atrasos-cancelamentos-pretericao-e-assistencia-material
**** https://www.melhoresdestinos.com.br/overbooking-embarque-direitos.html
***** https://www.anac.gov.br/fale-com-a-anac

Dr. João Rodrigo Arce Pereira (Foto: Arquivo Pessoal)
Dr. João Rodrigo Arce Pereira (Foto: Arquivo Pessoal)

João Rodrigo Arce Pereira - Sócio, Advogado e Diretor Jurídico da LPB Advocacia, com mais de 10 anos de experiência em Gestão Jurídica, Gestão de Pessoas e Liderança de Equipes. Gestor da Qualidade em sistema de Certificação ISO 9001 em Escritório de Advocacia. Graduado em Direito pela Universidade Católica Dom Bosco; Pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil pela Faculdade Damásio de Jesus e pela EDAMP – Escola de Direito da Associação do Ministério Público, Pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera Uniderp.

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