A gripe era uma ameaça; agora é uma aspiração
A desejamos, ansiamos por ela, queremos consegui-la: houve tempo em que ela nos assustava um pouco; agora parece que nada seria melhor. A palavra gripe é relativamente nova. Chegou do francês, no princípio do XIX. Naquela época, era masculina: "o gripe". Ninguém sabe quem a tornou feminina. Em algumas línguas ficou feminina para sempre: "gripa". No início, para os franceses "gripper" era roubar ou atrapalhar. Impedia o corpo de funcionar direito.
Só teve um momento de glória.
Iniciada nos Estados Unidos, a "gripe espanhola", tinha caído no esquecimento, voltou à tona nos tempos de pandemia causada pelo coronavírus. Foi chamada de espanhola porque no resto do Ocidente a censura de guerra proibia que dela se falasse. Só não era proibida na Espanha. Alguns dizem que matou 50 milhões. Outros dizem que foram 100. Ninguém sabe, mas aquele, foi seu momento de glória.
Gripalização, um triste conceito.
Mais além da língua, a gripalização é um conceito triste. Estamos há dois anos pendentes da medicina. Vivendo como corpos assustados. Em algum momento do dia pensamos em vacina e em novos medicamentos, como o Paxlovid. Quando chegarão ao Brasil? Parece que nunca. São caros, ainda que impeçam mais de 80% das hospitalizações. Quem não tem remédio, tem válvula de escape. "Escapamos", fugimos da realidade, aspirando a gripalizar. A gripe foi, durante décadas, um açoite, que a cada inverno matava mais de 600.000 pessoas no mundo. Idosos. Agora, a gripe se tornou sinal de esperança. Mas também de resignação. Quem não tem vacina e paxlovid - o remédio da Pfizer - tem gripe como aspiração.
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