À procura da terra do escambo, um dos mitos mais duradouros
João tinha uma sandália sobrando. Pedro tinha carne excedente. João trocou a sandália pela carne. Esse é o mito do escambo. A verdade é que depois de séculos, nunca encontraram uma só aldeia, tribo ou povoado onde ocorresse o escambo. Não há um só pequeno caso em uma pequena aldeia da ocorrência de escambo entre vizinhos, entre moradores do mesmo povoado. Só existiu escambo entre inimigos. Os estudiosos do dinheiro e da dívida contam dois casos interessantes sobre escambo entre inimigos.
Ñhambiquara, o povo brasileiro que faz escambo com inimigos.
Ñhambiquara são povos que vivem entre o vizinho Mato Grosso e Rondônia. Dali para o mundo. Viveram um tempo de fama nas universidades europeias devido à prática do escambo que faziam com inimigos. A história começa com um grupo de ñhambiquara acendendo fogueiras para cozinhar. O grupo inimigo manda emissários para negociar um encontro com propósitos de troca. Se a oferta é aceita, eles primeiro escondem as mulheres e as crianças na floresta. Depois, convidam os homens do outro grupo para a visita. Cada grupo escolhe um chefe de visita. Cada chefe profere um discurso formal enaltecendo a outra parte e subestimando o próprio grupo.
Desarmados, mas perigosos.
Todos deixam as armas de lado. Cantam e dançam juntos. A dança, todavia, imita as que são feitas antes das batalhas entre eles. Danças de guerra em tempos de paz. Só depois começam as trocas. Se alguém quer um objeto qualquer, ele o enaltece dizendo o quanto é bom. Já o seu objeto, a ser trocado, é desvalorizado. "Esse machado não é bom, é muito velho e perdeu o corte", dirá ele, referindo-se a seu machado.
Arrancando do outro.
É bem estranho. Os argumentos contra o próprio objeto são proferidos em tom furioso. Até que se chega a um entendimento. Feito o acordo, um pega o objeto da mão do outro. Se um homem fez o escambo de um colar não irá retirá-lo e entregá-lo. O outro deve arrancá-lo, exibindo força. Esse tipo de clima beligerante muitas vezes termina em lutas.
Um banquete no final.
Passado o momento de perigo, a negociação termina em festa. As mulheres reaparecem. Começa outro momento de perigo. Música e comida costumam dar margem à sedução. Isso leva a embates provocados pelos ciúmes. De vez em quando, algumas pessoas são mortas. Esse é o escambo encontrado pelos estudiosos. Além dele, há outro na Austrália. Mas a realidade não pode ser esquecida: escambo só ocorreu entre inimigos, nunca entre aqueles que vivem juntos.