E assim nasceu o rock and roll
"Se consigo encontrar um branco que tenha a voz e o sentimento dos negros, ganharei milhões de dólares". Esse era o mantra que repetia Sam Phillips, dono do pequeno estúdio de gravação "Sun Records", situado em Memphis. Em 1954, havia um jovem que visitava esse estúdio frequentemente, em busca de uma oportunidade. Esse jovem pagou de seu bolso uma primeira gravação amadora, seria um presente para sua mãe, mas, também, talvez servisse para chamar a atenção de Phillips. O chefe da Sun Records nem estava presente no momento da gravação, que seria histórica. A história é tão modesta que somente a recepcionista da Sun Records gravou e acompanhou esse jovem. Seu nome era Marion Keisker. Talvez a única recepcionista do mundo que passaria para a história da musica. Ela pegou a gravação do jovem e colocou na mesa de Sam Phillips com uma nota que dizia: "Bom cantor de baladas. Contratar".
É inacreditável como a sensibilidade da moça criaria um dos maiores mitos da musica e lançaria ao espaço sideral um novo ritmo musical. Intrigado, Phillips escutou a gravação e pensou que, efetivamente, tinha nas mãos uma jovem promessa. Reuniu uma pequena banda e convidou o jovem para a primeira gravação profissional. Mas as coisas não andaram bem. A gravação não entusiasmava. O jovem estava parado, tentava cantar conforme os cânones da época, tentava ser profissional reprimindo sua maneira natural de interpretar a musica. A gravação prometia terminar em um rotundo fracasso. Phillps, cansado, determinou uma parada. O jovem, para controlar o nervosismo, se pôs a cantar alegremente uma musica que conhecia desde criança, interpretando um palhaço e dançando, sem nenhuma intenção de aquilo não passasse de um divertimento momentâneo.
Era musica de negros, nada que se considerasse comercialmente apropriado para um jovem principiante branco. Mas quando Sam Phillips escutou aquilo, soube que, finalmente, tinha à sua frente o que tanto estava buscando: um jovem branco que podia cantar musica negra como os negros. Insistiu para que aquele jovem gravasse a canção que acabara de interpretar no descanso. Aquela canção de sua infância que estivera brincando e que se chamava "That´s All Right". O nome do jovem era Elvis Presley.
O rock, filho do blues e do country
Pode parecer estranho para muitos, mas o rock nasceu da confluência do blues negro com o country branco. "That´s All Right" estava em um lado do disquinho de Elvis Presley, era um blues, ou melhor, um "rhythm & blues" (um blues acelerado), gravado originalmente por Arthur Crudup, em 1946, quando Elvis tinha 11 anos. O outro lado do disco levava "Blue Moon of Kentucky", cuja belíssima versão original havia gravado Bill Monroe, também em 1946. Assim, em um mesmo disco, encontramos algo que era inédito para os Estados Unidos racista, o blues de um artista negro e o country de um branco. Perfeita metáfora da explosão que iria ocorrer. Aquela gravação insólita provocou uma reação inesperada. Era insólita. A primeira emissão pela rádio provocou uma tempestade de chamadas telefônicas em Memphis que obrigaram o locutor a tocar 15 vezes "That´s All Right" em menos de duas horas. Foi tal a demanda popular que o locutor teve de descobrir quem era esse jovem e levá-lo para ser entrevistado na mesma noite.
A bomba Presley
O impacto inicial do disco de Elvis foi apenas na região de Memphis. Muitos meses passariam para que ele virasse artista de renome nacional. Ainda assim, o efeito na região foi tão grande que o disco vendeu 20 mil exemplares. Um feito que nunca ocorrera. O jovem Elvis saiu em excursão nos meses que se seguiram e seu nome crescia. Passou 1955 inteiro andando e cantando no sul dos EUA. A bomba Presley estalou definitivamente em princípios de 1956. Chegou ao primeiro lugar nas listas dos mais ouvidos com a canção "Heartbreak Hotel".
A explosão coincidiu com suas primeiras aparições na televisão, quando os jovens o viram pela primeira vez cantando e dançando. Produziu uma onda de histeria. Não é difícil entender a loucura desatada por Elvis. Pensemos em uma juventude que buscava sensações novas, cansado dos "crooners", estilo Frank Sinatra, adorados por seus pais. Também era uma juventude que abandonava, paulatinamente, os ranços do racismo. É verdade que em 1956, o rock estava há vários meses crescendo com outros cantores, importantíssimos em breve futuro. Todavia o rock necessitava de uma figura aglutinadora. Elvis terminou sendo esse marco, essa figura.
E o mundo "perdeu a cabeça"
Se Elvis gerava impacto com sua voz, vê-lo dançando, despertou um fenômeno sem precedentes, porque jamais haviam visto semelhante na televisão. Fez com que toda uma geração perdesse a cabeça. Para a maioria dos pais, era intolerável ver seus filhos tentando imitar Elvis. Pior ainda, que suas filhas se excitassem visivelmente ao vê-lo em ação. A bomba foi tão grande que a televisão não tardou em obrigar Elvis a moderar suas intervenções para "não rebaixar os limites do que se considerava decente". Todavia, quando o submeteram à censura, já era tarde, suas primeiras gravações estavam na memória da geração de jovens. Ponham-se no lugar de um jovem telespectador dos anos 1950 e vejam o Elvis que derrubou o mundo "decente".