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Esportes

Dinheiro e paciência são as chaves do sucesso nacional de 'rival cuiabano'

Campanha do Dourado vem chamando a atenção, refletindo em questionamentos sobre o futebol de MS

Nyelder Rodrigues | 20/11/2020 16:16

Campo Grande, dia 8 de fevereiro de 2015. Um domingo de chuva torrencial que tornou quase impraticável o futebol no empoçado campo do estádio Olho do Furacão, que fica no bairro Los Angeles e foi a casa do hoje inativo Cene. Em atuação, os donos da casa e um promissor Cuiabá Esporte Clube, pela primeira fase da Copa Verde.

Ali estavam duelando os campeões sul-mato-grossense e mato-grossense do ano anterior - e enquanto um 'acabou' naquele ano, o outro cresceu e alçou voos maiores. Hoje, o Cuiabá, conhecido como Dourado, disputa a Série B com chances de ir à Série A.

Fundado em 2003 pelo ex-jogador Gaúcho, o Cuiabá experimentou um bom momento inicial e depois encarou o ostracismo em pouco tempo. A virada começou em 2009, quando a equipe foi comprada pela milionária família Dresch, que atua no ramo da recapagem de pneus e é proprietária da Drebor, um dos principais nomes do setor.

Último título conquistado pelo Cuiabá, em final contra o Paysandu (Foto: Ascom/Cuiabá E.C)
Último título conquistado pelo Cuiabá, em final contra o Paysandu (Foto: Ascom/Cuiabá E.C)

Aron Dresch era um dos presentes em Campo Grande naquele dia 8 de fevereiro de 2015. Mesmo sob chuva, não reclamou e não arredou o pé dali. No local usado como cabine de imprensa, tentou se abrigar da chuva - mas não adiantou. O molhaceiro chegou a tirar a transmissão das rádios do ar, por causa dos equipamentos elétricos.

A breve memória nos faz lembrar que, até 'ontem', o patamar cuiabano era próximo do nosso. O futebol mato-grossense que sempre caminhou em níveis próximos ao do sul-mato-grossense, conseguiu crescer e ser alavancado novamente ao patamar nacional, como outrora já aconteceu. Pois, eis aí, uma meia-verdade.

"Não vou colocar como um sucesso geral. Para um estado como Mato Grosso colocar duas equipes onde elas chegaram, como o trabalho que o Luverdense fez e agora o Cuiabá faz, é difícil. Isso é algo mais ligado aos gestores das equipes e não a um movimento do Estado em si", comenta o vice do Cuiabá, Cristiano Dresch.

Até alguns anos, o rival de Lucas do Rio Verde era quem representada o Mato Grosso na Série B, ficando nessa divisão por quatro anos sob o comando de Helmut Lawisch. Contudo, recentemente o clube viu os recursos secarem e o status de 'time exemplar' caiu para o de 'mais um', caindo para a quarta divisão novamente.

"Em um prazo de 10 anos o Cuiabá conquistou dois acessos no Brasileirão e ganhou sete campeonatos mato-grossenses, a Copa Verde duas vezes. É um trabalho constante e que começou em 2009, quando nossa família comprou o clube", explica Cristiano.

E de onde vem o dinheiro? - O vice do Dourado ainda aponta que todo o trabalho exige paciência e investimento de recursos, em maior parte, privados. "Nosso trabalho teve pouco apoio público. Dá pra considerar como totalmente da iniciativa privada, já que recebemos algum recurso, pequeno, em alguns anos apenas".

A reportagem também pediu sugestões sobre como os clubes sul-mato-grossenses podem chegar um dia ao patamar atual do Cuiabá. E a conclusão, mais uma vez, foi essa: é preciso ter paciência para tocar o trabalho, e dinheiro, e não pouco dinheiro.

"Futebol mudou muito nessa década e até na Série D há clubes que investem muito. Creio que tudo tem que ser de dentro para fora. O clube tem se organizar, procurar investimentos, mostrar um trabalho sério, e saber que não é do dia para a noite e o investimento não é baixo", conta Dresch, que completa em seguida.

"Não vejo federação como empecilho. Precisa mesmo é que algum clube faça um projeto de longo prazo e consiga investimento. Tudo isso deve independer dos resultados a curto prazo. Foi isso o que fizemos. No Cuiabá o investimento começou em 2009 e não para. Até hoje investimos alguma coisa no clube", conclui.

O que pensam os cartolas em MS? - Atual campeão estadual e um dos favoritos ao título de 2020, o Águia Negra briga por classificação para a segunda fase da Série D. Neste ano, antes da pandemia, também eliminou o Sampaio Corrêa da Copa do Brasil e, para muitos, é visto como um time promissor para o Estado.

Em 2018, o Cuiabá bateu em casa o Operário por 3 a 0 na Copa Verde, após derrota no Morenão por 1 a 0 (Foto: Ascom/Cuiabá E.C.)
Em 2018, o Cuiabá bateu em casa o Operário por 3 a 0 na Copa Verde, após derrota no Morenão por 1 a 0 (Foto: Ascom/Cuiabá E.C.)

Ainda assim, o presidente do clube, Iliê Martins Vidal, é mais realista e mantém os pés no chão. "Para se organizar precisa de dinheiro, você tem condições para fazer ações, contratar profissionais adequados para cada área e setor. Aqui em Rio Brilhante somos praticamente voluntários", indica o dirigente.

Ele frisa também que o foco acaba sendo profissionais da comissão técnica e jogadores, que vão para o campo, ficando marketing, gerência de setores, entre outras, em segundo ou terceiro plano. "Seria complicado aqui em Rio Brilhante a gente chegar no mesmo nível do Cuiabá, que está em uma cidade grande", diz Iliê, que prossegue.

"Nossa cidade tem 35 mil habitantes apenas, formada por empresas pequenas, comércio pequeno. Gostaria que esse time de sucesso de Mato Grosso do Sul jogando Série B fosse o Águia Negra, mas acredito mais que ele viria de Campo Grande, que tem quase 1 milhão de habitantes e uma gama bem maior de empresas fortes", opina.

Já em Campo Grande, o recém eleito presidente de um clubes mais tradicionais do Centro-Oeste, o Esporte Clube Comercial, é direto em sua opinião. "Futebol é investimento e planejamento. Sem dinheiro não se faz futebol", comenta Claudio Barbosa, sucessor de Valter Manginni, que morreu vítima da covid-19.

"Com bom investimento, você consegue trazer atletas de qualidade, montar um bom elenco e comissão técnica. Precisa daí também um trabalho sério, pagamento em dia. Para melhorar, temos que dar qualidade ao nosso campeonato, grandes jogos, grandes atletas e um plano de marketing que venda uma boa imagem dos clubes", conta.

Barbosa prega ainda que, hoje, o trabalho no Estado para qualquer clube "começa do zero" nesse sentido, com união entre os dirigentes. "Precisamos primeiro ter um lugar apto para jogar futebol. O Morenão, por exemplo, hoje é impraticável".

Para exemplificar a importância do dinheiro no futebol, ele ainda questiona a situação atual de outros clubes do Mato Grosso. "Como está o Luverdense hoje? Para não falar do Operário de Várzea Grande e do Mixto, em situação semelhante a nossa. Futebol não tem muito segredo. É dinheiro", encerra.

Claudio Barbosa é empresário da construção civil e está no Comercial desde 2014, onde atua como gerente e diretor de futebol. "Já gastei uma boa grande. É dinheiro que só sai e não volta", lamenta. Já Iliê é vereador - que em 2020 conseguiu apenas a suplência - e filho de um dos patronos do Águia, Iliê Vidal.

Cuiabá já 'visitou' os três estádios campo-grandenses. Nessa imagem, de 2016, o time encarou e empatou sem gols com o Comercial (Foto: Ascom/Cuiabá E.C.)
Cuiabá já 'visitou' os três estádios campo-grandenses. Nessa imagem, de 2016, o time encarou e empatou sem gols com o Comercial (Foto: Ascom/Cuiabá E.C.)

MT x MS - Entre 2014 e 2019, anos de realização da Copa Verde, o Cuiabá venceu duas edições, 2015 e 2019. Já em 2017, quem venceu o torneio em 2017 foi o Luverdense, que após crise financeira, caiu para a Série D e em 2020 abdicou da disputa. O ano de acesso da Luverdense à segunda divisão foi 2013 - o Cuiabá subiu em 2018.

Nesta década, times do Mato Grosso e de Mato Grosso do Sul se enfrentaram 38 vezes - o 39º encontro acontecerá em breve, dia 28 de novembro, entre Águia Negra e União de Rondonópolis, no estádio Ninho de Águia, em Rio Brilhante, pela Série D.

Um desses 38 encontros realizados foi Corumbaense x Luverdense pela Copa do Brasil de 2019, terminado em um empate sem gols no estádio Arthur Marinho, em Corumbá. O resultado deu a classificação para o time de Lucas do Rio Verde.

Os outros duelos foram 23 pela Série D e 14 pela Copa Verde - onde os mato-grossenses, encabeçados pelas duas principais forças locais, dominaram não só o confronto direto com Mato Grosso do Sul, mas demais estados.

Já na Série D, onde há maior equilíbrio entre as equipes, o panorama foi diferente e, surpreendentemente para muitos, os sul-mato-grossenses vencem o duelo contra os vizinhos do norte. São 10 vitórias para MS, 7 para MT e 6 empates. Nos duelos pela Copa Verde, foram 14 encontros: MT venceu 9 e MS apenas 3. Há ainda 2 empates.

A única vitória sul-mato-grossense contra um dos grandes do futebol mato-grossense aconteceu justamente em 2018, quando o Operário encarou o Cuiabá e, diante de um estádio Morenão lotado, venceu por 1 a 0.

Abaixo, a lista de todos os jogos entre MS e MT pela Série D do Brasileirão (todos na fase de grupos), Copa Verde e Copa do Brasil nessa década:

COPA DO BRASIL

2019

Corumbaense 0x0 Luverdense - 1ª fase - 6 de fevereiro (Arthur Marinho, Corumbá)


SÉRIE D

2013

Águia Negra 2x1 Mixto - 8 de junho (Ninho da Águia, Rio Brilhante)

Mixto 1x0 Águia Negra - 17 de agosto (Presidente Dutra, Cuiabá)


2015

Operário-MT 2x0 Comercial - 8 de agosto (Arena Pantanal, Cuiabá)

Comercial 2x0 Operário-MT - 22 de agosto (Moreninhas, Campo Grande)


2016

Comercial 0x2 Araguaia - 18 de junho (Moreninhas, Campo Grande)

Sinop 2x3 Sete de Setembro - 19 de junho (Gigante do Norte, Sinop)

Araguaia 1x2 Comercial - 8 de julho (Zeca Costa, Barra do Garça)

Sete de Setembro 2x2 Sinop - 10 de julho (Douradão, Dourados)


2017

Comercial 2x0 Sinop - 21 de maio (Morenão, Campo Grande)

União-MT 2x0 Sete de Setembro - 21 de maio (Luthero Lopes, Rondonópolis)

Sinop 2x3 Comercial - 25 de junho (Gigante do Norte, Sinop)

Sete de Setembro 1x2 União-MT - 26 de junho (Douradão, Dourados)


2018

Corumbaense 2x1 Dom Bosco - 28 de abril (Arthur Marinho, Corumbá)

Sinop 2x0 Novo - 29 de abril (Gigante do Norte, Sinop)

Dom Bosco 1x1 Corumbaense - 20 de maio (Arena Pantanal ,Cuiabá)

Novo 2x1 Sinop - 20 de maio (Morenão, Campo Grande)


2019

Sinop 1x1 Corumbaense - 12 de maio (Gigante do Norte, Sinop)

Operário 0x2 União-MT - 12 de maio (Moreninhas, Campo Grande)

Corumbaense 4x0 Sinop - 1º de junho (Arthur Marinho, Corumbá)

União-MT 2x2 Operário - 1º de junho (Luthero Lopes, Rondonópolis)


2020

União-MT 0x0 Águia Negra - 19 de setembro (Luthero Lopes, Rondonópolis)

Águia Negra 3x1 Operário-MT - 19 de outubro (Ninho da Águia, Rio Brilhante)

Operário-MT 0x0 Águia Negra - 22 de outubro (Dito Souza, Várzea Grande)


COPA VERDE (mata-mata)

2015 - 1ª fase

Cene 0x1 Cuiabá - 8 de fevereiro (Olho do Furacão, Campo Grande)

Cuiabá 3x1 Cene - 22 de fevereiro (Arena Pantanal, Cuiabá)


2016 - 1ª fase

Comercial 0x0 Cuiabá - 9 de março (Moreninhas, Campo Grande)

Cuiabá 2x0 Comercial - 16 de março (Arena Pantanal, Cuiabá)


2018 - 1ª fase

Corumbaense 0x2 Luverdense - 31 de janeiro (Arthur Marinho, Corumbá)

Operário 1x0 Cuiabá - 7 de fevereiro (Morenão, Campo Grande)

Cuiabá 3x0 Operário - 15 de fevereiro (Arena Pantanal, Cuiabá)

Luverdense 3x2 Corumbaense - 21 de fevereiro (Passo das Emas, Lucas do Rio Verde)


2019 - 8ªs e 4ªs de final

Costa Rica 2x1 Sinop - oitavas - 8 de agosto (Laertão, Costa Rica)

União 2x3 Luverdense - oitavas - 8 de agosto (Moreninhas, Campo Grande)

Luverdense 6x2 União - oitavas - 20 de agosto (Passo das Emas, Lucas do Rio Verde)

Sinop 0x3 Costa Rica - oitavas - 14 de agosto (Gigante do Norte, Sinop)

Costa Rica 1x1 Cuiabá - quartas - 9 de setembro (Laertão, Costa Rica)

Cuiabá 2x1 Costa Rica - quartas - 11 de setembro (Arena Pantanal, Cuiabá)

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