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Arquitetura

Casarão no Centro foi do 1º industrial a chegar, nome apagado pela hanseníase

Paula Maciulevicius | 15/08/2015 07:23
Se fosse vivo até hoje, o dono que o construiu não deixaria se apagar a memória daquela forma. (Foto: Marcos Ermínio)
Se fosse vivo até hoje, o dono que o construiu não deixaria se apagar a memória daquela forma. (Foto: Marcos Ermínio)

Abandonado, o casarão da Rua Antônio Maria Coelho, quase esquina com a 13 de Maio, tem de história, o que infelizmente, apresenta de desgaste. Se fosse vivo até hoje, o dono que o construiu não deixaria se apagar a memória daquela forma. Espanhol, a família acredita que não é uma figura tão lembrada na história, por ter sido vítima de uma doença de peso nefasto no passado, a hanseníase.

Ignácio Gomes foi o primeiro maquinista de Campo Grande, até mesmo do Estado. Foi ele quem estava à frente da primeira locomotiva que cruzou os trilhos da Noroeste de São Paulo para cá. Dentre "primeiros", são vários os títulos que ele acumula: primeiro industrial, pioneiro no setor com máquina de arroz e café, um dos diretores que ajudou a fundar a Santa Casa e mais, foi ele quem trouxe a telefônica para a Capital.

Nascido na Espanha, Ignácio chegou com o irmão, segundo consta a data de desembarque no passaporte, em 1899, de navio ao Brasil. Quem conta a história ao Lado B é o bisneto de Ignácio, Roberto Gomes Magalhães, de 55 anos. "Eles vieram trabalhar na construção da NOB. Meu bisavô fazia o pagamento dos operários, vinha de São Paulo num burro", relata.

Foto dos fundadores da Santa Casa. Ignácio é o terceiro da esquerda para a direita, na segunda fileira.
Foto dos fundadores da Santa Casa. Ignácio é o terceiro da esquerda para a direita, na segunda fileira.

A chegada em Campo Grande foi em 1914, junto dos trens da Noroeste. "E foi a pessoa que trouxe a indústria para o Estado, se hoje ainda é assim, imagina aquela época? Sempre foi agropecuário", explica Roberto. Por aqui havia já a produção de café, mas o grão precisava ser tratado em São Paulo. E junto da máquina de arroz, Ignácio também instalou a de beneficiar café. "E ele fazia tudo funcionar sem energia elétrica", pontua o bisneto.

Se por um lado o espanhol era bem quisto por todas as benfeitorias, de outro, era mal visto por conta da hanseníase. Antes que a doença o atingisse, ele ainda construiu a Santa Casa de Campo Grande. "Eu tenho a foto original dos diretores que fundaram. Ele doou tijolos da olaria que tinha em Rio Pardo", narra Roberto.

Além da contribuição na saúde, também foi pelas mãos dele que veio a "Telefônica" para Campo Grande. O bisneto conta que a sede foi junto da máquina de arroz e foi de propriedade da família dele antes de ser vendida aos Neder.

Relíquia, o alvará para construção da casa.
Relíquia, o alvará para construção da casa.

Mas é na casa que Roberto concentra quem foi o bisavô que ele nem chegou a conhecer pessoalmente, apenas de relatos e de ouvir falar. Erguida em 1922, o imóvel foi feito pela própria construtora que Ignácio tinha na Capital.

"Para mim, aquilo é uma obra de arte. O forro é desenhado de modo que permitia aberturas e não se sentia tanto calor ali dentro, tem pé direito duplo..." a descrição arquitetônica o faz viajar no tempo e lembrar que a residência tinha até um porão, onde ele brincava o tempo todo.

"Ela aparenta ser grande, mas não é. É uma casa modelo espanhol, tem uma grande sala no centro, três quartos em volta e a cozinha", explica. A casa não seguia um único estilo e misturou um pouco do romano e do gótico para chegar no eclético que hoje a gente, se prestar bastante atenção, consegue enxergar.

O imóvel ficou na família até meados de 2007. De herança, foi a tia-avó de Roberto que a vendeu e desde então, a casa guarda história só na memória da família, por amargar anos em processo de tombamento.

"Para a cidade, para o Estado, o que o meu bisavô fez, ele foi empreendedor. Chegou aqui como peão de estrada de ferro e fez história em Campo Grande, só não fez riqueza porque ajudava a qualquer um que pedisse. Meu sonho era restaurar aquela casa em homenagem a esses meus ancestrais", resume o bisneto.

Tia-avó de Roberto que a vendeu e desde então, a casa guarda história só na memória.  (Foto: Marcos Ermínio)
Tia-avó de Roberto que a vendeu e desde então, a casa guarda história só na memória. (Foto: Marcos Ermínio)
O imóvel ficou na família até meados de 2007. (Foto: Marcos Ermínio)
O imóvel ficou na família até meados de 2007. (Foto: Marcos Ermínio)
E amarga há anos no processo de tombamento. (Foto: Marcos Ermínio)
E amarga há anos no processo de tombamento. (Foto: Marcos Ermínio)
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