Após AVC e Alzheimer, fotógrafo ‘arquivo’ de MS enfrenta o câncer
Há 16 anos, com sequência de diagnósticos, Higa continua insistindo em dormir com câmera ao lado
Em meados de 2008, após ter o primeiro AVC (Acidente Vascular Cerebral), o fotógrafo conhecido por ser um arquivo de Mato Grosso do Sul, Roberto Higa, foi diagnosticado com Alzheimer. Desde então, as memórias recentes ficam confusas e, neste ano, a vida precisou ser refeita mais uma vez para enfrentar um câncer. Em meio a tudo isso, o descendente de okinawanos faz questão de continuar dormindo com a câmera ao lado, como sempre fez.
“A vida do repórter fotográfico é uma união de fatos que você acaba fazendo parte daquilo e vendo de tudo. E é engraçado quando algo acontece na sua vida, porque você já viu aquilo de um jeito diferente”, resume Higa sobre os últimos meses. É por isso que ele comenta sobre como perdeu as contas de quantas vezes já não viu e fotografou sobre a doença.
Inclusive, puxando na memória, até mesmo a inauguração do Hospital do Câncer ele diz ter estado para registrar. Higa, que já trabalhou em jornais de Campo Grande e na Secretaria de Comunicação do Governo do Estado, viu grande parte da história regional acontecendo.
Desde “raizeiro” que dizia curar justamente o câncer até o hasteamento da primeira bandeira de Mato Grosso do Sul, histórias não faltam para ser contadas a partir de seu olhar fotográfico. O ponto é que, agora, de um jeito diferente de lidar com o “novo” diagnóstico, Higa confessa que, diferente de pulsar vida como se acostumou, sentiu a revolta com o medo da morte.
Quando você vê a morte pela frente, você vê como a gente não vale nada. E olha como é engraçado o que acontece, eu estava desenvolvendo um projeto para fazer fotografias dos antigos cemitérios de Campo Grande antes de saber do câncer. O rapaz até me ligou, perguntou do câncer e eu disse que agora era hora de dar uma pausa no projeto, que precisava segurar a onda”, diz Higa.
Sobre o diagnóstico, sua esposa, Sandra, explica que a história poderia ter sido ainda mais difícil por uma falha de diagnóstico. Em meados de junho, o fotógrafo começou a sentir um incômodo para engolir e o primeiro médico solicitou um ultrassom.
Como resultado, a resposta foi de que havia um cisto pequeno, do tamanho de um grão de arroz, e que ninguém precisava se preocupar. Pouco tempo depois, Higa fez sua consulta de acompanhamento com endocrinologista e reclamou novamente.
Segundo Sandra, a partir de uma endoscopia solicitada pelo segundo médico foi constatado que o “grão de arroz” tinha crescido e que, na verdade, era um tumor. A partir dali, o tratamento começou e, hoje, o primeiro ciclo da quimioterapia já foi concluído.
Lidando com dias bons e outros ruins, sempre com uma sonda, Higa explica que todo o tratamento é uma união entre desgaste e acolhimento vindo da família e da equipe do hospital.
Já tendo superado momentos de se questionar sobre a doença, ele garante que sua máquina continua acompanhando a variação do cotidiano.
“Eu tive uma vida muito ativa e até hoje eu fotografo, mesmo com o câncer. Acho que essa é uma obrigação minha, esse é o legado que vou deixar. Querendo ou não, é a história da minha vida unida com a da minha cidade e do meu Estado”.
Para exemplificar a afirmação, ele comenta sobre os registros da divisão do Estado e explica que sempre sentiu e continua sentindo uma certa responsabilidade. “Eu tenho comigo que sempre tive um compromisso e, hoje, em qualquer lugar que eu vá, tenho certeza que vou encontrar alguém que me conhece, alguém que conheci o pai, a mãe, os avós”, descreve.
E, graças às memórias antigas que não foram consumidas pelo Alzheimer, ele lembra de ter aprendido a andar com uma escada com fotógrafos de Brasília para não perder os registros, a fotografar mais do que as belezas pelas ruas e de estar presente na maior quantidade de lugares possíveis.
“Ela (a máquina fotográfica) sempre foi e continua sendo minha companheira, vai ser assim. Eu sempre gostei de registrar o cotidiano, ia até em lugar que não era convidado, policiais passavam aqui em casa para me buscar em uma época em que eles levavam a gente para registrar o que iam fazer. Era diferente de hoje, mas o tempo passou e eu continuei”, completa.
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