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Comportamento

Paredes de antigo orfanato ainda são casa para quem cresceu por lá

Antigas "internas" voltaram ao Educandário Getúlio Vargas para trabalhar

Por Aletheya Alves | 04/08/2024 07:25
Educandário Getúlio Vargas continua com ações, mas sem internato. (Foto: Osmar Veiga)
Educandário Getúlio Vargas continua com ações, mas sem internato. (Foto: Osmar Veiga)

Criado em 1943 com outras 22 unidades distribuídas pelo Brasil, o Educandário Getúlio Vargas continua sendo uma “casa” para quem viveu sua época de orfanato e, anos depois, retornou para trabalhar. A estrutura chama atenção e, agora, Chirley da Oliveira Santos e Leonice Fernandes relatam como ver o espaço com outros olhos ainda traz memórias de ter crescido em uma dinâmica totalmente diferente.

Quando foi fundado, o espaço acolhia filhos de pais diagnosticados com hanseníase e que costumavam morar no Hospital São Julião. Com isso em mente, por mais de 40 anos ali era um orfanato.

“Aqui é muito grande, mas sabe que a gente nunca ficou reparando nisso porque era tanta criança, tinha tanta coisa que a gente não reparava”, diz Chirley de Oliveira Santos. Hoje, ela integra o quadro de funcionários, mas chegou ao Educandário aos quatro anos de idade.

Dividindo os trabalhos na “sala de biscoito” com Chirley, Leonice Fernandes também conheceu o endereço na Vila Rica durante a infância e fez o processo de retorno anos depois.

Chirley e Leonice cresceram em meio ao prédio. (Foto: Osmar Veiga)
Chirley e Leonice cresceram em meio ao prédio. (Foto: Osmar Veiga)

Hoje, depois de uma vida construída com um formato totalmente diferente do tradicional, elas contam que pensar no Educandário é entender que, considerando a situação em que estavam, crescer ali foi uma oportunidade.

“Quando a gente saía daqui, alguém sempre levava a gente. Então, ninguém sabia direito nem o nome da rua principal da cidade”, brinca Chirley. Sobre sua história, ela narra que seu pai veio para Campo Grande se tratar da hanseníase no São Julião e, consequentemente, os filhos seguiram para o Educandário.

Depois, o pai retornou para o Mato Grosso e ela, assim como as irmãs, continuou no orfanato. Devido à distância, as visitas eram feitas uma vez ao ano e as outras crianças, assim como a equipe que trabalhava no Educandário, se tornaram sua família.

“Alguns internos têm essa culpa, pensam nos pais por terem deixado eles aqui, mas isso nunca passou pela minha cabeça. Minha mãe fala sobre o assunto, de como não criou a gente, mas eu não tenho esse ressentimento. Para mim, foi uma oportunidade que ganhei aqui”, descreve Shirley.

Leonice, por sua vez, teve duas passagens pelo então orfanato. No primeiro período ficou por cerca de dois anos e voltou quando tinha sete. Desde então, seguiu até os 15 anos.

Parquinho é lembrança antiga que aguarda por restauração. (Foto: Osmar Veiga)
Parquinho é lembrança antiga que aguarda por restauração. (Foto: Osmar Veiga)

Diferente da colega de produção de biscoitos, a história não envolveu a hanseníase. “No meu caso e dos meus irmãos, era uma questão financeira. Minha mãe não tinha como criar a gente, não tinha condições e colocou a gente aqui”.

De toda forma, as duas cresceram no Educandário e explicam que as dinâmicas eram totalmente diferentes. “Lembro que tinha muita gente para fazer tudo, lavar, passar, cozinhar, mas chegou um período em que a gente começou a fazer parte dessas coisas e ainda bem”, relata Shirley.

Explicando o motivo do “ainda bem”, ela detalha que como cresceu por ali, até tarefas básicas de uma casa “tradicional” era algo diferente. “Se a gente não tivesse começado a fazer, eu teria saído sem saber nem fazer um arroz porque outras pessoas faziam”.

É claro que nem todas as memórias são boas, mas as duas argumentam que o foco acaba sendo esse. “Eu mesma me casei aqui dentro, meu marido também morou aqui e foi assim que a gente se conheceu. E eu falo que devo minha vida à dona Nelly (presidente do Educandário) porque ela é quem nos criou”.

Para Leonice, precisar viver de um jeito diferente também acabou sendo a melhor forma. “Eu agradeci por ter ficado aqui porque as oportunidades vieram assim e minha mãe vinha ver a gente todo último domingo do mês. Não era o ideal, mas aqui aprendi meus princípios e o que a gente é hoje se deve à existência do Educandário”, completa.

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