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Comportamento

Piadas e pressão masculina fazem mulherada travar e voltar as aulas de direção

Elverson Cardozo | 15/04/2015 06:34
Carro do projeto "Sem Medo de Dirigir". (Foto: Fernando Antunes)
Carro do projeto "Sem Medo de Dirigir". (Foto: Fernando Antunes)

O machismo continua se manifestando e das maneiras mais clássicas. Até na hora de colaborar, tem homem que consegue complicar a vida de uma mulher.

Pensando em atender motoristas habilitados, que por algum motivo não conseguem mais enfrentar o trânsito, os centros de formação de condutores recebem muitas mulheres inseguras depois das piadinha e pressão dos companheiros.

Seja por trauma ou falta de prática, o projeto “Sem Medo de Dirigir”, da Mônaco, em Campo Grande, tem auxiliado muita gente e, na contramão disso, revelado que o machismo disfarçado de piada ainda existe e faz vítimas.

Não é por acaso que, em dois anos de projeto, apenas mulheres, cerca de 400, procuraram a escola. A constatação diretor de ensino e proprietário da Mônaco, Jairo Ricci, 47. A grande maioria, diz ele, deixa a chave de lado por pressão do marido.

“Elas reclamam muito que eles apavoram, às vezes não compreendem e ficam pressionando, falando: 'vai mais rápido', 'você é lerda....' Isso gera um bloqueio. Começa com abordagens dessa natureza, mas depois vai se intensificando As mulheres geralmente são mais tranquilas para dirigir, mais calmas. Os homens costumam ser afoitos”, diz.

O problema é que, em alguns casos, a pressa deles afeta elas, e isso vira um problema sério, muitas vezes difícil de ser contornado. Aí o jeito é buscar ajuda profissional.

A supervisora de pesquisas Ana Benevides, 42, fez isso quando, há 4 anos, parou de dirigir por conta de um acidente, batidinha besta, no muro”, como ela mesma diz.

A “batidinha” não teria a afetado tando se o namorado oferece apoio. Mas, ao invés disso, vieram críticas. “Ele é, realmente, muito machista. Sempre fala: 'tem que ser mulher'. Isso fez com que eu pegasse mais medo”, afirma. Sem coragem para enfrentar o trânsito com segurança, ela decidiu buscar ajuda.

“Fiz oito aulas, mas na terceira já estava dirigindo. No primeiro dia, a instrutora que me atendeu falou que não sabia porque eu estava fora do trânsito”, relembra. Mas, antes de pegar no volante de novo, a supervisora participou de dinâmicas em grupo, com outras mulheres que enfrentavam problemas semelhantes. Esse trabalho é comandado por uma psicóloga, especialista na área.

“São quatro sessões com ela, para ver qual a dificuldade do aluno. A maioria não precisa de atendimento particular porque logo consegue romper a barreira”, explica Jairo. As necessidades são variadas, mas, em geral, a grande maioria tem medo de andar em locais movimentos, como o Centro da cidade. Como o projeto atrai mulheres, tudo foi pensado para recebê-las bem, e o resultado é bastante previsível.

Sala tem rosa de sobra na decoração. (Foto: Fernando Antunes)
Sala tem rosa de sobra na decoração. (Foto: Fernando Antunes)

“Nossa sala é com ambiente rosa e nosso carro é rosa com roxo. É para dar uma atenção adequada”, comenta. Apesar de chegarem fragilizadas, a mulherada sai forte quando aprende lições básicas, que vão além das leis de trânsito.

Ana Benevides é a prova disso. “Entendi que estava dando muita reverência para pessoas que nem conhecia, porque ficava preocupada com o que falariam de mim caso cometesse barbeiragem. Todo motorista, mesmo sendo profissional, faz barbeiragem. A psicóloga pediu que eu voltasse a conhecer o meu carro, namorasse ele um pouquinho, mesmo desligado”, revela.

A lição valeu a pena, mas, e o namorado machista? “Parei de dar ouvidos a ele cem por cento. Mandei plantar batata”, dispara. É uma boa estratégia, dizem os especialistas.

Para homens e mulheres - Há outras empresas em Campo Grande que oferecem esse tipo de trabalho, mas sem estabelecer diferenças entre os sexos.

A Novo Sentindo, aberta em janeiro, é uma delas, ajuda quem já tem CNH mas não consegue dirigir. “Não somos uma autoescola porque não entramos na área de formação de condutores. Somos um centro de treinamento para habilitados”, esclarece o sócio-proprietário Joad Maria dos Santos, 27.

Ele comanda o negócio com o pai, Rosimar Marques, que tem 25 anos de experiência como instrutor e já atendeu, nesse tempo todo, muita gente desesperada. “O pessoal que fazia uma, duas, três vezes o teste no Detran e não conseguia passar vinha para ele”, conta o rapaz.

Depois de acumular histórias de sucesso, ele resolveu empreender e agora só trabalha com quem já tem CNH, mas continua com medo de dirigir. Rosimar não é um psicólogo, nem qualquer formação na área, mas, segundo o filho, é paciente como poucos.

“Nosso trabalho é bem de ouvinte. A gente ouve o aluno, escuta as necessidades dele e, depois, fazemos a proposta e apresentamos o planejamento de aulas. […] É uma questão bem emocional”, declara. Até agora, Joad e o pai atenderam casos diferentes e, por isso, ainda não arriscam dizer o que é mais comum.

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