Raquel trocou a ostentação da formatura por R$ 6 mil em viagens pela América
No dia 10 de outubro a noite foi de baile de formatura da turma de Raquel Lopez, de 23 anos, graduada em Psicologia pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). Mas sem vontade e paciência de se arrumar para aquele momento, ela decidiu trocar a ostentação do evento social por uma experiência maior. Partiu para comemorar sua formação de mochila nas costas. A escolha trouxe à psicóloga momentos de riso, lágrimas, dores e saudades. Mas nada foi mais recompensador do que o aprendizado sobre a própria vida, o que ela compartilha no Voz da Experiência.
"Nunca gostei de festas, bailes ou casamentos. É muito dinheiro gasto! Também não gosto de ter que me arrumar, colocar salto, fazer cabelo e maquiagem. Formatura é uma apresentação, assim como historicamente, os 15 anos são uma apresentação da mulher para sociedade.
Por isso, optei por usar a grana de um dia de festa para viajar. Compreendo que para algumas pessoas, festas são importantes, mas prefiro comemorar com a mochila nas costas, com calo nos pés, cabelo emaranhado, roupa amarrotada, comendo pão com abacate, pegando ônibus noturno para economizar na hospedagem, falando português, inglês e espanhol na mesma frase, me desafiando em trilhas e altitudes, tendo que manter a calma depois de ser roubada, fazendo xixi na latrina e tomando banho de lenço umedecido, dormindo em hostel e conhecendo novas pessoas, todos os dias.
Tive certeza que dava conta de viajar sozinha, depois da minha primeira viagem ao exterior, em janeiro, para a Bolívia. De lá pra cá, comecei a articular meu projeto de comemorar a formação viajando pelo Peru, Argentina, Uruguai e Chile.
Calculei, mais ou menos, o quanto gastaria para fazer a festa. Precisaria de pelo menos R$ 6 mil. Juntei todo esse dinheiro em dólares, com a certeza que jamais gastaria essa grana em apenas uma noite. Também não ligaria de ficar 20 horas dentro de um ônibus, mas por sorte, consegui passagens aéreas na promoção.
De mochila pronta, dei início a minha jornada desembarcando no Peru, o país que eu mais tinha gana de conhecer. Para minha surpresa, fui furtada no terceiro dia de viagem. Levaram meu cartão e celular no hostel. Acabei usando uma grana extra que pensei que não usaria. Mas o meu desespero começou quando a pessoa que roubou o celular passou a usar minhas redes sociais para comercializar aparelhos roubados. Levei um tempo até conseguir recuperar minhas contas.
Chateada com a situação, até pensei em desistir, mas segui adiante. Mas toda aventura só estava começando. E assim tive outra surpresa ao entrar na Casa de Câmbio. Entreguei ao funcionário duzentos dólares, mas ele só lançou no sistema, metade do valor. Eu disse que havia entregado outra quantia, mas ele negou. Chamei a polícia, andei até camburão no Peru, mas infelizmente não consegui o dinheiro de volta.
Foi mais uma lição para ficar atenta. Infelizmente a galera se aproveita de quem não conhece a moeda local e isso pode ser grande desafio durante a viagem.
Mas segui meu caminho, porque a viagem é um desafio interno em que não há para onde correr. O máximo que consegui foi chorar no travesseiro de um hostel, sem ter com quem conversar ou lutar por um internet para conseguir desabafar com a família e os amigos em algum momento do dia. Mas nenhum sofrimento foi capaz de me fazer desistir.
Se encontrei coisas boas pela frente? Não me faltam lembranças de cada lugar que passei. No Peru me deparei com o alto turismo, com lugares belíssimos, como nunca tinha visto. Mas não superei minhas expectativas quanto a espiritualidade do país. Sinceramente? Esperava mais.
Na Argentina conseguir fazer uma tour entre museus, prédios e casas de amigos. Me surpreendi com uma arquitetura diferente e, principalmente, por ser um lugar de muitos estudos da Psicologia.
Mas no Uruguai fiquei encantada em como as coisas funcionam. O casamento gay, a legalização do aborto e da maconha, são exemplos do avanço um país da América do Sul conseguiu desenvolver muito melhor do que nosso [Brasil] que é, absurdamente hipócrita. Presenciei o quanto a separação da influência religiosa nas questões políticas é importante para a vida social e mental.
Já o Chile foi um país caro na hora de comer, mas também é lindo em seus detalhes. Porém, não consegui viajar para o norte do país, pela falta de roupas de frio. Essa foi outra lição já que meu erro foi encher a mala de short e vestido, enquanto passei a viagem inteira usando e lavando as únicas três calças e casacos que havia levado na mochila.
Um tempo comigo - Sou uma pessoa que busca mudar sempre, sem estagnar na forma de pensar e ver o mundo. Acredito que essa viagem trouxe muitas transformações, entre elas, sentimentos que ainda estou vivendo. Diante das batalhas, experiências boas e ruins, continuo absorvendo tudo isso.
Mas acho que a grande sacada em viajar sozinha é ter tido a chance de estar um tempo comigo, aprendendo me amar e respeitar mais. Acredito que volto para o Brasil uma Raquel que descobriu a força que não imaginava ter. Agora, só posso ser grata por toda coragem em ter feito isso".