Corumbá e o sonho de ter a estação tão cheia quanto a do outro lado da fronteira
O silêncio, cortado apenas pelo miado aflito de um gato, impera na estação ferroviária de Corumbá. No mais, tudo é esquecimento. Vagões enferrujam nos trilhos, bilheterias vazias, plataformas sem chegadas e despedidas. Nada restou da agitação de outrora e o futuro se mostrou muito diferente do presságio de 8 de maio de 1968.
Eternizado em uma placa, dizeres de que aquela estação seria a “a mais arrojada integração ferroviária sul-americana”. Sem transporte de passageiros pelos caminhos de ferros, pois o Trem do Pantanal encerra o itinerário em Miranda, a esperança agora é o minério de ferro.
O prefeito de Corumbá, Paulo Duarte (PT) conta que foi procurado pela diretoria da ALL (América Latina Logística). “A notícia importante é que ainda no primeiro semestre vão reativar o transporte de minério entre Urucum a Antônio Maria Coelho”, afirma.
Serão mais 40 quilômetros de trilhos em boas condições. Para o prefeito, uma coisa pode levar a outra. Ou seja, a circulação dos minérios até a hidrovia do rio Paraguai abrirá caminho para o trem de passageiros. Corumbá fica na fronteira com a Bolívia e pode fazer a interligação com os trens que partem de Puerto Quijarro.
A chegada do Trem do Pantanal à Cidade Branca é uma briga que começou em 2009, ano da reativação do meio de transporte. No ano passado, Paulo Duarte, ainda deputado estadual, acionou o MPF (Ministério Público Federal) para cassação do contrato com a ALL, que detém a concessão para operar a ferrovia.
A degradação da estação ferroviária também virou procedimento de investigação, por ter recebido dinheiro público para reforma. Depois de muitas promessas, saudades e frustrações, o Trem do Pantanal foi reinaugurado em 8 de maio de 2009, com festa pelo então presidente Lula e toda a classe política. O trem voltou não mais como de passageiros, que ia de Campo Grande a Corumbá, mas como produto turístico e o trajeto até Miranda.
O mito do Trem da Morte - Uma leve torcida de nariz e a resposta que se trata do trem da vida. É assim que você será recebido em Puerto Quijarro, na Bolívia, se perguntar pelo Trem da Morte. “Isso é coisa de brasileiro”, afirma Carlos Lora Castelo, funcionário da estação de onde parte o trem até Santa Cruz de La Sierra.
Do lado de lá da fronteira com Corumbá, descobre-se que não é um, mas três trens, movimentados, imagem bem diferente da encontrada na estação da vizinha brasileira .
O top é o Ferrobus. Classificado como “um pouco mais rápido”, ele faz a viagem em 12h30. Com a passagem vendida por R$ 85, o trem é escolhido por turistas e funcionários de empresas. Para quem embarca, é oferecido jantar e café da manhã.
Tido como intermediário, o Expresso Oriental demora 15 horas no percurso. Os vagões têm ar-condicionado, televisão, lanchonete e poltronas reclináveis. A passagem custa R$ 43. No feriado do Carnaval, a composição estava parada na estação e foi visitada pela equipe do Lado B.
Já o que leva o nome e a fama é o Regional. São nada menos dos que 18 horas de viagem. E, detalhe, sem ar condicionado. No Brasil, seria o pinga-pinga, aquele que para em todas as estações do caminho. “É o trem do povo”, define Carlos. No Trem da Morte, vai gente, carga, mudanças. A estafante viagem pode ser feita em poltrona fixa, que custa R$ 17, ou na poltrona reclinável, ao preço de R$ 38.
Mito ou não, a verdade é que o trem vem num enredo de reclamações e temores. Uma das explicações aventadas é a morte de milhares de funcionários na construção da ferrovia. Outra, digna de Gabriel García Marquez, é de que o trem foi utilizado para o transporte de mortos durante epidemia de malária.
Se as possíveis explicações remetem ao passado, as críticas pululam na internet. Reclamam que o trem não tem luz, banheiros em péssimas condições, água e comida sem condições de consumo, além de furtos durante a viagem.