Lembrando infância, porteiro faz alegria ao construir rolimãs no São Francisco
Aos 41 anos, André Wilian tem saudade da infância. Mas concilia o trabalho de porteiro com a produção artesanal de carrinhos de rolimã, que vende no São Francisco. Para ele, quem nunca desceu uma ladeira brincando, não sabe como é divertido. Vendendo, faz a alegria de crianças e adultos que revivem o passado ou experimentam aquele sensação boa do friozinho na barriga pela primeira vez.
Ele mora no bairro há 20 anos e durante um período desempregado escolheu o artesanato como forma de ganhar o dinheiro. Sempre apegado ao reaproveitamento, todo trabalho que faz é com materiais descartados que ele não deixa ir para o lixo.
Os carrinhos, por exemplo, são feitos com madeira que ele encontra na rua. Bem lixado, pintado e com parafusos mais reforçados, os rolimãs de André são muito mais elaborados do que os que ele fazia quando ainda era criança. "No meu tempo, a gente mal lixava a madeira e nem se preocupava muito com detalhes. O freio era mesmo com o pé e tudo que a gente queria era adrenalina", lembra.
Ainda que simples, os rolimãs têm freio e o colorido para que desperte a atenção das crianças de hoje. "Tem criança que olha e nem sabe o que é ou para o que serve. Geralmente, explico ou o próprio adulto acaba lembrando da infância e explicando para o filho", comenta.
Para André, os rolimãs são brinquedo que ensinam. "A gente desenvolve o equilíbrio, tinha noção de velocidade e tempo. Sem contar o desafio em perder um pouco do medo com a emoção durante a descida. Impossível esquecer ou não querer descer tudo de novo", comenta.
Quando criança, as aventuras deixaram cicatrizes pelo corpo. Mesmo assim, ele não abre mão da brincadeira e da produção dos carrinhos. "Na nossa época era mais insano, a gente não tinha medo, não se preocupava nem com os carros na rua. Vivia todo mundo ralado, chegava em casa machucado, a mãe brigava, mas no outro dia estava todo mundo de novo andando. Tempo bom que dá muita saudade", relata.
Mas emoção maior para ele é ver as crianças descobrindo uma nova realidade, que acaba não tendo preço. "É o tipo de coisa que mostra que não precisa de muito para se divertir. Geralmente, os adultos compram para que as crianças passem pela experiência que nós passamos. Isso é muito bacana. A gente pensa que não, mas o fato é que todo mundo pode ser arquiteto do próprio destino. Por isso que mantenho a ideia do carrinho", diz.
Prova disso, foi sorriso da pequena Joana de Oliveira Lima, de 8 anos, que experimentou uma descida pela primeira vez, ao lado da mãe Karen Campos, no feriado. O brinquedo fez parte da infância de Karen e a vontade era de que a filha passasse pela mesma emoção que ele teve há mais de 20 anos.
"Eu tenho uma ligação muito foi com esse brinquedo. Cresci descendo as ladeiras lá no Cophatrabalho. No meu tempo, tinha uma rua que terminava em um córrego, a gente descia e caia na água com carrinho e tudo. Era a melhor sensação do mundo", relembra a mãe.
Em uma ladeira da Pedro Celestino, perto da avenida Rachid Neder, chegou a vez de matar a saudade. "Eu lembro que na minha época fazer um rolimã era uma independência na infância. A gente se considerava aventureiro. Com o tempo, isso foi passando e hoje é tão difícil ver as brincadeira, que quando surgiu a ideia, eu logo pensei que Joana precisava viver isso", diz.
No primeiro contato, o medo tomou conta de Joana. A filha não queria se arriscar na velocidade que a mãe tanto tinha saudade, mas aos poucos foi se sentindo confiante ao lado da Karen. Depois de descer sozinha, não demorou muito para querer brincar novamente. "Gostei, quero de novo", disse sorrindo.
Ver a filha se arriscando, também trouxe alegria para o coração da mãe que há tanto tempo não brincava com ela. "Fazia tanto tempo que a gente não brincava assim, que pra mim o sentimento é de gratidão. É emocionante, nunca imaginei colocar minha filha em cima de um brinquedo que fez parte da minha geração", descreve emocionada.
Depois de algumas decidas, o sorriso estampado no rostinho de Joana deixou clara a importância daquela tarde. "Ela é tímida e toda delicada. Até pensei que ela não iria gostar e agora vou acabar dando de presente", promete Karen.
Para André a sensação é compartilhada com a mãe. "É muito bom, quem dera se todas as crianças tivessem contato com toda essa simplicidade...", sugere.
Quem deseja adquirir um carrinho, eles são vendidos toda terça-feira na Feira São Chico, na rua 14 de J,ulho. Os carrinhos também são feitos sob encomenda e os preços variam de R$ 50 a R$ 70 conforme o tamanho escolhido. O telefone para contato é: (67) 99221-5363.