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Sabor

Elair e Alexandre levantam às 3h para alimentar Campo Grande

Nos 123 anos de Campo Grande, dois salgadeiros falam com alegria sobre madrugar na cidade

Thailla Torres | 26/08/2022 08:56
Campo Grande News - Conteúdo de Verdade
Elair é comerciante que começa assar pão de queijo às 3h50, de segunda a sábado. (Foto: Marcos Maluf)
Elair é comerciante que começa assar pão de queijo às 3h50, de segunda a sábado. (Foto: Marcos Maluf)

Entre as conquistas resultantes da venda de pão de queijo, a que mais orgulha Elair Leminski, de 65 anos, é ter condições de viver em Campo Grande. “Uma cidade boa demais para viver”, afirmou Elair, que há um ano mudou-se para a Capital e tem lanchonete na Rua 26 agosto.

Elair está entre as dezenas de salgadeiros que fazem das madrugadas as primeiras horas de trabalho do dia, para garantir ao campo-grandense a refeição considerada indispensável. “E com dinheiro ou sem dinheiro aqui ele [freguês] come”,avisa.

Fora do alcance dos olhares dos clientes, no balcão, está um caderno de folhas encardidas, com anotações das vendas do dia e seus devedores. Apesar do número de vendas penduradas, ele ressalta outra característica do campo-grandense que pouca gente comenta. “São bons pagadores, viu”, avalia. “Não fico um dia sem receber dinheiro de quem está me devendo”, garante.

Isso são alguns dos detalhes que motivam Elair a levantar todos os dias, às 3h da madrugada, para assar pão de queijo e servir fornadas quentinhas a partir das 5h no estabelecimento.

O salgado a R$ 3,50 pode ser consumido com um copo de café bem servido a R$ 1,00. Ali o cafezinho é preparado em três versões: com açúcar, pouco açúcar e sem açúcar. Cuidado que gera cada vez mais clientes e deixa Elair animado.

“E com dinheiro ou sem dinheiro aqui ele [freguês] come”, avisa Elair. (Foto: Marcos Maluf)
“E com dinheiro ou sem dinheiro aqui ele [freguês] come”, avisa Elair. (Foto: Marcos Maluf)

O que pouca gente sabe é como o salgadeiro veio parar em Campo Grande. Natural de Guarapuava (PR), ele viveu o maior perrengue na pandemia. “Eu trabalhava num restaurante e parou tudo por lá.Um dia fui no shopping, comprei um chope gelado e decidi que assim escolheria um lugar novo para viver. História estranha, né? Mas é verdade, tomando chope escolhi Campo Grande”.

Ele já tinha visitado a capital sul-mato-grossense em anos anteriores e lembrava bem da Rua 14 de Julho. “Cheguei aqui e ela já estava transformada, mas continuava linda. A cidade, do mesmo jeito, tranquila e boa pra viver”.

Foi então que ele ficou e dias depois teve a ideia de vender salgados.Antes a fritura e os assados reinavam na vitrine, mas um dia esqueceu de comprar os salgados para preparar e teve que se virar com os pães de queijo.Não deu outra, Elair desistiu dos demais salgados e passou a vender só pão de queijo que, segundo ele, deu sorte.

“Ele me traz sorte todo dia, mais do que isso, ele me traz amigos.Cada cliente que passa aqui é uma história, uma vivência”, relata.

Desde então madruga para alimentar quem pula cedo para pegar ônibus.Tem dia que ele chega a entregar o pãozinho de queijo até pela janela, quando a cliente é conhecida.

Para ele, Campo Grande só não dá certo se houver preguiça. “Tem que ter vontade mesmo.O campo-grandense é gente boa. Essa história de grosseria é passado, hoje a cidade é plural, tem muitas gerações”.

Por isso, alimentar a cidade é também alimentar a alma para Elair. “E mesmo levantando tão cedo, ainda consigo abrir minha cervejinha à tarde”, conta todo contente.

O cafezinho de graça

Meses atrás, se você fosse até a barraquinha de salgados do Alexandre da Silva Soares, de 58 anos, na Avenida Afonso Pena, certamente encontraria uma estrutura com mais de 2,5 metros de comprimento. Mas, para não ocupar a calçada do estabelecimento que agora foi alugado, hoje ele trabalha dentro de um quadradinho, que cabe apenas um banco e ele.

No espaço de Alexandre, o cafezinho é de graça.(Foto: Marcos Maluf)
No espaço de Alexandre, o cafezinho é de graça.(Foto: Marcos Maluf)

Na bancadinha estão dezenas de salgados e uma garrafa de suco. Já o cafezinho fica do lado de dentro da banca e ele é de graça. “Sempre dei o café. Tem gente que insiste em pagar, mas ele é e graça”, avisa.

Já os salgados custam R$ 5,00 e o suco R$ 1,50, e as vendas cobrem as despesas da família há quase 20 anos. “E olha que na pandemia não foi fácil. Eu vendia quase 300 salgados por dia, na pandemia caiu para 50 e hoje estou voltando a vender 200”, celebra.

A história em comum com o salgadeiro Elair é que Alexandre também levanta cedo sem reclamar e diz que adora ouvir da freguesia que seu salgado está entre os melhores. “Meus fritos são campeões”, diz.

Ele diz que os salgados mais vendidos são os fritos. (Foto: Marcos Maluf)
Ele diz que os salgados mais vendidos são os fritos. (Foto: Marcos Maluf)

Foi com os salgados que ele também viu as filhas se formarem, por isso, a receita é motivo de orgulho, assim como Campo Grande. “Se não fossem as pessoas comprarem de mim, como eu teria cuidado da minha família?”, pergunta. “Muita gente pensa se eu não penso em largar tudo, mas eu fico pensando: ‘pra onde?’ e desisto”.

Alexandre desiste de sair dali sempre que a dúvida surge e se sente feliz em fazer parte da história da cidade. “Já são quase 20 anos na principal e mais bonita avenida da cidade. Não tem como não ficar feliz com isso”, diz Alexandre, se despedindo da equipe e deixando convite para experimentarmos sua coxinha que, segundo ele, é de “mandioca purinha”.

Banquinha de salgados na Avenida Afonso Pena é xodó de Alexandre. (Foto: Marcos Maluf)
Banquinha de salgados na Avenida Afonso Pena é xodó de Alexandre. (Foto: Marcos Maluf)

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