Após oito anos, maioria de crimes por caça a onça no Pantanal caduca
"Uma fêmea muito bonita, mas que estava comendo minhas vacas”, diz pecuarista em vídeo que marcou operação da PF
O tempo esvaziou a denúncia da operação Jaguar, com duas fases realizadas em 2010 e 2011, em que a PF (Polícia Federal) revelou caça a onça em fazenda no Pantanal, ao estilo safári. A maior parte dos crimes prescreveu, ou seja, o Estado perdeu o direito de punir.
A operação foi marcada pela divulgação de um vídeo, em que a pecuarista Beatriz Rondon afirma que uma onça recém-abatida era “uma fêmea muito bonita, mas que estava comendo minhas vacas”.
Primeiro, no ano de 2011, a operação resultou em processo na 5ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande. Mas, por declínio de competência “desceu” para a Justiça Estadual, na comarca de Aquidauana. A ação penal foi distribuída em 3 de dezembro de 2012. Entretanto, a denúncia do MP/MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) só foi formalizada em 28 de abril de 2015.
Na ocasião, foi denunciado que um grupo, entre os dias 27 de junho e 8 de julho de 2004, perseguiu, apanhou e matou quatro capivaras, uma onça parda e uma onça pintada. As investigações começaram a partir de vídeo enviado por um americano à Polícia Federal, com caçada em fazenda de Aquidauana.
A promotoria denunciou a pecuarista Beatriz Diacópulos Rondon pela caça, com pena aumentada por ser animal raro ou ameaçado de extinção e, também, por ter ocorrido em uma unidade de conservação. A fazenda Santa Sophia, local da caçada, é uma RPPN (Reserva Particular do Patrimônio Natural).
A denúncia ainda destaca que a pena pode ser aumentada até o triplo no caso de caça profissional. Todos previstos na Lei de Crimes Ambientais.
Contra a pecuarista, também houve denúncia pelo Código Penal (associação criminosa) e Estatuto do Desarmamento (posse irregular de arma de fogo de uso permitido e posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito). Em maio de 2011, na Jaguar II, a Polícia Federal apreendeu arsenal, munições, várias partes de animais e objetos para emboscar onças. A pecuarista pagou R$ 27.250 de fiança.
Com sentença publicada no último dia 17, de sete crimes, Beatriz Rondon segue respondendo por somente um: posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito. Como a ré tem 77 anos, os prazos prescricionais são reduzidos à metade. De acordo com o advogado Rene Siufi, que atua na defesa de Beatriz, esse processo segue na Vara Criminal de Aquidauana.
Tonho da Onça – Antônio Teodoro de Melo Neto, conhecido como “Tonho da Onça”, e apontado como guia e treinador dos cães para a caçada se livrou em 2016 das denúncias da Lei de Crimes Ambientais e de associação criminosa. Naquele ano, tinha 71 anos e os prazos de prescrição também é pela metade. Para ele, a punibilidade foi extinta.
A ação nasceu com sete denunciados, incluindo um búlgaro e um russo. O crime de associação criminosa prescreveu para todos. Agora, com a última decisão, o processo prossegue com quatro réus: Beatriz Rondon, Oleg Veber e Juscelino Machado de Araribe. Como o russo Oleg Veber não compareceu em juízo, o processo dele foi suspenso. Em relação a Augustinho Stalin Machado da Silva, a defesa informou que a pena foi extinta em decorrênca da morte do réu, de infarto.
A defesa de Juscelino sustenta que o crime pela caçada também prescreveu. “A pena máxima é de quatro anos e seis meses e a Lei Ambiental traz atenuantes como confissão e baixa escolaridade. Como prescreve em oito anos, está irremediavelmente prescrita”, afirma o advogado Henrique Gabriel Dimidiuk.
Também é questionado o crime de caça profissional. “Ele jamais caçou profissionalmente. Quem tinha lucro era a Beatriz Rondon e o Tonho da Onça. Ele é um peão que domava cavalos”, afirma o advogado. Como os clientes russo e búlgaro não andavam a cavalo, ele foi designado para acompanhá-los.
O juiz Ronaldo Gonçalves Onofri determinou que o Ministério Público atualize o endereço das testemunhas para começar a fase de audiências.
Sem recurso – De acordo com o Ministério Público, os crimes ambientais imputados à Beatriz Rondon ocorreram entre os dias 27 de junho e 8 de julho de 2004.
“Sendo assim, considerando que as penas cominadas aos crimes ambientais ainda são muito brandas em nosso país, aliado ao fato de que a ré já conta com mais de 70 anos de idade, o que faz com que os prazos prescricionais sejam reduzidos de metade, a prescrição da pretensão punitiva do Estado ocorreu antes mesmo da instauração do inquérito policial (instaurado em 2011) quando os fatos vieram à tona”, informa a promotora Angélica de Andrade Arruda, por meio de nota.