Inspirada em Nova York, ação protege 35 mil hectares que abastecem 34% da cidade
Manancial Vivo prevê remunerar os “produtores de água”, mas pagamento está em atraso
Inspirado em projeto de proteção das águas superficiais que abastecem Nova York, o programa Manancial Vivo, na ativa há 12 anos, transforma proprietários rurais em produtores de água, protegendo a APA do Guariroba, de onde vem o líquido que abastece 35% da população de Campo Grande. A Capital tem 916 mil moradores.
Numa analogia, é como se fosse um gigante poço de 35 mil hectares, que capta a água, da chuva e nascentes. O santuário para as nascentes do Guariroba fica a 30 km do perímetro urbano, na saída para Três Lagoas. Pela preservação, os produtores têm direito a PSA (Pagamento por Serviços Ambientais). Contudo, a reportagem apurou que os valores estão atrasados.
Com especialização em direito e gestão ambiental, o engenheiro agrônomo Ramão Jardim acompanhou o debate sobre a iniciativa, ainda em meado da década de 90.
“A APA do Guariroba foi criada com a finalidade específica de produção de água e todos os produtores deveriam cumprir com algumas restrições. Você não pode, por exemplo, passar inseticida com avião porque pode atingir parte do lago. Por isso, não tem cultura intensiva”, afirma Ramão, que foi representante do Sindicato Rural de Campo Grande nas discussões sobre o Manancial Vivo e, atualmente, é consultor sênior da II RD Gestão Ambiental.
Com solo arenoso, a região tem predominância da pecuária e, há alguns anos, vê o avanço do cultivo do eucalipto. Apesar da acelerada expansão imobiliária da cidade na direção ao Leste, a área não pode ser destinada a loteamento, medida para preservação das águas.
De acordo com Ramão, o plano de manejo segue as orientações de um parque. “Veio de surpresa e com medidas muito restritivas para propriedade particular. Mas é um dos melhores reservatórios de água em qualidade”, afirma o engenheiro.
As propriedades rurais seguem regras como manter a reserva legal (20% da área com cobertura vegetal), APP (Área de Proteção Ambiental), aplicação de inseticida com selo verde e cercas para proteger as nascentes. O auge do desmatamento na região foi entre 1985 e 1995.
O Córrego Guariroba é fruto de um conjunto de nascentes, que se alimentam de águas captadas pela chuva. Um dos recursos são os terraços, curva de nível mais larga. “O maior depósito de água que nós temos é o solo. O maior filtro que a natureza nos deu de presente”, diz Ramão.
As águas captadas pelo solo afluem para o lago onde a concessionária Águas Guariroba faz a captação do líquido, que viaja 30 quilômetros no percurso até a área urbana. O reservatório tem capacidade para 4,8 bilhões de litros. O excedente volta ao curso de água, que é tributário do Rio Pardo.
Ramão avalia que a água que sobra no Guariroba poderia ser trazida para o abastecimento da cidade por meio de uma nova tubulação, vizinha a já existente.
De acordo com a Semadur (Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano), o programa Manancial Vivo abrange os 35.533 hectares da APA do Guariroba, contudo, a pasta não tem os dados de quantos produtores participam do programa de conservação das águas.
A secretaria também não informou quanto já foi repassado por meio do PSA (Pagamento por Serviços Ambientais). O Campo Grande News questionou sobre o atraso nos recursos, mas não obteve resposta da Semadur até a publicação da matéria.
A reportagem também procurou a associação dos produtores rurais da APA do Guariroba, que não quis se manifestar sobre o programa Manancial Vivo. A concessionárias Águas Guariroba informou ser parceira do projeto, mas somente nas ações de monitoramento do córrego.