Cidades e investimentos
Poucos se preocupam com os custos ou quais os valores financeiros aplicados num determinado centro urbano. Um dos motivos que leva a isso é que as cidades têm longa história desde sua fundação. Na evolução urbana, há cidades que foram surgindo no litoral por ter ancoradouros ou facilidade de acesso por navios. Dos portos que foram se formando, no caso brasileiro, surgiram cidades prósperas e que acabaram sendo capitais de províncias no Império, sendo mantidas na República. Por isso, há um cordão urbano ao longo da costa, o que acontece em países litorâneos.
No caso brasileiro, essas capitais, lentamente, cresceram e os investimentos nelas feitos são serviços, comércio ou conjuntos industriais e todos os equipamentos que os urbanitas demandavam. Isso vai num crescendo e nunca se completa porque sempre cabe algo mais ou é requerido, sobretudo, nas grandes metrópoles.
Na evolução urbana, os custos são absorvidos pelos benefícios que o aglomerado passa acumuladamente a oferecer: meios de transporte, equipamentos de saúde pública (água tratada, esgotamento sanitário, coleta de lixo etc.), e os investimentos em pistas pavimentadas, estacionamentos e todo o que for preciso em regiões rodoviaristas, onde o automóvel é meio de transporte usual. Então, é um nunca acabar porque as demandas crescem e requerem investimentos públicos. Há ainda o desgaste pelo uso dos equipamentos existentes, que requer reparos ou que necessita de substituição. Então, a roda dos investimentos gira continuamente, fazendo com que as cidades sempre estejam relativamente atualizadas nesse aspecto.
Uma questão, todavia, parece ir a reboque: a demanda por habitação. Sempre há lacunas de moradias ou elas são inacessíveis para alguns estratos populacionais. Muitas cidades têm secretarias de habitação, com a finalidade de suprir sempre que possível os que desejam uma moradia. Por vezes, a cidade trata de organizar conjuntos habitacionais e famílias que se inscrevem nos programas estabelecidos. Outras vezes, são cooperativas que organizam a construção e muitas pessoas se habilitam para a compra. Procedem-se as construções e, ao final, se faz o rateio dos custos, o que, em conjunto, se torna mais aceito pelo grupo dos que adquiriram um imóvel. Há, porém, enorme lacuna de habitações em quase todas as grandes cidades, pois quase sempre a construção dos imóveis fica a cargo do setor privado, que tem aumentado os prédios de alto padrão, o que torna inacessível às pessoas de média-baixa e baixa renda. Aliás, o estrato empobrecido não tem opção ou acesso a imóveis, ficando excluído do que se convencionou denominar de mercado imobiliário. Daí, decorre o fato de que grandes faixas populacionais passam a morar pagando aluguel, ampliando os que consomem algo ao redor de 30% dos ganhos nesse item.
Ultimamente, em razão do custo da terra, as cooperativas erguem edifícios. Eles não são muito altos; alguns, com quatro pisos, não têm elevadores, o que torna a construção menos onerosa. Outros, com mais de dez andares, dispõem de dois elevadores, o de serviço e o social. Em muitos casos, ambos servem para as duas funções para pessoas que não se importam em mover-se juntamente com objetos transportados. Mas, se os elevadores estão distanciados, as pessoas utilizam apenas o elevador social. Pelo menos é o que se tem observado em edifícios em que os ascensores não estão próximos.
As cidades, sobretudo as metrópoles, investem enormes recursos para dotar o meio urbano com rede capilar de água tratada e esgotamento sanitário. Ambos são necessários à saúde pública e ao bem-estar da população. Mas não é o caso de muitos centros urbanos, cujo esgoto se esparrama pelas ruas e causa incômodo à população. Isso acontece porque muitas prefeituras optam por dotar as cidades de água potável, mas não de esgotamento das águas servidas e dos dejetos. Não o fazem por alegadas duas razões: uma, "o que está enterrado não rende votos" e duas, "os custos desse serviço são elevados e não há dotação orçamentária suficiente". Aí, a resolução do problema fica para o futuro.
Diferentemente de outras cidades, Brasília assume um papel de destaque no cenário nacional, por razão de ser a capital do país e de ter organizado um sistema que bem serve seus mais de três milhões de habitantes, com constantes investimentos na área de saúde pública. São hospitais públicos que servem todo o Distrito Federal, e não recusa atender pacientes da periferia metropolitana (os 12 municípios goianos limítrofes a Brasília), sobretudo neste período da covid-19, quando muitos infectados chegam aos hospitais e clínicas para atendimento imediato. Nesse aspecto, a mídia tem registrado estafa do corpo clínico e de enfermagem pelo continuado esforço em atender infestados pela pandemia. E não há sinais de que a covid-19 acabe.
(*) Aldo Paviani é professor emérito da Universidade de Brasília e pesquisador associado do Departamento de Geografia e do Núcleo de Estudos Urbanos e Regionais. Doutor pela Universidade Federal de Minas Gerais