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Desmitificando as sociedades anônimas fechadas

Por Luiz Felipe D’Ornellas (*) | 25/05/2018 13:50

Apesar de a Lei 6.404/76, que trata das Sociedades Anônimas, já ter mais quatro décadas ainda é comum encontrar no meio do empresariado e dos profissionais da contabilidade reações adversas à adoção deste tipo de sociedade.

A falta de conhecimento e de atuação prática podem justificar a origem desse preconceito, porém trata-se de um tipo de sociedade muito útil, capaz de trazer diversas vantagens competitivas, inclusive garantir um grau eficaz e seguro de flexibilidade que pode atrair tanto investidor nacional quanto estrangeiro.

As Sociedades Anônimas do tipo fechada, que não tem suas ações negociadas em bolsa, têm se demonstrado uma modalidade de empresa cada vez mais interessante do ponto de vista jurídico-financeiro, pois permitem facilitar o ingresso de recursos na empresa – para a expansão de negócios por exemplo, de modo seguro e rentável para os envolvidos.

Porém, mesmo que já transcorridos quase 41 anos de sua promulgação, a Lei das Sociedades Anônimas ainda é objeto de diversas dúvidas e cercada de mitos, sendo muito comum ouvir-se as seguintes afirmações: “elas são caras para se manter”, “sua escrituração é complexa”, “elas só podem adotar o regime tributário do Lucro Real”, “não possuo a quantidade de sócios necessários para compor todo o quadro de diretoria e conselhos”, entre outros.

Por isso, a adoção deste tipo societário é ínfima diante da quantidade de Sociedades Limitadas (LTDAs), Empresas de Responsabilidade Limitadas (EIRELIs), e Empresários Individuais (EI e MEI) registrados perante as Juntas Comerciais. Para se ter uma ideia, na Junta Comercial de Mato Grosso do Sul, até o mês de fevereiro de 2017, do total das 195.905 empresas ativas e com Matriz no MS, 46.435 são LTDA (23,70%), 7.792 são EIRELI (3,97%), 140.709 são EI e MEI (71,82%), e apenas 285 são S/A (279 fechadas e 6 abertas), ou seja, representam menos que 0,15% das empresas registradas, ativas e com Matriz no estado.

Apesar desses receios injustificados, as S/As fechadas podem se tornar muito útil e práticas no quotidiano empresarial, pois além de resguardarem uma certa semelhança com as LTDAs, possuem diversos instrumentos e ferramentas jurídicas que, se muito bem explorados, podem traduzir em vantagens competitivas e estratégicas.

O medo da onerosidade não se sustenta, haja vista que o que diferencia uma S/A fechada de uma Sociedade Limitada, no quesito despesa de manutenção, é apenas a obrigatoriedade de publicação anual de balanço, somente para aquelas que têm o Patrimônio Líquido (PL) superior a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), que, quando aplicável, não se demonstra tão dispendioso frente aos benefícios gerados por esse tipo de sociedade.

Com relação à suposta dificuldade de escrituração e obrigatoriedade de adoção do Lucro Real, resta esclarecer que não depende do tipo societário para a escolha do Regime Tributário, podendo tranquilamente a S/A fechada estar no Lucro Presumido, vedada apenas a opção pelo Simples Nacional, conforme a Lei Complementar 123/2006.

A respeito da necessidade de vários acionistas para supostamente se compor uma Diretoria (mínimo 2 membros), um Conselho de Administração (3 integrantes), e um Conselho Fiscal (3 conselheiros), tal assertiva só é válida para as S/As abertas (com as ações negociadas em bolsa), já que as fechadas necessitam apenas de 2 acionistas, com diretoria composta por 2 membros (que podem coincidir com os próprios acionistas – se pessoas físicas), o que se assemelha em muito às sociedades limitadas.

Além do mais, nas S/As fechadas o fato de se poder praticar atos societários por meio de Assembleias Gerais auxilia sobremaneira a dinâmica jurídica, pois são simplificados através de AGOs e AGEs, instrumentos sem complexidades para elaboração e de fácil organização, bem diferente das burocráticas e cerimoniosas alterações e consolidações de Contrato Sociais das LTDAs.

Também é interessante ressaltar que, dependendo da intenção dos acionistas majoritários em atrair investidores, há a possibilidade de se manter o poder de controle mesmo que detendo pouco mais de 25% do capital social, desde que metade seja em ações ordinárias (ON), e a outra metade em ações preferenciais sem direito a voto (PN). Isso visa a facilitar o ingresso de possíveis acionistas investidores sem a perda do poder de controle, desde que obedecidos alguns requisitos legais. Enquanto isso, nas limitadas, para se ter o poder de controle deve-se ter mais de 3/4 das quotas, ou seja, 75%.

Essa situação nas LTDAs é fonte inesgotável de conflitos societários, haja vista que a grande maioria das sociedades são formada por sócios com participação idênticas, e isso pode ser muito prejudicial, pois algumas deliberações só podem ser tomadas por unanimidade, acarretando impasses quando o sócio dissidente detém 25% ou 33,33%, bloqueando os demais. Já nas S/As, é possível estabelecer quóruns específicos para deliberação de certas matérias, o que nem sempre é viável em uma LTDA.

Outra vantagem que se pode observar nas S/As é com relação às transferências das ações, que podem ser feitas diretamente no livro de registros, de âmbito interno e restrito, sem que se haja a necessidade de arquivamento em Junta Comercial, ou de se dar publicidade ao ato. Isto facilita e agiliza o dia-a-dia das empresas, pois nas LTDAs os sócios ficam sujeitos à aprovação da Alteração de Contrato Social pela Junta Comercial, o que convalida e torna público a titularidade das quotas.

Além disso, mesmo a S/A sendo fechada, é possível, e em alguns casos até recomendável, fazer a emissão de debêntures, bônus de subscrição, partes beneficiárias, entre outras classes de ações, o que facilita a definição de dividendos mínimos e obrigatórios, inclusive para acionistas minoritários, e remuneração adequada à investidores com garantias de recebimento do capital investido.

Portanto, desmistificando as Sociedades Anônimas fechadas, é possível se obter um excelente resultado empresarial através de uma S/A, desde que a mesma seja estruturada e mantida de maneira adequada, dentro das especificações legais, e acompanhada por profissionais capacitados, para que se possa aproveitar efetivamente todos os benefícios constantes na Lei 6.404 de 1976.

(*)Luiz Felipe D’Ornellas é advogado especialista em Direito Societário

 

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