O controle social nas metas fiscais
É uma platitude do discurso “reformista” que o Estado brasileiro necessita de austeridade fiscal para o alcance de superávit para que com isto possa realizar o tão necessário crescimento econômico que, segundo afirmam, é matriz libertadora das desigualdades sociais.
Neste talante, para dar cabo a esta missão vimos nos últimos anos a edição do “teto de gastos”, “regra de ouro”, “PEC emergencial” (esta última para fazer valer as duas primeiras), “Plano de Promoção de Equilíbrio Fiscal”, dentre outras normas de índole constitucional ou infraconstitucional.
O emaranhado, remendos e “arranjos” da dita austeridade fiscal passa ao largo da compreensão do senso comum e por vezes não é captado pelos setores, digamos, mais impactados diretamente pelas medidas, e aqui falo aos meus assistidos: servidores públicos, pois estes, quando se assentam a mesa diante do cipoal de normas de contingência das despesas públicas, sempre são advertidos quanto ao lastro de suas pretensões e o impacto nas finanças públicas, a partir daí saltam tecnocratas com o brado da responsabilidade fiscal para traduzir a negativa quanto ao patamar mínimo de dignidade perseguida pelos trabalhadores do serviço público.
Bem, é por força quase que natural a norma cogente que agarra a todos, incluindo aí a administração pública o dito que sanciona que " só podemos ir até onde a perna alcança”, pois há limite para o dinheiro! Entretanto, é sobre este truísmo que precisamos nos debruçar, e com isto vejamos os números: mesmo no elastério pandêmico, a União Federal por exemplo, estima um acréscimo em sua receita de 7,8%, somente entre 2021/2022, percentual este muito superior a média entre 2014 – 2020 que foi da ordem de 3,4% de crescimento ao ano.
Já o Estado de Mato Grosso do Sul, em termos fiscais, saltou do último quadrimestre pré pandemia (setembro a dezembro de 2019) do patamar de 12 bilhões/ano para 15, 8 bilhões/ano em receita corrente líquida, segundo dados oficiais do último quadrimestre de 2021, ou seja, um acréscimo de mais de 30% na receita corrente líquida num período em que não se teve reajuste ou reposição para os servidores públicos por força da LC 173/2020.
Na Capital, embora com menor incidência, houve também incremento da receita corrente líquida que saltou de 3,4 bilhões/ano no último quadrimestre de 2019 para 4 bilhões/ano registrados no quadrimestre final do último ano, computando assim um aumento de 18% na receita corrente líquida, em idêntico período ao do Governo do Estado.
Vê-se daí que em que pese todo o discurso de crise econômica do país que de fato assola os empregados, os servidores públicos, as pequenas empresas, o empreendedor, os profissionais liberais, enfim, os CPF’s e os diminutos CNPJ’s.
A crise advinda da pandemia não colheu os cofres públicos da mesma forma que colheu a cesta de rendimento das famílias, pois é caso raro encontrar uma espécie que tenha aumentado seus ganhos ou receitas em 30% do início da pandemia até o começo deste ano, como claramente ocorreu com os cofres do Governo do Estado.
Mas bem, articulo estas palavras não somente para expandir luz aos números, mas sobretudo para evidenciar que é preciso que a sociedade, e principalmente a sociedade civil organizada, como sindicatos e associações possam vindicar instrumentos mais efetivos de transparência fiscal. União, Estados e Municípios devem chancelar a participação da sociedade civil organizada por meio do controle social, principalmente no que toca a realização de suas despesas, pois estas detêm o condão de inviabilizar os investimentos na valorização e qualificação dos serviços públicos.
Neste talante não é muito dizer que a Lei Complementar de n. 178/2021, que estabeleceu o Programa de Acompanhamento e Transparência Fiscal, propugnou em seu décimo quinto artigo, a adoção de medidas de reforço à responsabilidade fiscal, visando, por um período de 10 anos a eliminação de excesso de gastos a partir do exercício de 2023, albergando assim, novas contingências que estão às portas para serem arguidas.
Dessarte, para implemento de tais medidas que visem a eliminação do chamado “excesso de gastos” é imperioso que as entidades de servidores públicos vindiquem junto ao parlamento inovações legislativas que visem não só a participação da sociedade civil organizada no acompanhamento do controle de gastos, assim como, por meio de lei, elejam de maneira clara, límpida e transparente, quais despesas podem e devem ser extirpadas para cumprimento não só das metas fiscais, como também para que ocorra uma hígida manutenção do espaço fiscal necessário ao fortalecimento do serviço público, e não há melhor momento do que pôr em perspectiva este debate do que em ano eleitoral.
(*) Márcio Almeida é advogado.