Que momento impressionante para o agronegócio
Nosso resumo mensal traz os eventos principais de fevereiro e o que observar em março. Em pronunciamento feito pela diretora do Fundo Monetário Internacional (FMI), a organização pontuou que os países devem priorizar as políticas para vacinação contra a covid-19 como a mais importante medida econômica da atual conjuntura. Há esperanças de retorno à normalidade, principalmente se observarmos o que vem acontecendo nos EUA.
Na economia brasileira, o relatório Focus (Bacen) de 1º de março trouxe expectativas para o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) de 2021 em 3,87%, e de 2022 em 3,50%. Já para o PIB (Produto Interno Bruto), espera-se um crescimento de 3,29% neste ano e de 2,50% em 2022. Para taxa Selic, o mercado espera 4% e 5%, respectivamente, e no câmbio, R$ 5,10 no final de 2021 e R$ 5,03 no final do próximo ano. Fechamos 2020 com uma queda de 4,1% no PIB. Até que não foi tão mal perto do que se desenhou em um ano de pandemia.
No agro mundial e brasileiro, de acordo com o relatório do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) de fevereiro, a produção global de soja para o ciclo 2020/21 deve totalizar 361,08 milhões de toneladas, com estoques finais de 83,36 milhões de toneladas. A projeção para a produção brasileira da oleaginosa é de 133 milhões de toneladas, enquanto que nos EUA e na Argentina devem ser produzidas, respectivamente, 112,54 e 48 milhões de toneladas. Já no milho, a produção mundial está projetada em 1.134,05 bilhão de toneladas e estoques finais de 286,53 milhões. Assim, para o cereal, os EUA devem produzir 360,24 milhões de toneladas; o Brasil, 109 milhões, e a Argentina, 47,5 milhões de toneladas. A oferta está bem apertada, e devemos consumir estoques, levando os preços das principais commodities para cima.
No mercado de commodities, de acordo com estatísticas do Valor Data, os preços da soja e do milho na Bolsa de Chicago fecharam o mês de fevereiro de 2021 com altas na ordem de 50% e 40%, respectivamente, em comparação aos valores do mesmo mês no ano passado. Outras commodities negociadas na Bolsa de Nova York também tiveram crescimentos significativos, como o açúcar (+10%), o suco de laranja (+15%), o café (+20%) e o algodão (+30%). Esse comportamento se sustenta pela expectativa de recuperação econômica mundial, políticas monetárias e fiscais, enfraquecimento do dólar e aumento da inflação.
A Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) estima que a produção brasileira de grãos da safra 2020/21 irá atingir 268,3 milhões de toneladas, com crescimento de 4,4% frente à passada, em uma área plantada de 67,7 milhões de hectares (+2,7%). Na cultura da soja, a produção deve totalizar 133,8 milhões de toneladas (+7,2%), em uma área cultivada de 38,3 milhões de hectares (+3,6%). Já no milho, a primeira safra está estimada em 23,6 milhões de toneladas (-8,0%) com uma área 0,8% inferior. No entanto, no acumulado das três safras, projeta-se um crescimento de 2,9% no volume colhido, chegando a 105,5 milhões de toneladas. No algodão, espera-se uma produção de pluma 16% inferior, somando 2,52 milhões de toneladas, em consequência da redução na área de plantio em 13,1%, que ficou em 1,45 milhão de hectares. Por fim, no trigo, a produção deve ser de 6,4 milhões de toneladas (+3,3%) graças ao crescimento na área plantada de 2,1%, alcançando 2,39 milhões de hectares.
As exportações do agronegócio do mês de janeiro de 2021 totalizaram US$ 5,67 bilhões, refletindo queda de 1,3% frente ao mesmo período de 2020, de acordo com estatísticas do Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). As carnes ocuparam a primeira posição com US$ 1,15 bilhão (-14,0%), sendo US$ 547,80 milhões da carne bovina (-11,3%), US$ 423,90 milhões da carne de frango (-18,8%) e US$ 145,21 milhões da suína (-11%). Na segunda posição aparecem os produtos florestais, com exportações de US$ 824,20 milhões (-10,5%); o complexo sucroenergético aparece na terceira colocação, com aumento em sua comercialização em 39,3%, chegando a US$ 717,41 milhões.
Em seguida, encontra-se o setor de cereais, farinhas e preparações, que exportou US$ 622,16 milhões (+46,3%), com o milho representando 80% desse montante. Finalmente, o café aparece na quinta colocação, com exportações de US$ 509,54 milhões (+26,7%). O complexo soja não apareceu entre os cinco principais segmentos (evento raro na pauta de exportações), pois apresentou queda de 44,6% em seu valor exportado, somando apenas US$ 484,07 milhões, devido, principalmente, às quedas nas vendas de grãos por conta dos preços elevados e baixos estoques globais. Por sua vez, o agronegócio comprou US$ 1,30 bilhão, um crescimento de 6,5% nas importações, mas deixa um saldo superavitário na balança comercial de US$ 4,37 milhões (-3,42%).
A CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), estima um VBP (Valor Bruto da Produção Agropecuária) de R$ 1,142 trilhão em 2021; aumento de 15,8% em relação a 2020. No total, as cadeias da agricultura devem registrar R$ 759,25 bilhões (+19%) e as da pecuária, R$ 383,45 bilhões (+9,8%). Já o Mapa estima que o VBP deve crescer 11,8% em 2021, chegando à marca de R$ 1,0 trilhão, com as lavouras somando R$ 688,4 bilhões e a pecuária, R$ 314,5 bilhões. Preços favoráveis e boa previsão de safra são os fatores que impulsionam esse resultado.
A indústria de alimentos e bebidas no Brasil registrou faturamento de R$ 789,2 bilhões em 2020, alta de 12,8% frente a 2019. Tal resultado representa 10,5% do PIB brasileiro, segundo pesquisa da Abia (Associação Brasileira da Indústria de Alimentos). Foram responsáveis por 20 mil novos empregos no ano passado, o que reflete um crescimento de 1,2%.
O IC Agro (Índice de Confiança do Agronegócio) fechou o quarto trimestre de 2020 em 121,4 pontos, recuando 5,6 pontos frente ao trimestre anterior. Apesar da queda, o indicador é o terceiro melhor resultado da série histórica, evidenciando o otimismo com relação ao setor.
Segundo levantamento realizado pela StoneX, a colheita de milho verão encontra-se atrasada no Brasil quando comparada ao mesmo período do ano passado. Apenas 7% das lavouras haviam sido colhidas até a semana do dia 5 de fevereiro de 2021, enquanto que em 2020 esse valor atingia 20%. A previsão da consultoria é de que sejam produzidas 26 milhões de toneladas do cereal na primeira safra e 82 milhões de toneladas na segunda.
A estimativa da Conab para a produção brasileira de café na safra 2021 está entre 43,8 a 49,5 milhões de sacas de 60 kg, refletindo uma redução entre 21,4% a 30,5% em relação ao volume obtido em 2020. A área plantada e em produção é a menor da série histórica dos últimos 20 anos, somando apenas 1,76 milhão de hectares e contando com outros 431,9 mil hectares em formação. A participação do café arábica na produção deve ser de 66%, enquanto o conilon representa 33%.
De acordo com a reestimativa de safra do Fundecitrus, a produção de laranja do ciclo 2020/21 para o cinturão citrícola de São Paulo e Triângulo/Sudoeste Mineiro deve ser de 269,01 milhões de caixas, valor 30,45% inferior ao da safra passada. O comportamento bianual da cultura, agravado pelas condições climáticas, pode levar à pior quebra de safra dos últimos 33 anos para a região.
O mapeamento da ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico) apontou que a área equipada com irrigação no Brasil é de 8,2 milhões de hectares, sendo 64,5% com águas de mananciais e outros 35,5% com água de reúso. De acordo com a organização, a área irrigada pode crescer mais 4,2 milhões de hectares até 2040.
O agronegócio deverá ganhar mais competitividade pela criação do FIAgro (Fundos de Investimento do Setor Agropecuário), medida possibilitada pelo novo projeto de lei aprovado pelo Senado. A proposta visa a criar um instrumento, nos mesmos moldes de fundos imobiliários, para financiar a atividade agropecuária no País, permitindo que pessoas físicas e instituições adquiram cotas de fundos, democratizando os investimentos no setor. Destaca-se aqui a participação fundamental do deputado Arnaldo Jardim.
Na pecuária, a arroba bovina bateu novos recordes em fevereiro de 2021, atingindo valor superior a R$ 300, de acordo com o indicador do Cepea/B3. Tal nível de preço é acarretado pela baixa oferta de animais para abate, consequência de períodos anteriores com elevado abate de fêmeas e reduzida produção de bezerros, além do incremento de exportações, principalmente para China, e alta nos custos de produção com o dólar valorizado. Nos Estados Unidos, o clima frio que atingiu o sul do país nos últimos dias – com temperaturas de até -20°C – pode ter cancelado o abate de até 125 mil cabeças, segundo o Rabobank.
Esse impacto já pode ser visto no acompanhamento do USDA, que apontou queda de 17% na produção de carne bovina no país; apenas na semana do dia 14 de fevereiro foram abatidos 56 mil animais a menos. As baixas temperaturas também prejudicaram algumas áreas de milho na região, o que deve elevar os custos de produção aos produtores locais.
Nas empresas de alimentos, destaque para a Minerva Foods que anunciou seus resultados de 2020, com recordes no lucro líquido – fechados em R$ 697,1 milhões. A receita líquida da companhia cresceu 13,3%, fechando em R$ 19,4 bilhões; e o Ebitda em R$ 2,14 bilhões, aumento de 22,4% em comparação ao registrado em 2019. Com os resultados, a companhia distribuiu dividendos adicionais aos seus acionistas: R$ 384,3 milhões, ou R$ 0,73 por ação. Outro destaque veio da JBS, ao incluir 200 pecuaristas de pequeno porte, de Rondônia, no selo Biocombustível Social, do Mapa. A empresa já investiu mais de R$ 5 milhões em assistência técnica gratuita desde que iniciou o programa, tendo adquirido mais de 110 mil animais por meio desta iniciativa. Com a inclusão dos novos produtores, a JBS espera uma oferta adicional de 40 mil cabeças de gado, produzidas com base nos parâmetros socioambientais do programa. É a sustentabilidade cada vez mais presente na indústria de alimentos.
A Beyond Meat, empresa de substitutos da carne, registrou prejuízo líquido de US$ 52,8 milhões no ano de 2020. A empresa atribuiu esse resultado a despesas relacionadas à pandemia da covid-19, com baixa de estoques e reservas de produtos e suprimentos. No ano de 2019, o prejuízo da companhia foi de US$ 12,4 milhões.
É crescente o interesse dos agricultores na utilização de bioinsumos para o controle de pragas e doenças, e para a nutrição de plantas. Muitos desses produtos biológicos podem ser produzidos nas propriedades, gerando assertividade no manejo e redução nos custos de produção. Diante disso, o Mapa tem trabalhado em seu Programa Nacional de Bioinsumos para desenvolver o setor e fomentar novos investimentos para a construção de biofábricas através de financiamento pelo Inovagro. Mais um ponto para a sustentabilidade.
Também no elo dos defensivos, as estimativas do Sindiveg (Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal) apontam que o setor deve aumentar a sua receita em mais de 10% no ano de 2021. Esse valor é consequência de um potencial incremento de área tratada com os produtos, principalmente de soja e milho. A indústria também repassará quase que integralmente os custos com a variação cambial, o que não aconteceu em 2020, e acabou deixando muitas empresas com margens apertadas ou prejuízo. No ano passado, o faturamento total do setor foi de US$ 12,1 bilhões, caindo 10,4% frente a 2019.
Nas cooperativas, a C.Vale atingiu um faturamento de R$ 12,26 bilhões em 2020, crescendo 37% frente ao ano anterior, gerando um resultado líquido de R$ 251 milhões. As sobras distribuídas aos cooperados devem totalizar R$ 93 milhões. Exemplo de ação coletiva. No elo de produção agropecuária, intensificando sua tese de investimentos em terras estrangeiras, a BrasilAgro adquiriu 9,9 mil hectares em território boliviano por cerca de US$ 30 milhões. As áreas compradas já estão desenvolvidas e serão destinadas à produção de cana e grãos.
As tradings Bunge, Cargill, ADM, LDC e Glencore se uniram para desenvolver uma plataforma de gestão do fluxo de commodities. A Covantis – como ficou intitulada a joint venture – começou a ser idealizada há dois anos e terá o Brasil como primeiro campo de testes. O sistema possibilitará o contato entre os elos das cadeias de grãos com a entrega nos portos, integrando informações como datas de chegadas e partidas de navios, volumes de mercadorias, bandeiras e outras.
No âmbito dos biocombustíveis, o CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) segue com as discussões acerca da inclusão do diesel renovável na matriz energética brasileira. O biocombustível, já utilizado em países da Europa, é produzido por meio de óleos vegetais, gorduras animais e até mesmo óleo de cozinha, e segundo a indústria produtora, tem potencial para a redução das emissões de gases em comparação ao biodiesel. A decisão da CNPE deve ser concluída ao longo de 2021.
Em relatório divulgado pelo CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), o Brasil pode gerar mais de 2 milhões de empregos e movimentar US$ 17 bilhões até 2030 com soluções baseadas no meio ambiente. Nesse contexto, as discussões envolvendo a precificação do carbono devem se tornar cada vez mais frequentes; especialmente pelo fato de que a pauta será tratada na COP-26 da ONU, em novembro deste ano. Os avanços na comercialização de carbono podem beneficiar diversas áreas no Brasil, como a de biocombustíveis, energias renováveis, agricultura de baixo carbono, bioeconomia e outras.
No fechamento desta coluna, a soja, para entregar em cooperativa de São Paulo, estava em R$ 165/saca para março de 2021 sendo negociada a R$ 155/saca e em março de 2022 a R$ 151/saca. Há um ano estava em R$ 83/saca. No caso do milho, hoje está em R$ 82/saca; R$ 66/saca para entregas em agosto de 2021, e R$ 64/saca para agosto de 2022. Há um ano, o milho estava em R$ 50/saca. O algodão em R$ 165/arroba, contra R$ 92 do ano passado. No boi, a arroba era negociada em mais de R$ 300. Foi um mês de incrível ganho de preços.
Os cinco fatos do agro para acompanhar diariamente em março são:
- Com as chuvas praticamente consolidadas na primeira safra, agora é na segunda que reside a preocupação principal, com ênfase no milho e em suas produtividades e produções. Fora isso, observar os atrasos de colheita da primeira safra devido às chuvas, aumentando ainda mais o risco da segunda. O clima também está perturbando a Argentina;
- Demanda mundial: as importações na Ásia e outros países em carnes, grãos e outros produtos, além de um possível novo surto de peste suína africana na China a ser observado;
- A recente instabilidade política com a situação da Petrobras e sua influência sobre o otimismo, crescimento e principalmente taxa de câmbio;
- A segunda onda da covid-19, o processo de vacinação, os mecanismos de apoio e a garantia de renda e a performance do mercado consumidor;
- As expectativas de plantios, áreas e produtividades da megassafra norte-americana. Qualquer problema climático será grave aos preços.
(*) Marcos Fava Neves é professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Peto (FEA-RP) da USP