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Cidades

Delivery de propina: Claudinho recebia dinheiro na prefeitura, narra delator

Como secretário, Cláudio Jordão cobrava 10% para contratar e 30% par manter empresas, revelou réu em confissão

Por Anahi Zurutuza | 19/06/2024 14:26
Claudinho Serra durante sessão na Câmara de Campo Grande (Foto: Instagram/Reprodução)
Claudinho Serra durante sessão na Câmara de Campo Grande (Foto: Instagram/Reprodução)

“Voraz em consumir dinheiro público”, como definiu o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) para pedir a prisão do líder de esquema deslavado de corrupção, Cláudio Jordão de Almeida Serra Filho, o Claudinho Serra (PSDB), cobrava 10% para contratar empresas e 30% para mantê-las como prestadoras de serviços ou fornecedoras da Prefeitura de Sidrolândia. O detalhe foi relatado por Tiago Basso da Silva, ex-servidor que virou delator e foi responsável por guiar investigação que culminou na terceira fase da Operação Tromper, em abril deste ano.

O depoente, que chegou a exercer cargo de chefia no setor de Compras e Licitações na administração do município a 70 km de Campo Grande, narra como o recebimento de dinheiro em espécie por Claudinho era rotina. As remessas de propina chegavam em envelopes, sacolas e mochilas ao gabinete que o vereador licenciado pela Capital ocupava quando foi secretário da Fazenda na cidade governada pela sogra, Vanda Camilo (PP). Veja:

Certa vez, conta Basso, o chefe tinha R$ 450 mil em sacola deixada na sala usada como “balcão de negócios” escusos na prefeitura. O delator diz saber qual era a quantia porque recebeu R$ 5 mil de Claudinho em notas de 50 reais retirados a embalagem e também foi o responsável por pagar a uma das empresas investigadas aditivo em contrato de R$ 1,5 milhão.

Neste trecho do depoimento, o ex-servidor detalha como atuava Edmilson Rosa, o “Rosinha”, que também virou réu por corrupção na fase 3 da Tromper e era “dono”, segundo o delator, de cerca de R$ 10 milhões em contratos com a Prefeitura de Sidrolândia, para recapeamento de avenidas da cidade e cascalhamento de vias.

O empresário seria o verdadeiro proprietário de duas prestadoras de serviços – a AR Pavimentação e a GC Pavimentação – vencedoras de licitações por meio de trapaça para serem usadas no esquema. A segunda está em nome de “laranja”, segundo a investigação do Gecoc (Grupo Especial de Combate à Corrupção).

Tanto é que dias atrás, caminhão flagrado trabalhando nas ruas de Sidrolândia estava adesivado com os dois nomes e apesar das empresas terem CNPJs e donos “distintos”, segundo a Receita Federal, dividiam o mesmo endereço em Campo Grande, na Avenida Gunter Hans, Vila São Jorge da Lagoa e o maquinário.

Na porta da prefeitura – A investigação do Gecoc também mostrou que, sem qualquer pudor, pagamentos de propina foram feitos na porta da Prefeitura de Sidrolândia, confirmando o que Basso diz em depoimento. O registro está em conversa de WhatsApp de Basso com homem conhecido como Thiago “Nanau”, mas que na verdade se chama Thiago Rodrigues Alves, não tem vínculo formal com as empresas investigadas, tem ligação com Claudinho Serra e chegou a ser nomeado servidor da Alems (Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul).

Conforme registrado pelo Gecoc, “comprovando a participação direta de Cláudio Serra Filho no esquema de corrupção implantado por meio das empresas investigadas, às 14:39:09 [do dia 30 de setembro de 2022], Tiago Basso envia imagem de empenho no valor de R$ 1.540.364,72 (beneficiária empresa AR), solicitando na sequência que Thiago ‘Nanau’ agilizasse o pagamento indevido (propina) a Cláudio Serra Filho”.

Dias depois, em 3 de outubro, Basso cobra Nanau: “salva o Cláudio. Aperta o pessoal aí”.

Basso cobra "Nanau" pagamento de propina, segundo o MP (Foto: Gecoc/Reprodução)
Basso cobra "Nanau" pagamento de propina, segundo o MP (Foto: Gecoc/Reprodução)

Antes disso, em 1º de setembro de 2022, Thiago Rodrigues Alves diz estar em frente a prefeitura: “vim trazer aquele negócio kkkk”. Para os promotores, se trata de pagamento de propina acertado dias antes.

“Conforme demonstram as provas carreadas no bojo da investigação criminal, Cláudio Jordão de Almeida Serra, então secretário Municipal de Fazenda Sidrolândia e atual vereador de Campo Grande, atuou decisivamente na organização, trazendo para si a função de gerir, junto à administração pública, o grupo criminoso. Para tanto, o denunciado se apropriou da estrutura já existente desde 2017, trazendo para Sidrolândia o grupo de empreiteiras formado pelas empresas AR Pavimentação, GC Obras de Pavimentação Asfáltica e CGS CONSTRUTORA com o objetivo de receber valores a título de propina”, também descreve o MP para pedir os mandados de prisão e busca para a Tromper 3.

Segundo constataram os promotores, a negociação da vantagem indevida paga no dia 1º começou no fim de agosto. “No dia 30/08/2022, consoante demonstram as provas oriundas da extração do celular do servidor Tiago, Cláudio menciona que o pagamento para a empresa CGS seria feito, enfatizando ainda, por meio da menção “vê aquele negocinho lá nosso, você falo que não podia virar o mês”, para que Tiago agilizasse os tramites necessários para o aditamento ao(s) contrato(s), bem como ao pagamento de propina”.

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Conversa sobre pagamento em frente à Prefeitura de Sidrolândia, conforme a investigação (Foto: Gecoc/Reprodução)
Conversa sobre pagamento em frente à Prefeitura de Sidrolândia, conforme a investigação (Foto: Gecoc/Reprodução)

O acordo – Tiago Basso fechou acordo de colaboração premiada no ano passado, três meses após ser preso na 2ª fase da Tromper. Ele confessou fazer parte de organização criminosa e cometer corrupção passiva. Em troca, deixou a prisão no dia 31 de outubro de 2023.

Classificado como “importante peça desse grupo criminoso para o sucesso na execução dos ilícitos”, Basso também foi poupado da última denúncia oferecida pelo Ministério Público, contra Claudinho Serra e outras 21 pessoas.

Aliás, foi em nota de rodapé, trazida na peça do MP, que houve a confirmação de que o ex-servidor havia virado delator. “Deixa-se, por ora, de denunciar Tiago Basso da Silva pelos fatos descritos na inicial acusatória, por ter pactuado colaboração premiada com o Ministério Público, já homologada judicialmente no âmbito do Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul”, diz o parágrafo em letras miúdas.

Dinheiro fotografado por investigado na Tromper para enviar a outro alvo em conversa de WhatsApp interceptada (Foto: Gecoc/Reprodução)
Dinheiro fotografado por investigado na Tromper para enviar a outro alvo em conversa de WhatsApp interceptada (Foto: Gecoc/Reprodução)

As defesas – O advogado de Tiago Basso, Wellison Muchiutti afirma que não há nada a pontuar, uma vez que “os fatos já estão no processo e no termo de colaboração”.

Fabio de Melo Ferraz, que advoga para Thiago Rodrigues Alves, afirma que “o colaborador não apresentou nenhuma prova contundente, robusta, irrefutável das alegações que fez”. Ele buscará a Justiça para invalidar a delação. “Por isso, vamos em momento oportuno, questionar a validade da colaboração tendo em vista a sua fragilidade”.

Já a defesa de Claudinho Serra foi acionada pela reportagem na segunda-feira (17), mas até o fechamento desta matéria, o advogado Tiago Bunning não havia respondido ligação ou às mensagens enviadas. O advogado de Edmilson Rosa também foi procurado e não deu retorno até a publicação da reportagem.

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