Após denúncia sobre Geisel, comissão pede troca de nomes de ruas da Capital
Relatório responsabilizando ex-presidente por desaparecimentos na ditadura leva comissão a pedir cumprimento de lei que proíbe batismo de logradouros com nomes de torturadores
A divulgação de relatório da CIA (a agência de inteligência dos Estados Unidos) revelando que o ex-presidente Ernesto Geisel teve responsabilidade em cerca de 100 desaparecimentos de pessoas durante o regime militar reacendeu, em Campo Grande, debate envolvendo a proibição de que nomes de torturadores ou pessoas que tenham cometido atos de “lesa humanidade” e corrupção batizem logradouros públicos. A intenção envolve mudar a identificação de ruas e avenidas que homenageiem ex-presidentes da ditadura aos quais são atribuídos práticas do gênero.
Na sexta-feira (11), o Comitê Memória, Verdade e Justiça de Mato Grosso do Sul enviou ofício ao prefeito Marquinhos Trad (PSD) pedindo o cumprimento da lei 5.820/2014, aprovada pela Câmara e sancionada por Alcides Bernal (Progressistas). Membro do colegiado, o ativista Haroldo Borralho afirma que, embora esteja em vigor, a legislação não promoveu as alterações.
A revelação sobre Geisel, frisa Borralho, foi “um soco no fígado do cidadão”, uma vez que o ex-presidente, o penúltimo do regime militar, era tido como moderado –durante sua gestão, foi revogado o Ato Constitucional nº 5 (que acabou com liberdades políticas e restringiu direitos civis na ditadura). Regionalmente, ele era respeitado por ter sido a sua caneta que assinou a criação do Estado de Mato Grosso do Sul.
Alcance – “O relatório sobre o Geisel surpreendeu a todos. Ninguém esperava que ele tivesse praticado esses atos”, declarou o integrante da comissão. Contudo, a avenida que leva o nome de Ernesto Geisel não seria a única alterada. Os debates da comissão datam do início da década passada e incluíam, entre as vias a terem os nomes alterados, as avenidas Costa e Silva (na Vila Progresso) e Presidente Castelo Branco (Monte Castelo).
“Não precisa ser apenas presidente. Há vários nomes do tempo da ditadura responsabilizados por essas práticas. Seria preciso um levantamento mas, de início, focaríamos nos mais ‘conhecidos’”, destacou Borralho, segundo quem até ruas dentro de unidades militares, que comumente homenageiam integrantes das Forças Armadas, poderiam ser alcançadas pelas mudanças. “Trata-se de patrimônio da nação, então teria de ser mudado também”.
Presidente da Comissão de Eficácia Legislativa da Câmara Municipal, o vereador Willian Maksoud (PMN) pede cuidado sobre o tema, uma vez que os batismos de logradouros públicos também são feitos por meio de leis específicas.
“Há de se ponderar que os nomes de ruas em Campo Grande também foram instituídos por meio de dispositivo legal, o que faz com o que o assunto precise ser tratado com cautela”, destacou o vereador. Sobre a Ernesto Geisel e outras avenidas listadas, ele destacou que tanto a via como as nomenclaturas “são anteriores à lei de 2014”.
Maksoud destacou, porém, que “nada impede que o assunto seja discutido na Casa de Leis, que sempre deu voz às demandas da população”.
O integrante da Comissão da Verdade do Estado lembra, ainda, que o ex-vereador Silvio Nucci (já falecido) chegou a propor a mudança do nome da avenida Ernesto Geisel para Plínio Barbosa Martins. “À época fizemos uma pesquisa com moradores e houve uma resistência”, reconheceu, “mas a manutenção dos nome é muito doída para quem foi perseguido. Só quem tem um ente querido nessa situação sabe dessas coisas”.