“Carniça” para irmãos, servidora vazava informações em troca de propina, diz MP
A funcionária pública comissionada foi presa nesta quarta-feira (29) em ação do Gaeco e Gecoc
Chamada de “carniça” por pressionar por “alguma coisinha para ela”, a servidora Simone Ramires de Oliveira Castro, lotada no setor de licitações do Governo de Mato Grosso do Sul, é investigada por receber propina para vazar informações privilegiadas para Lucas Andrade Coutinho e Sérgio Duarte Coutinho Júnior, irmãos donos de contratos milionários com a administração estadual. A funcionária pública comissionada foi presa nesta quarta-feira (29) em operação deflagrada pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado) e Gecoc (Grupo Especial de Combate à Corrupção).
Ainda conforme a investigação, Simone monitorava propostas lançadas em pregões e até fornecia documentos sigilosos aos empresários, que com a vantagem nas mãos tinham mais chance de vencer licitações para fornecer produtos e serviços ao governo. Em troca, ela exigia pagamentos.
Numa das conversas entre Lucas e Sérgio Coutinho interceptadas, o primeiro fala sobre as exigências da funcionária.
Fala Júnior, beleza? Seguinte cara, éeee, Simone tá me enchendo o saco, ela, encontrei ontem ela lá na secretaria, hoje ela tá me mandando mensagem se tem alguma coisinha pra ela lá do negócio da empresa lá. Aí... sso que eu falo, quando a gente fala com ela tem que sabe muito bem o que vai fala porque ela é carniça, além de eu ter dado aquele dia aquele valor que te falei ela tá pedindo mais um, vê se tem alguma coisa pra ajuda ela lá, que disque ela tá precisando. Ai cê me fala aí”, diz a transcrição de áudio do dia 18 de outubro do ano passado.
Para o Gaeco e Gecoc, trata-se da cobrança de propina por parte da investigada.
Simone tem hoje cargo de direção gerencial superior na SAD (Secretaria Estadual de Administração) com salário de R$ 14.882,48, conforme divulgado no Portal da Transparência do Governo do Estado.
A operação – Os contratos investigados somam R$ 68 milhões. Pelo menos três empresas estão sob suspeita, a Maiorca Soluções em Saúde, de propriedade de Sérgio Coutinho Júnior, e a Comercial Isototal Ltda, que tem como dono Lucas Coutinho, conforme dados abertos divulgados no site da Receita Federal, e a Isomed Diagnósticos.
As apurações começaram durante a Operação Parasita, deflagrada no dia 7 de dezembro de 2022. “Dados extraídos dos aparelhos celulares dos investigados Lucas de Andrade Coutinho e Sérgio Duarte Coutinho Júnior, apreendidos por ocasião” direcionaram a atenção do Gaeco e Gecoc para as contratações das empresas da dupla pela administração estadual, conforme trecho da decisão do juiz Eduardo Eugênio Siravegna Junior, da 2ª Vara Criminal de Campo Grande, que autorizou as prisões e buscas.
Para o magistrado, está evidente “a prática reiterada e contemporânea dos crimes contra a administração pública, de forma que os empresários (Lucas e Sérgio), valendo-se da interferência de servidores públicos (Edio Antônio Resende de Castro e Andréa Cristina Souza Lima, Simone Ramires de Oliveira Castro e Thiago Haruo Mishima,) e coordenador da Apae (Paulo Henrique Muleta Andrade), bem como com o auxílio do operador do esquema criminoso (Victor Leite de Andrade), pagaram ‘propina’ em troca do favorecimento de suas empresas”.
Os oito citados neste trecho da decisão que o Campo Grande News teve acesso estão presos. O processo segue tramitando em sigilo, mas ainda conforme divulgado pelo MP nesta manhã, a operação também esteve em 35 endereços em Campo Grande, Maracaju, Itaporã, Rochedo e Corguinho. Na casa de um dos alvos – o MP não divulgou qual –, foram apreendidos dólares e euros.
“Turn Off” faz referência ao "primeiro grande esquema descoberto nas investigações, relativo à aquisição de aparelhos de ar-condicionado e decorre da ideia de ‘desligar’ (fazer cessar) as atividades ilícitas da organização criminosa investigada”.
Os presos foram levados nesta tarde para o Centro de Triagem Anísio Lima, no Complexo Penal do Jardim Noroeste, e Estabelecimento Penal Feminino Irmã Irma Zorzi. Sérgio Coutinho Júnior foi levado para o Presídio Militar Estadual por ser advogado por formação e ter direito a cela especial.
Outro lado – Quando alvos ainda estavam no Cepol (Centro Especializado de Polícia Integradas), o Campo Grande News conversou com Marcos Barbosa, que se identificou como advogado de Sérgio Coutinho Júnior. Ele informou, contudo, que não tinha nada a dizer em favor do cliente. "Eu ainda não sei de nada, a gente ainda está se inteirando, não tivemos acesso a nada. Só sei pelo o que estou vendo nas notícias. Ele não me disse nada, está custodiado”.
A reportagem apurou que advogados terão acesso aos clientes amanhã, antes dos interrogatórios.
Já o advogado de Simone, Bruno Trindade Camate, disse que a cliente está surpresa e abalada, mas aguarda mais detalhes para se posicionar. Na casa dela, segundo o defensor, foram apreendidos apenas um celular e documentos que “nada tem a ver com o caso”. “Acredito que nenhum advogado teve acesso aos autos, mas acusação principal é de fraude em licitações”.
No início da tarde, o Governo de Mato Grosso do Sul divulgou nota oficial há pouco informando que “serão imediatamente afastados de suas funções todos os servidores da administração estadual investigados” pela operação.
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