Desembargador perde foro e investigação “desce” para a Justiça “comum”
Divoncir Schreiner Maran é suspeito de vender decisão que colocou traficante em liberdade
A investigação contra o desembargador Divoncir Schreiner Maran deve vir parar em uma das varas criminais de Campo Grande. Isso se não sofrer efeito “ioiô” com a conclusão de julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal).
No dia 2 deste mês, após argumentação por parte da defesa de Maran e declínio de competência do MPF (Ministério Público Federal) em permanecer na acusação contra o magistrado, a ministra Maria Isabel Gallotti, relatora do inquérito contra o desembargador no STJ (Superior Tribunal de Justiça), decidiu remeter os autos para a 1º instância. No entendimento da magistrada, não há por que o processo continuar sendo acompanhado pela Corte, uma vez que Divoncir Maran está aposentado e perdeu o foro privilegiado.
Tudo pode mudar, contudo, a depender do término de um julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal). Os ministros Gilmar Mendes e Cristiano Zanin entendem que o foro deve ser mantido quando os fatos investigados ou denunciados forem praticados no cargo.
A ministra fez o alerta, mas decidiu remeter os autos para a Justiça “comum” mesmo assim.
O STF ainda não concluiu o respectivo julgamento. É possível, em tese, haver revisão de posições. Pode ser, ainda, que a conclusão do julgamento leve diversos meses, considerando o pedido de vista já apresentado e outros que eventualmente podem ser feitos. O presente inquérito, contudo, não pode ser paralisado. Deve, portanto, ser aplicada a posição ainda atual do STF, o que não gera risco de nulidade, considerando a ressalva, em todos os votos até agora proferidos, de que serão preservados todos os atos praticados pelo STF e pelos demais Juízos com base na jurisprudência anterior. Assim, em virtude da aposentadoria compulsória do desembargador investigado, em 8 de abril de 2024, exauriu-se a competência originária desta Corte para processar e julgar o feito e todos os processos a ele conexos”, diz a decisão de Maria Isabel Gallotti.
Suspeita de venda – Divoncir é investigado pela decisão que concedeu prisão domiciliar ao narcotraficante Gerson Palermo. Com pena de 126 anos de prisão, ele acabou fugindo.
Primeiro, a legalidade da decisão passou a ser apurada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Noutra frente, na esfera criminal, o STJ autorizou a Operação Tiradentes, realizada pela PF (Polícia Federal) e Receita Federal em 8 de fevereiro, que investiga movimentações financeiras atípicas do desembargador e familiares.
O STJ também determinou que Divoncir ficasse afastado até a aposentadoria. Contudo, no dia 3 de abril, ele voltou ao cargo no Tribunal de Justiça por ordem do ministro Alexandre de Moraes. O desembargador se aposentou dois dias após completar 75 anos, idade limite para a prática da magistratura.
O habeas corpus - Em 21 de abril de 2020, ainda no início da pandemia do coronavírus e feriado de Tiradentes, Palermo foi enquadrado no grupo de risco para a covid e obteve prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico. A decisão aconteceu durante o plantão de Divoncir.
No habeas corpus, a defesa alegou que Palermo tinha mais de 60 anos, sofria de diabetes, hipertensão e por isso corria risco de contrair a covid-19 no cárcere. No dia seguinte, 22 de abril, o desembargador Jonas Hass Silva Júnior, relator do processo, revogou a liminar e restabeleceu a prisão. Oito horas após o benefício do regime domiciliar, o chefão do tráfico rompeu a tornozeleira eletrônica e desapareceu.
Contudo, foram apontadas supressão de instância, ausência de cautela na análise de todos os aspectos envolvidos no deferimento do pedido e violação à resolução do CNJ.
Gerson Palermo é piloto de avião, acumula passagens pela polícia desde 1991 e é chefe do tráfico de cocaína. O crime mais ousado foi no ano 2000, quando sequestrou um Boeing da Vasp.
Outro lado - O advogado André Borges, que defende o desembargador, sustentou no CNJ, em agosto do ano passado, não existir “justa causa para a abertura do PAD [Processo Administrativo Disciplinar]”. Argumentou que não era vedada, naquele período da pandemia, a concessão de prisão domiciliar a traficantes e que o magistrado se ateve aos fatos – idade e condição de saúde do condenado – para tomar a decisão.
André Borges considerou que a decisão do STJ correta, ao enviar tudo para o foro estadual. “Divoncir está tranquilo, sabendo que os fatos serão esclarecidos. Inexistiu qualquer crime, como sempre repetido”, também afirmou.
O responsável pela defesa do desembargador diz ainda que “a investigação até agora foi confusa e recheada de suposições”. “Mas há tempo para que a verdade apareça”, completou.
(*) Matéria alterada às 17h27 do dia 7 de maio para o acréscimo do posicionamento da defesa.
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