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Capital

Família vive no sítio, no meio de megas prédios e a 200 metros da 14

Elverson Cardozo | 16/08/2013 07:00
Julio vive desde criança no sítio e não abandona a propriedade por nada. (Foto: Cleber Gellio)
Julio vive desde criança no sítio e não abandona a propriedade por nada. (Foto: Cleber Gellio)
Família vive no sítio, no meio de megas prédios e a 200 metros da 14

Fácil ouvir que Campo Grande é uma Capital com cara de interior. Difícil é encontrar alguém que discorde. É fato. Mas a cidade, que completa 114 anos no próximo dia 26, já não é tão interiorana assim. São 805.397 mil habitantes, segundo a última estimativa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Apesar disso, a “fama”, avalie, faz sentido. Mesmo como crescimento, há quem mantém, ainda hoje, mais de um século depois, um estilo de vida, digamos, mais rústico. Julio Barbosa Lugo é um desses. Ele tem 53 anos e há mais de 35 vive em um sítio, próximo do centro e a 200 metros da Rua 14 de Julho, com a esposa e os dois filhos.

A propriedade fica no São Francisco, de frente a uma rotatória, na avenida Ernesto Geisel, quase esquina com a Euler de Azevedo. A área, que lembra fazenda, gera imenso contraste com os residenciais modernos construídos na região.

Julio cresceu ali, junto com os avós, em uma época onde o mato, as árvores, os bichos e a terra eram as principais – e únicas - atrações. Aprendeu “muita coisa”, como costuma dizer.

Se hoje sabe roçar, capinar e “mexer com essas coisas de fazenda”, foi graças ao estilo de vida que levava. Se hoje gosta de tranquilidade, do contato com a natureza, com as galinhas e cachorros que cria, é por causa disso. Se hoje gosta de comida no fogão à lenha e prefere beber água do poço, também é por conta disso.

Sitiante ainda gosta de cozinhar no fogão à lenha. (Foto: Cleber Gellio)
Sitiante ainda gosta de cozinhar no fogão à lenha. (Foto: Cleber Gellio)

Julio não mudou, nem quer mudar, mas viu a região onde mora se transformar lentamente. O asfalto chegou e, com ele, a loucura do trânsito. Apareceram vizinhos, “modernos”, mais barulhentos. Tudo mudou. Mas, da cerca para dentro, pouca coisa foi alterada. O bem-estar, apesar dos anos, continua a ser o mesmo. É por isso que ele não troca o local por nada.

“Para mim é uma maravilha porque, veja bem, estou com 53 anos e, desde guri, usufruo disso aqui, disse. Ele mora em uma área de 1 mil m², cedida pela mãe, que herdou parte dos terrenos dos pais, já falecidos.

Dona Aline Barbosa Lugo, 73 anos, vive nos fundos e conhece a propriedade, de 3,5 hectares, como a palma de suas mãos. Foi criada ali, desde os 4 anos. “Daqui vou sair só para o campo santo, onde ficam os mortos”, disse ela, categórica. “Aqui eu vivi minha infância. Era uma chácara onde convive com meus pais. É um sossego, uma paz e tranquilidade”.

Dona Aline modernizou a casa. Não tem mais "velharia",  mas gosta de viver na propriedade que tem o sossego de uma fazenda. (Foto: Cleber Gellio)
Dona Aline modernizou a casa. Não tem mais "velharia", mas gosta de viver na propriedade que tem o sossego de uma fazenda. (Foto: Cleber Gellio)

Aline também lembra do passado, da época em que a energia elétrica era um sonho e fogão à gás, uma lenda. “Era lampião e lenha”, resumiu.

As dificuldades passaram e a tecnologia contribuiu. Diferente do filho, a aposentada, hoje viúva, faz questão de aproveitar as “modernidades”. Na casa de 8 peças, só tem móveis novos. Nada de “velharia”.

Não tem tranqueira no imóvel, mas tem ar de tranquilidade. Faz bem para ele contar que, no quintal de casa, possuiu dois pés de jatobás centenários, e que ali, vira e mexe, aparece capivara, “lagarto que come ovo” e até gambá.

Dona Aline também gosta de dizer que, apesar do desenvolvimento, tem uma vizinhança abençoada. É cercada por religiosos. O Tribunal Eclesiástico da Igreja Católica fica ao lado. Nas proximidades também existe uma faculdade de teologia.

A mesma região é residência de freiras franciscanas e padres palotinos. “Não vendo. Penso em deixar para os netos”, respondeu, quando foi questionada sobre uma possível proposta.

Julio a mãe e o pé de jatobá centenário. (Foto: Cleber Gellio)
Julio a mãe e o pé de jatobá centenário. (Foto: Cleber Gellio)

Logo que os pais dela morreram, a área foi dividida entre as cinco irmãs. Além de Aline, duas vivem no mesmo local. Uma deles é Maria Crescia, 71 anos, que nem pensa em arredar o pé do sítio no meio da cidade.

Ela até tentou deixar a vida de “chacreira”, mas não conseguiu. Quando o marido morreu, há mais ou menos 20 anos, a mulher se mudou para um residencial, mas ficou só três meses na casa nova. “É muito barulho. Os vizinhos incomodam em cima, do lado, de todo canto. A rapaziada chega no condomínio gritando os colegas. Hoje, acho que o povo está mais educado, mas eu não me adaptei”, contou.

Julio, que faz questão de ser sitiante, nem tentou. Gosta mesmo é do mato. “Aqui tem espaço, verde, animais, frutas. É difícil viver em uma vila com gente na sua frente, do seu lado, com barulho”, concluiu. Na Família dos Barbosa, todo mundo tem um quê de caipira, disse ele. O desenvolvimento é importante, mas faz bem preservar alguns costumes.

Da esquerda para direita: Maria, Aline e Julio. Nenhum pensa em deixar a área. (Foto: Cleber Gellio)
Da esquerda para direita: Maria, Aline e Julio. Nenhum pensa em deixar a área. (Foto: Cleber Gellio)

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