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“Batia e beliscava”: cuidadora conta que viu tapa que fez sangrar boca de bebê

Mariana de Araújo Correia, 26, também admitiu dar remédio que deixava crianças dopadas a mando de patroa

Anahi Zurutuza | 12/07/2023 17:35
Salão comercial onde funcionava o "Cantinho da Tia Carol" (Foto: Google Street View)
Salão comercial onde funcionava o "Cantinho da Tia Carol" (Foto: Google Street View)

Presa na tarde de segunda-feira (12) junto com a dona de creche clandestina, onde crianças apanhavam e eram dopadas, conforme investigação da Polícia Civil de Naviraí, a funcionária do “Cantinho da Tia Carol” afirmou em depoimento que teve medo de denunciar a patroa e que medicava bebês, meninos e meninas a mando de Caroline Florenciano dos Reis Rech, de 30 anos. Mariana de Araújo Correia, 26, pagou fiança de R$ 1.320,00 (um salário mínimo) e responde ao inquérito em liberdade.

Na delegacia, foi informada do direito de ficar em silêncio, mas mesmo sem advogado, decidiu falar. Contou que trabalhava na creche há quatro meses e que ao mesmo tempo em que não tomava coragem para denunciar maus-tratos que testemunhou, temia deixar o emprego. “Sempre pensei que se saísse de lá, algo pior poderia acontecer”.

Mariana negou ter agredido as crianças. “Nunca relei o dedo em nenhuma criança. Eles gostam muito de mim, só dormem comigo. Deito com eles, para fazê-los dormir”. Mas, admitiu ter testemunhado Caroline, com quem dividia os cuidados, bater e beliscar os pequenos.

“Olha, no começo, quando eu comecei a trabalhar lá, ela não era violenta com as crianças. Ela parecia ser calma, mas acho que depois, ela foi se sentindo mais à vontade e aí que ela começou a judiar das crianças na minha frente”, narrou.

A cuidadora relatou agressões contra dois meninos e uma menina específicos, os principais alvos, segundo a funcionária. “Tem criança que ela bate porque diz que não vai com a cara. Por exemplo, tem o G*, que eu cuido dele à noite na minha casa, e um dia sim outro não, ele vai lá para a creche. A Caroline fala que não suporta a cara dele. Teve um dia que ela deu uns tapas nele e disse que estava batendo nele porque não suportava a cara feia dele”.

Outro garotinho, de 5 anos, que também sempre esteve na mira da patroa, de acordo com Mariana, apanhou “umas duas vezes”. “A bebezinha é a que mais ela batia e beliscava. Vivia beliscando a bebê*, porque ela é arteirinha. Um dia deu um tapa na boca da A* e saiu sangue. Nas [crianças] maiores, ela não bate. Por que elas falam né? Mas, todos eles têm muito medo dela. Não podem nem conversar, que ela fica brava, grita muito”.

Delegada Sayara Baetz (sentada à frente), delegado Gustavo Ferrari e equipe de policiais de Naviraí que prenderam mulheres por tortura em creche (Foto: PCMS/Divulgação)
Delegada Sayara Baetz (sentada à frente), delegado Gustavo Ferrari e equipe de policiais de Naviraí que prenderam mulheres por tortura em creche (Foto: PCMS/Divulgação)

A interrogada disse à delegada Sayara Baetz, responsável pelo caso, que há mais ou menos três meses, Caroline lhe entregou um vidro de medicamento e disse para que a cuidadora ministrasse 20 gotas para a bebezinha de 11 meses que a polícia assistiu ser agredida pela dona da creche. Afirmou que a garotinha recebia tal dose, provavelmente muito superior à permitida, já que a recomendação na bula é de uma gota para cada 1 kg, sempre pelas manhãs.

Mariana disse ainda que já fez o mesmo com outras três crianças, uma delas de 1 ano, sabendo que o remédio não havia sido entregue ou autorizado pelos pais.

No “Cantinho da Tia Carol”, foi apreendido frasco de Dramavit, remédio para enjoo, vômito e tontura, mas que tem efeito sedativo. O medicamento não é recomendado para menores de 2 anos.

Homologação da fiança – Mariana foi indiciada pelo crime do artigo 132 do Código Penal, que prevê pena de detenção de 3 meses a 1 ano para quem “expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente”.

O juiz Paulo Roberto Cavassa de Almeida, da 1ª Vara Criminal, contudo, discordou da delegada sobre o enquadramento, mas homologou a prisão em flagrante e também a fiança. “Desde já, ressalto que a conduta da autuada não se adéqua perfeitamente ao tipo penal indicado pela autoridade policial e, a depender das investigações e da produção de demais provas, poderá eventualmente ser reexaminada por este juízo, em momento oportuno, vez que conforme o apurado, a indiciada supostamente teria se omitido em face de um dever de cuidado, podendo, portanto, responder por crime mais grave”.

Mariana é obrigada a comparecer à delegacia e em juízo sempre que convocada e está proibida de viajar sem autorização.

O celular da investigada está desligado. Ela não tem advogado, mas o espaço segue aberto para futuras manifestações.

Outro lado - Carol, como é conhecida, está cadastrada na polícia como profissional do sexo e já tem ficha criminal. No fim da tarde desta terça-feira (11), o juiz decidiu manter a dona da creche presa para a “garantia da ordem pública, dada a gravidade concreta dos fatos, consubstanciada pela violência contra crianças”.

O advogado da dona da “escolinha”, Mauro José Gutierre, enviou texto assinado pela cliente à reportagem que diz: "os fatos não deram da forma como estão sendo divulgados e propagados nas redes sociais". Veja a nota na íntegra:

Campo Grande News - Conteúdo de Verdade


(*) Os nomes das crianças citados no interrogatório foram omitidos ou trocados por palavras correspondentes às vítimas em respeito ao preconizado pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).

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