A terra: novos bandeirantes, grandes fazendeiros e posseiros
É possível uma fazenda ter mais de 700.000 hectares? Ela existiu. A posse da terra no Mato Grosso do Sul causa algumas perplexidades. Uma delas é que os primeiros desbravadores das terras próximas aos afluentes do rio Paraguai eram descendentes dos antigos bandeirantes, talvez daqueles que haviam destruído as missões jesuíticas entre Aquidauana e Miranda. Eles, inicialmente, se travestiram de mineradoras e foram procurar ouro em Cuiabá para, logo em seguida, desistindo da mineração, ocupar as imensas terras entre Coxim e Aquidauana. Mas essa história deveria também ser contada com a presença dos pequenos: foreiros, rendeiros e posseiros que não tem nome registrado em nossos livros.
"Bracinho", a fazenda de mais de 700.000 hectares.
Por volta de 1.848, João Batista de Oliveira, em sociedade com João Alves Ribeiro da Cunha, fundavam, à margem esquerda do Taquari, entre os rios Salobra e Peixe, o latifúndio do "Bracinho", com 736.928 hectares. Era gigantesca. Às margens do rio Miranda já se encontravam fixados, entre outros, no Morro do Azeite, João Leme do Prado e irmãos, filhos e este homônimo do bandeirante que entre outras ações, escolheu o lugar onde construiriam o Forte e Presidio de Miranda, que cumpriria, muito depois, papel importante na guerra com o Paraguai.
Foreiros, os pequenos da terra.
A incipiente economia do Mato Grasso do Sul não estava, como em geral se imagina, assentada apenas sobre grandes propriedades rurais, com quilômetros quadrados de extensão. Havia foreiros - anônimos, obviamente - que alugavam lotes de terra de tamanhos variáveis e pagavam anualmente por essa posse, em dinheiro ou, o mais comum, com o que obtinham em seus trabalhos.
Rendeiros, posseiros (indígenas).
Também havia rendeiros. A diferença dos foreiros era tão somente que seus contratos permitiam que transferissem de pai para filho a possibilidade de explorar a terra acertada com o grande fazendeiro. Eram pequenos produtores sem capital suficiente para comprar vacas. Dedicavam-se, essencialmente, à criação ou lavoura de subsistência. Também era corriqueira a presença, nas bordas das grandes propriedades ou em terras do Estado, famílias de moradores que se dedicavam à criação de animais e a roças de subsistência sem quaisquer documentos. Não eram foreiros e nem rendeiros, eram chamados "posseiros". Todos - latifundiários, foreiros, rendeiros e posseiros - eventualmente, recorriam à mão de obra indígena. Se não há uma história dos pequenos, a dos indígenas só pode ser colocada entre parênteses. Aproxima-se do inaceitável. Índio não pode ter história no mundo do trabalho e na posse de terras neste país.