O encanto acabou: não há previsão alguma de melhoria nos próximos anos
Um futuro de baixo crescimento está anunciado. O aumento da produtividade é a chave necessária
Deixamos para trás a boa fase de crescimento. Este é o resumo do momento de um país cuja trajetória de expansão era admirável até pouco tempo. Perdemos o fôlego.
Para quem não recordar, uma breve história que hoje parece uma piada: Em outubro de 2003, o banco Goldman Sachs produziu um relatório que fazia projeções para os Brics (Brasil, Índia, China, Rússia e África do Sul). O Brasil nesse relatório ultrapassaria a Itália em 2025. A França seria deixada para trás em 2031. Reino Unido e Alemanha seriam vistos pelo retrovisor em 2036. E assim, chegaríamos em 2049 atrás da China, Estados Unidos, Japão e Índia, como a quinta maior economia do mundo.
Essa é uma conversa que a população pouco se importa. Os mesmos "futurólogos" do Banco Goldman Sachs previam que o bolso do brasileiro estaria cada vez mais cheio de dinheiro. De acordo com eles, a renda per capita dos brasileiros cresceria dez vezes e chegaria a US$ 27.000. As coisas, como se sabe, não deram certo.
O encanto se quebrou. A expansão de 7,5% em 2010 caiu para menos da metade no ano seguinte e de acordo com as previsões do próprio governo para o próximo triênio, chegaremos no máximo a 2,3% em 2017. Para o bolso do brasileiro também há notícias desanimadoras - de 2011 para cá, o PIB per capita em dólar caiu 14% e não há previsão alguma de melhoria nos próximos anos.
O ciclo de crescimento durou pouco. A principal razão para isso foi a dificuldade do país em aumentar sua produtividade, que de 2003 a 2010 avançou em média 1% ao ano. É muito pouco para o país se tornar competitivo e deixar de depender apenas da exportação de commodities. E mesmo depois de 2010 ainda não aprendemos as lições da competitividade. Pelo contrário. Hoje, a produtividade dos brasileiros é 23% da conseguida pelos norte americanos e, para dificultar ainda mais, o preço dos minérios e alimentos somados desde abril de 2011, caiu 42%. A esperança ressurge, mas além das mudanças governamentais de nomes e ações, a retomada do crescimento da década passada depende de aumentar a produtividade.
A importância dos Brics para o futuro do Brasil
A única característica em comum do bloco que recebeu a sigla de Brics (Brasil, Índia, China, Rússia e África do Sul) foi, durante a década passada, o alto crescimento econômico, que hoje é privilégio apenas da Índia e, especialmente, da China, dois países que estão avançando muito em reformas que aumentam sua produtividade e tornam suas economias mais eficientes.
Mas os Brics nunca tiveram unidade econômica nem política. Também não constituíram um bloco que lutasse pelos mesmos interesses. Criaram, recentemente, um Banco de Desenvolvimento que poderá ser mais uma fonte de financiamento para as obras de infraestrutura necessárias para nós. Mas isso não significa que estejamos formando um bloco que possa se antepor aos interesses das economias mais ricas e maduras.
A continuar do mesmo tamanho nos últimos anos, o termo Brics passará para a história e não se sustentará nem como ideia de força e crescimento acelerado. A Rússia está entrando em colapso por causa de sua geopolítica e da queda do petróleo e do gás. Brasil e África do Sul entraram em uma fase prolongada de baixo crescimento. A ideia de crescimento acelerado só se mantém na Índia e na China e tudo leva a crer que esses dois países continuarão a ter um crescimento invejável. O motivo são reformas implementadas nos dois gigantes. As indianas são similares às necessárias no Brasil: trabalhista, educacional e facilitação fiscal. As chinesas são muito mais profundas. Na ultima década os chineses tentaram implantar um capitalismo com forte viés estatal (tal como no Brasil dos últimos 4 anos) e uma política industrial com importante protagonismo público. Mas esses programas não deram certo (tal como no Brasil de 2011 a 2013). O desempenho das empresas estatais e das protegidas pelo governo chinês foi baixo (essa conta não foi feita no Brasil). As empresas privadas instaladas na China cresceram duas vezes mais que as estatais e as protegidas pelo governo.
O governo chinês entendeu que essas políticas intervencionistas não funcionaram. Por isso, o modelo está sendo revisto. Monopólios ainda estatais - financeiro, elétrico e de telecomunicações - estão perdendo força. O governo chinês permitiu a abertura de cinco bancos privados e concedeu 25 licenças a empresas do setor de telecomunicações. Tudo indica que esse será o rumo dos próximos anos no Brasil, um rumo sem a pretensão intervencionista comandada pelo ex- czar da economia Guido Mantega.
O que os novos governantes desejam recuperar?
Se é verdade que uma recuperação poderá ocorrer, embora não saibamos quando, é essencial definirmos o que entendemos por recuperação. Recuperação dos lucros? Ou recuperação dos padrões de vida daqueles que estão no andar mais baixo da sociedade? Ou é a recuperação das finanças públicas? A nossa economia está em condições críticas. E temos algumas desordens em andamento: baixo crescimento, sufocamento da esfera pública, avanço da oligarquia, da corrupção e da anarquia. Não é uma mera missão para a equipe econômica que acaba de assumir. Pertence ao governo como um todo e a todos os governos do país. Como tudo isso irá acabar?
Os 27 governadores estão preocupados com os gastos com pessoal
O ano de 2014 trouxe um baixo crescimento nas receitas de todos os estados brasileiros. O número, em média, que mais preocupou foi o dos repasses federais, que deixou uma herança bastante complicada para os governadores eleitos ou reeleitos nos 26 Estados e no Distrito Federal. A exemplo da União, o superávit fiscal (sobra de dinheiro no caixa) "sumiu" e todos os Estados, sem exceção, estão tomando medidas de ajuste de suas finanças. A medida unânime é o de corte com despesas com pessoal. A evolução dos gastos com pessoal será uma preocupação para todos os Estados. Os novos mandatários precisam lidar com índices que ultrapassaram o teto da folha de salários e previdência no ano de 2014, de acordo com os critérios da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Em 5 deles (Alagoas, Paraíba, Piauí, Sergipe e Tocantins) a despesa com pessoal estourou o "limite máximo" que é de 49% da receita corrente líquida (todo o dinheiro que entra no cofre). Serão sancionados pelo Tesouro Nacional brevemente com restrições à contratação de servidores e proibição de contrair financiamentos, não poderão comprar dinheiro dos bancos em hipótese alguma.
Há um segundo patamar que também deve preocupar os governadores: o denominado "limite prudencial", que equivale a 46,55% da receita corrente líquida. Nesse grupo estão os Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Norte. É a turma que não está com o pescoço na guilhotina, mas deve ficar com as "barbas de molho", uma vez que as aposentadorias e os direitos dos servidores os levarão para o limite máximo. Essa turma terá a fiscalização muito apertada sobre eles. Não poderão cometer erro algum. Atitude muito difícil de acontecer.
Há um terceiro grupo de Estados que podem ser considerados sob a égide da "luz amarela" (não há uma definição jurídica para ela, apenas preocupação), são os que estão com índices de 44% de despesas com pessoal. São eles: Acre, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Pará, Pernambuco, Rio Grande do Sul e São Paulo. Devem estar preocupados com as despesas com pessoal realizadas no ano passado, pois podem surgir durante a fiscalização do Tesouro Nacional algumas diferenças que os colocarão imediatamente no grupo do limite prudencial.
Por último, há um diminuto grupo que fez seu dever de casa. Cumpriu com a meta de despesa com pessoal determinada pela lei. Nele estão a Bahia, o Espírito Santo, o Maranhão, o Rio de Janeiro e o Mato Grosso do Sul. Deste grupo apenas o Rio de Janeiro não pode cantar vitória, pois toda sua imensa folha de aposentados e pensionistas é paga com um recurso que é quase exclusividade dos cariocas - os royalties do petróleo. O Mato Grosso do Sul fechou o ano, de acordo com o Tesouro Nacional, com despesas de pessoal com índice de 39,69% da receita corrente líquida. Em dinheiro, fazendo conta grossa, rápida e pautada apenas no mês de dezembro, haveria uma folga que equivaleria a mensalmente algo entre R$40 milhões a R$ 60 milhões a serem gastos com pessoal durante os meses de 2015. Mas essa conta deve ser melhor balanceada por três fatores: gastos inerciais (aposentados, pensionistas e direitos dos servidores), queda da receita com combustíveis, comunicação e gás, e, por último, a preocupação com o pagamento do décimo-terceiro salário a ser pago em dezembro. Essa "poupança" deve começar em janeiro de 2015 (não existe décima-terceira receita, são apenas 12 arrecadações e 13 folhas de pessoal a serem pagas). O resto pertence ao campo da política eleitoral e a outros interesses.