Investimento bilionário do Governo não chega aos produtores de leite
Todos os dias, a família do produtor Eder Rolin acorda antes da 4h e trabalha na produção de até 500 litros de leite. Para o produtor Jorge Rech, a esposa e os dois filhos a rotina é a mesma. Ambos vivem em São Gabriel do Oeste, a 140 quilômetros de Campo Grande.
A cada dois dias o caminhão do laticínio passa nas propriedades e leva o leite que será pasteurizado e vendido. O veículo passa ainda por outras 14 propriedades do assentamento Campanário, a 10 quilômetros do município, onde as famílias produzem entre 60 e 300 litros de leite por dia.
No último mês, o laticínio atrasou os pagamentos e esses produtores ficaram sem receber pela produção. Eder e Jorge trocaram de empresa e agora fornecem o produto para outro laticínio, que está pagando em dia, mas ainda assim lamentam não ter mais lucratividade nessas negociações ou ainda poder fazer a própria distribuição.
Pouco incentivo - Os produtores reclamam dos impostos e pedem incentivos do Governo e linhas de crédito bancário acessíveis ao pequeno produtor. “Falam na TV que tem milhões para a agricultura familiar, mas nós não temos acesso a esse dinheiro”, destaca Eder.
O recurso noticiado pelos jornais ao que o produtor se refere é de R$ 24,1 bilhões, do Plano Safra da Agricultura Familiar, lançado no dia 26 de maio pela presidente Dilma Rousseff. As taxas de juros variam de 0,5% a 3,5%. Mas Eder e Jorge reclamam não ter acesso a essas linhas. “O crédito que tem para nós aqui é com taxa de 2% ao ano, pelo Banco do Brasil. Somente o grande produtor consegue empréstimo melhor, com até quatro anos de carência”, afirma Eder.
O presidente da Acafe (Associação Campanário da Agricultura Familiar), Roque Luiz Buzanello, concorda que o investimento federal, que é para compra de máquinas e equipamentos, não alcança os pequenos produtores de leite “Temos que ter uma política mais séria de fortalecimento do produtor de leite, porque toda a renda das famílias depende da produção”.
Muito Imposto - “Nós temos que pagar 2,3% de imposto ao Fundersul (Fundo de Desenvolvimento do Sistema Rodoviário do Estado do Mato Grosso do Sul). Parte disso vai para o Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural). Em sete anos eu fiz apenas um curso oferecido pelo Senar, então essa contribuição não tem retorno para a gente”, afirma Eder.
Eder explica que se ele quiser pasteurizar o leite e vender para fora do Estado para ter uma boa lucratividade, terá que pagar 100% de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), enquanto o laticínio tem desconto sobre esse imposto. “Nós somos obrigados a vender para o laticínio, que tem todo incentivo e ainda consegue quebrar e deixar de pagar a gente. Isso acontece, porque a política pública que existe permite que fique fácil de o laticínio dominar a gente”.
Segundo Eder, o laticínio tem 80% de desconto no ICMS, desde que pague em dia os produtores e os transportadores. “Porque o Governo não obriga direcionar parte desse valor para o produtor?”, sugere o produtor. “A gente precisa de incentivos também, porque se não a única alternativa é vender para o laticínio e aí acontece ainda de não pagarem em dia”, afirma Jorge.