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Comportamento

Após quase seis meses de pandemia, quantas vezes você já surtou?

Se você não surtou, não repensou a carreira, a vida, não está tomando remédio, nem foi para terapia, você não está vivendo 2020

Paula Maciulevicius Brasil | 30/08/2020 09:23
A cena é do filme Tully, de 2018, mas se aplica perfeitamente à rotina das mães nesta quarentena.
A cena é do filme Tully, de 2018, mas se aplica perfeitamente à rotina das mães nesta quarentena.

Eu não aguento mais a quarentena. A pandemia. O home office. A falta da escola. A ausência de ajuda externa. Quem me pergunta: "tudo bem?" tem como resposta a exaustão e o desabafo de: não aguento mais. Aí penso, como que a gente aguentaria? Meus filhos estão em casa 24h por dia desde o dia 21 de março. Eles ainda continuaram indo mesmo depois do primeiro decreto municipal e só pararam quando os portões da escola se fecharam mesmo.

Desde então, é home office, criança correndo e gritando pela casa, choro, fome, tédio e mil artes pedindo atenção. Por sorte, divido toda a função com pai delas, que é incrível por sinal. Mas, de um modo geral, se as mulheres já eram sobrecarregadas numa vida "normal", na pandemia isso ficou escancarado. Começando pelos inúmeros pedidos de indicações de psicólogos, psiquiatras, desabafos e olheiras. Muitas olheiras. Tudo isso é visto nos grupos de mães. Nessas horas, só mãe que está vivendo exatamente a mesma coisa que você te entende sem julgamentos.

Este texto não tem nenhum objetivo se não dizer que é completamente compreensível repensar a carreira, o modo de vida, começar terapia, tomar tarja preta, reclamar e odiar a maternidade. Eu amo meus filhos, e não gostaria de precisar enfatizar isso, mas é preciso jogar a real: que mãe não gostaria de jogá-los pela janela em determinados momentos? Ou até mesmo se jogar? Palavras ditas em sentido figurado, gente.

Também cansei das mães de Instagram. Dos perfis das perfeitas, que não tem a mínima noção do que é viver a maternidade real. Se eu já seguia bem poucas, agora então, saí apertando o "deixar de seguir". Na boa, a última coisa que a gente precisa é de alguém que prega a entrega completa, que nunca reclama, que está sempre sorrindo... Não vou nem terminar este pensamento porque acabaria usando palavrões como vírgula.

Na tentativa de só sobreviver, sim, este é o meu único plano desde que a pandemia chegou: sobreviver a 2020, eu estou fazendo acompanhamento psiquiátrico, aliás, beijos Nathalia, obrigada por tudo. Também estou na terapia, comecei a psicanálise, que até então nunca tinha feito essa linha, apesar de eu ter faltado a última sessão, sim, eu consegui FALTAR a uma sessão que é ONLINE. Desculpe, Daniel, amanhã a gente retoma, tá? Fato é que a única coisa que a gente pode fazer neste momento é procurar ajuda profissional. E se você conseguir conciliar também com exercício físico e alguma coisa espiritual, tá ótimo. (Estou tentando ir para a esteira do condomínio 3x na semana e fazer reiki).

Anos atrás, quando assisti ao filme "Tully" (deixei um trailer que achei interessante abaixo), vi o que a rotina pesada de uma mãe é capaz de fazer. Um tempo depois, li uma matéria que me marcou para sempre: precisamos falar sobre a saúde mental das mães e dizia que a tela de proteção dos apartamentos não era para impedir que as crianças caíssem, e sim para as mães.

Não ter data para voltar ao normal, para mim, é o pior. Já desisti da escola, tirei os meus com dor no coração, mas não tinha condições de continuar arcando com a mensalidade de dois.  Não sou tão otimista em relação à vacina e sinto que ainda vou ficar muito mais tempo sem que vejam meu sorriso sem máscara. Aliás, gostaria de voltar a sorrir. Eu só estou tentando sobreviver ao ano de 2020.

Se você de alguma forma se sentiu abraçada neste texto, me escreve: paulamaciulevicius@gmail.com.


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