Em MS ou na Bahia, Carnaval é luta, diz fundador do 1º bloco negro
Antônio criou o Ilê na ditadura, quando negros só eram aceitos em grandes blocos percussão e carregar alegoria
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Em 1974, a luta era por liberdade e direito de existir, além de alcançar o poder. Em 2025, esse continua sendo o objetivo. Comemorando as conquistas durante 51 anos de história, a reflexão é de Antônio Carlos Vovô, o fundador e presidente do primeiro bloco negro de Carnaval, o Ilê Aiyê.
Visitando Campo Grande, o músico e ícone do Carnaval baiano conversou com o Lado B sobre como ser homenageado por aqui é sinônimo das batalhas travadas pelo Ilê, assim como a folia também é sinônimo de resistência e educação.
Para quem não conhece, o Ilê Aiyê nasceu durante a ditadura militar brasileira, que coincidiu com o período em que o movimento negro tomava força pelo mundo. Na época, o Vovô do Ilê sediou o bloco no terreiro Ilê Axé Jitolu, que fica localizado na ladeira do Curuzu, em Salvador.
Um ano após ser fundado, o bloco já estreou no Carnaval de Salvador e, é claro, enfrentou resistência. Além de estar na rua durante a folia, o bloco também decidiu expandir suas atividades para outros dias do ano com ações educativas.
Considerando esse contexto, Antônio explica que celebrar as cinco décadas de transformação social pelo Brasil é um espelho que mostra os resultados do que ele chama de “black atitude”.
Em Campo Grande, Vovô participou do esquenta do Cordão Valu nesta sexta-feira (7), que homenageou o bloco e também o Grupo TEZ (Grupo de Estudos e Trabalho Zumbi).
“Foi muito difícil lá atrás e continua, mas hoje você vê o reconhecimento, as transformações que aconteceram e que se espalharam tanto pelo Brasil quanto internacionalmente. A gente vê isso acontecendo através da música e também da educação afro”, diz o Vovô do Ilê.
No caminho, Antônio destaca que tratar o estado brasileiro como nação africana traz consigo o uso das roupas coloridas, o orgulho do seu cabelo e detalhes que hoje até podem passar despercebidos, mas que fazem toda a diferença. Exemplo disso é ver que as heranças africanas estão espalhadas e sendo evidenciadas mais e mais a cada dia.
“Nosso movimento nunca foi só com os tambores, eu falo que desde o período da escravidão, o negro sempre lutou e nunca teve acomodação. Nós sempre estivemos na resistência e continuamos assim”.
Especificamente sobre o Carnaval, o idealizador do bloco comenta que seja em Mato Grosso do Sul ou na Bahia, levar o movimento para a rua é um empenho coletivo. Entre os problemas ele cita que, para ele, a festa se tornou um “Carna-negócios”.
Ele exemplifica que os recursos empenhados sempre são uma questão importante e que muitos governos e empresas ainda não entenderam que Carnaval custa caro.
Apesar disso, há o que celebrar: “o Carnaval evoluiu muito, imagine que antes do Ilê não existiam blocos para pessoas negras se destacarem. Os principais de Salvador não aceitavam negros, a não ser que fosse para percussão ou para carregar alegorias. [...] Além do Ilê, outra coisa que também mudou muito o cenário foi o Axé Music e, agora, a gente espera que as novas gerações continuem levando a luta”.
Tudo isso porque, como resume Antônio, o intuito nunca foi criar outro apartheid, mas apenas garantir direitos básicos, a liberdade, o reconhecimento e o acesso ao poder.
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Lutando em Campo Grande
Assim como o Ilê Aiyê lutava na Bahia, o Grupo TEZ surgiu em Mato Grosso do Sul buscando os mesmos objetivos de base. E, agora, ser homenageado ao lado do ícone carnavalesco significa reforçar uma identidade cultural e bagagem de luta que vai longe.
Isso é o que diz a presidente do grupo, Bartolina Ramalho Catanante, conhecida como professora Bartô.
“O movimento negro sempre tem que celebrar, mas também tem o que cobrar. Ao mesmo tempo que temos ações que permitiram o avanço na igualdade de direitos, temos retrocessos”, resume.
Pensando sobre os 40 anos do grupo, a professora cita que precisar ir para as ruas reivindicar o direito de viver é algo que esgota, mas que infelizmente segue sendo necessário. E isso leva para a reflexão de que as lutas de quatro décadas atrás ainda estão presentes hoje.
“Nós fazemos o movimento, fazemos a denúncia, mas também propomos caminhos porque isso é o que nos fortalece. Acredito que agora, nós precisamos pensar também sobre a questão da identidade quando falamos sobre Campo Grande, isso é algo que falta ainda hoje”.
Bartô cita que a capital sul-mato-grossense reconhece sua influência japonesa, assim como a árabe, mas e a negra? Enquanto o Carnaval vem mais uma vez, esse é um questionamento que entra na luta que coexiste com a alegria e que permanece durante todos os outros dias do ano.
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