Herança de família, chácara do Jamil tem mirantes e gravuras de 3 mil anos
De baixo, a localização é Furnas dos Baianos, distrito de Aquidauana. Do alto, é paisagem, natureza e uma vista de encher os olhos e a alma. A chácara que veio até Jamil como herança do pai, virou moradia para ele e a esposa Lúcia na última década e quando a porteira se abriu para o turismo, o simpático dono teve a certeza de que vive e trabalha no melhor lugar do mundo.
Lúcia é do Paraná e Jamil, o sotaque não nega, tem sangue corumbaense. O casal resolveu tomar conta da chácara depois dela passar um tempo abandonada. A propriedade já está na família há 45 anos e aos poucos foi recebendo visitantes. Primeiro escolas, para depois turistas e aventureiros em geral.
O nome oficial é “São Benedito”, pela tradição de colocar nome de santo em terra, mas o fictício e pelo qual todo mundo conhece é “Chácara dos Mirantes”, pelos quatro pontos de apreciação.

“Eu gosto muito daqui, é outra vida e você trabalhar com turismo é fazer amizade a cada final de semana, acho que assim a gente vive melhor do que naquela correria”, acredita Jamil Albuquerque de Moraes, de 54 anos. É ele quem recebe os visitantes ao lado da esposa, Maria Lúcia Dias de Moraes, de 49 anos.
A chácara oferece estrutura de camping, trilhas e rapel. E neste domingo, a convite do Sopa de Pedra Agência de Turismo e Aventura, o Lado B, fez o percurso dos quatro mirantes e o sítio arqueológico. Um caminho de 2 quilômetros que leva 2h30 para ser feito.
Principal guia, Jamil conhece com a palma da mão os 16 hectares da chácara e já avisa: “aqui ninguém sobe desacompanhado. Eu falo sobre os cuidados e acompanho todos os passeios”. Dos quatro mirantes, dois têm altitudes iguais, uma média de 150m acima do nível da chácara e o mais alto está a 250m. “Que é de onde você tem a visão da paisagem mais ampla, é muito legal ver de cima a região do vale das Furnas”, descreve Jamil.
O percurso é considerado bem ativo pelas dificuldades e subidas. Até a primeira parada, o caminho é íngreme, mas de restante, a trilha exige mais habilidade para se passar entre pedras, do que fôlego para subir. “Tem lugares que colocamos cordas e escada. É onde as pessoas mais gostam, devido a essas dificuldades”, completa o guia.
Em cada mirante, o chão traz um traçado em branco alertando que aquele é o limite que não deve ser ultrapassado. E quando se olha aquele “mar” de verde, se tem a certeza de que qualquer cansaço vale a pena. Além do céu, das árvores lá embaixo, adiante estão outros tantos morros.

Cenário perfeito para fotos, a pausa para refletir se faz necessária perto da grandiosidade que os olhos encontram. Para cada ponto de apreciação, uma trilha que exige atenção. Entre o segundo e o terceiro, começam passagem por pedras, uso de corda e até escada, tamanha subida que é.
No roteiro de paradas, o sítio arqueológico é um show à parte. Descoberto em 1983, pelo acaso do que hoje é considerado vandalismo, Jamil era mais “moço” e acompanhado de amigos, passava o Carnaval desbravando a propriedade.
“Viemos para cá em 16 jovens, aí a gente estava fazendo a caminhada e entramos num abrigo rochoso. Um menino até foi escrever o nome na pedra, mas disse que tinha alguma coisa escrita já. Falei não escreve nada não e foi nisso, aí, dessa forma que encontramos o sítio”, conta.
O episódio foi levado para professores de História em Campo Grande e a procura por escolas começou a ser despertada. Mas o reconhecimento só veio através do professor Gilson Rodolfo Martins e pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). “Eles calcularam ser datado de 2,5 a 3 mil anos”, afirma Jamil.
No chão e no teto do abrigo, gravuras e pinturas, desenhos de animais, entre eles dois tatus facilmente identificados. “O que mais chama atenção aqui? É que desperta essa coisa do passado, as pessoas ficam muito curiosas”, exemplifica Jamil.
Além dos mirantes, a chácara oferece ainda rapel de 12m e 60m e um “negativo”, onde o aventureiro não tem contato com as pedras. Para a descida, Jamil e a esposa são os instrutores devidamente autorizados para a atividade.
“Você fala furnas e as pessoas imaginam encontrar uma vilinha de casas aqui, não? Mas são várias chacrinhas, cada um foi comprando a sua propriedade e depois foi declarada quilombola”, resume Lúcia.
Visitante, a funcionária pública Elizabethy Soares, de 53 anos, já não é novata nas trilhas. Na ativa há dois anos, sente no mirante a liberdade que lhe falta na cidade. “Aquilo é maravilhoso, você olhar tudo lá de cima dá uma sensação de poder”, descreve.
Guia do Sopa de Pedra, Nilson Young explica que Piraputanga é eterno. “Cada vez que você volta, tem uma novidade para se mostrar, é só abrir os olhos”, diz. Mais divertida que desafiadora, ele fala que a trilha é pensada para qualquer pessoa, independentemente da condição física.
Desde o início do ano, superação é o que define a médica veterinária Miwa Fabiane, de 27 anos. “O mais interessante é isso, superar. A cada trilha você tem um momento de transformação e vê que é capaz de muita coisa”.

Como chegar – A instrução certinha é dada por Lúcia. Os motoristas precisam pegar a Estrada Parque em Piraputanga, entrar na Furnas dos Baianos I e seguir a placa da fazenda Novo Horizonte. Indo assim, a chácara dos Mirantes é a última propriedade.
Para o passeio, é preciso reservar com antecedência. A estrutura de camping custa R$ 20,00. O rapel tem nos valores de R$ 30 até R$ 90,00 e a trilha, a média é de R$ 30,00. Os telefones de contato são: 9-8455-1964 e 9-9193-9094.
Para Jamil, receber visitantes ali é o maior estímulo. "O combustível para a gente é quando as pessoas chegam e admiram o local, gostam. Isso que incentiva a gente que está trabalhando com isso. Ficamos felizes de ver a satisfação das pessoas quando vê esse contato que a gente tem direto. Eu, por exemplo, nunca vou ficar enjoado dessa paisagem", diz.