Nem o uniforme consegue apagar a personalidade nas lanchonetes da cidade
São cinco, dez minutos ou até uma hora, todos os dias em frente ao espelho, o de casa ou atrás do balcão mesmo, para o cliente não perceber. Mesmo com a imposição do uniforme na maioria das lanchonetes de Campo Grande, as atendentes conseguem ser diferentes diante do mesmo, nem que seja no detalhe.
É o estilo de cada uma, a moda, que ao contrário da critica, no lugar de padronizar, expõem as diferenças.
O batom forte na boca mostra força. Um pequeno brinco é a delicadeza. São detalhes mínimos para identificar quem está ali, atendendo mais de 8 horas por dia, em alguns casos, e quase não é notada.
É só ter a vontade de observar para descobrir como é bacana a tentativa de mostrar quem cada um é. Desde o rapaz responsável pelo parquímetro, que deixa a gola da camisa do uniforme em pé, para se destacar, ao lado da colega de trabalho de cabelo vermelho.
Nos bares, para mostrar a personalidade, vale até o que pode parecer exagero, como nos cílios bem coloridos, brilhantes, ou a sobrancelha pra lá de marcada...
Elaine Garcia, de 30 anos, perde 1 hora diariamente em frente ao espelho se maquiando. Economiza no tempo de escolha da roupa, já que não resta nada além do uniforme que tem como variação somente a cor: branco ou amarelo. Mas até isso elas querem mudar.
“Já estamos pedimos um vermelho, é mais feminino”. Esse é o pedido a patroa das mais de cinco funcionarias de uma lanchonete de comida chinesa do Pátio Central. Para Elaine, a maquiagem é uma forma de mostrar que além de profissional também é mulher. “Não sou apenas um robô, sou um ser humano, com vontades e truques”.
Como outras colegas pela cidade, ela exibe nova tendência, unha “filha única”, com 8 de uma cor e duas de outra.
“Tem que ter o básico, senão a gente assusta o cliente”, brinca Silvana sobre a vaidade. Aos 36 anos, é atendente em uma pastelaria desde 2008. Retocar a maquiagem a cada hora é um das obrigações e entre um pedido e outro da uma olhada no espelhinho para ver se está tudo certo. “Apesar de ainda ser solteira, o cuidado arranca elogios dos clientes”, comemora.
Juliana Silva de Jesus, de 33 anos, abre o sorriso ao contar que a preparação do visual do trabalho começa cedo, mas não só pela vontade de ficar bonita. Às 5 da manhã já enfrenta ônibus cheio para ir trabalhar, mas adianta: “Venho de ônibus, mas venho maquiada, com direito a sombra e blush”. O piercing na língua só é mais uma mostra de que a personalidade não se deixou esconder pelo uniforme.
Mesmo com a timidez evidente, Alice Silvestre, de 28 anos, atendente em um café é enfática quanto à aparência “Minha rotina de beleza começa com hidratante facial, base e corretivo, tudo para ficar melhor para o cliente”.
No meio do movimento de uma lanchonete na rua 14 de Julho, quase esquina com aa Afonso Penas, às 15h, no inicio de uma semana, duas meninas correm “pra lá e pra cá” para dar conta dos pedidos, e é impossível não reparar nos cílios das atendentes, nas cores azul e lilás, que parecem dar alegria as duas trabalhadoras uniformizadas da cabeça aos pés.
A patroa, uma chinesa, de aparente temperamento difícil, parece não gostar dos adereços femininos ocidentais, tanto que não deixou as meninas serem fotografadas em horário de expediente. Que pena!