Nem tratamento de câncer afastou Rosani dos loucos por hambúrguer
Há dez anos, ela começou a trabalhar como atendente de telefone e tempos depois, se tornou proprietária
Durante o tratamento que segue em ação contra um câncer de mama, Rosani Aparecida Pedro, de 63 anos, só ficou afastada do serviço duas semanas e ainda a contragosto. Apaixonada pelo contato com os clientes, ela resume que durante os dez anos de serviço atendendo em uma hamburgueria, nem o doloroso tratamento da doença conseguiu afastá-la do trabalho.
Na última década, Rosani se viu deixando de ser funcionária e se tornando proprietária do negócio pelo qual criou amor. Em meio a essa mudança positiva, turbulências entraram no jogo e, de acordo com a empresária, o que seguiu em pé foi o gosto por conhecer cada cliente e manter o humor em ação.
Retornando para a trajetória da história, a empresária conta que conheceu hamburgueria em Campo Grande após morar em São Paulo e retornar para Mato Grosso do Sul. “Eu trabalhava no setor comercial de uma revista lá e voltei para cá. A antiga dona da hamburgueria queria criar um delivery, tudo sem sistema, sem aplicativo. Como era de noite, pensei que daria para tentar”, explica.
Assim foram alguns anos cedendo sua voz para o delivery apenas por ligações e, tempos depois, ela deixou a companhia do telefone e passou a atender os clientes cara a cara. Rosani detalha que, no início, pensou que a ideia não fosse dar certo, mas acabou gostando ainda mais do novo convívio mais próximo com o público.
Já em 2019, quando imaginava que a rotina não teria fim e que sair do ramo não era opção, foi avisada pela então proprietária da Burger & Co. que o negócio seria vendido. “Ela sabia que eu era apaixonada pelo lugar e me disse que, por isso, acreditava que eu seria uma boa proprietária. Falei com minha filha, com meu genro e conseguimos fechar a compra.”
Novas etapas e dificuldades
Com tudo em mãos e, como ela brinca hoje, para se aposentar na hamburgueria só aos 100 anos, Rosani arregaçou as mangas e abraçou ainda mais o trabalho. Até que as maiores dificuldades apareceram quase como um balde de água fria: câncer e pandemia.
Ela relembra que logo no início de 2020, foi diagnosticada com câncer de mama e durante todo o processo de cirurgia, radioterapia e quimioterapia, o que continuou em pé foi a presença na hamburgueria. Filha, Maria Augusta Bravo Ferraz, de 26 anos, detalha que foi necessário convencer a mãe de parar por duas semanas e deixar o atendimento em suas mãos.
“Foram só duas semanas de afastamento durante todo o período e isso porque ela estava com o dreno. Ela precisando descansar e falando que queria voltar, que nem precisava trabalhar, só ficar por perto mesmo. Tivemos que deixar”, Maria conta.
Reforçando que o trabalho a salvou, Rosani narra que por alguns segundos queria deixar as bandejas de lado e se afastar, mas sabia que se entregar às dores não era uma opção para ela. “Os clientes se preocupavam comigo e isso me ajudou muito. Todo muito perguntava como eu estava, me apoiaram quando perdi meu cabelo e no fim, isso foi o mais importante.”
Em meio às sessões de combate à doença, a segunda parte do desafio e que não podia ser impedida pelo amor ao atendimento chegou. A pandemia de covid-19 veio e por mais que Rosani e a família quisessem seguir com portas abertas, as restrições vieram para mudar mais uma vez o cotidiano.
Ela conta que um novo foco no delivery precisou ser desenvolvido e o costume em ver o público sendo atendido presencialmente foi forçado a reduzir. “Nós perdemos muitos clientes, porque grande parte eram famílias que gostavam de ir até a hamburgueria. Aquele contato foi reduzido e mudou tudo.”
Com a redução do público, a empresa precisou fechar as portas da sede inicial e encontrar um novo espaço para não encerrar a história de vez. Rosani detalha que mais do que a dor sentida pelo tratamento contra o câncer, o sofrimento de precisar se desfazer das decorações e detalhes da hamburgueria foi intenso.
Alguns quadros foram levados para o novo endereço, mas a maior parte da decoração foi vendida para pagar os custos de funcionamento. Hoje, a proprietária diz que uma nova reinvenção está sendo feita e que segue sem conseguir imaginar um encerramento para a narrativa.
“Com certeza, foi continuar indo para o trabalho que me ajudou contra o câncer. Eu sempre gostei de vir para cá e não tinha como parar. Agora, a gente segue assim, atendendo as pessoas e reconquistando de pouco em pouco.”
Paixão pelas vendas
Por ter trabalhado durante toda a vida com vendas, criar um modo de comercializar os hambúrgueres só na voz acabou sendo mais um prazer do que dificuldade. Relembrando esse período, a hoje proprietária diz que quando mudou de setor e passou a mostrar o rosto aos clientes, os comentários sobre “a voz” eram generalizados.
Os clientes me conheciam só pela voz no telefone e quando comecei a atender no salão, ficava ouvindo ‘Olha, será que é ela?’, ‘Poxa, tinha criado uma outra imagem de como você seria’”, brinca.
Orgulhosa de ter clientes antigos, Rosani diz que por ter criado amor pelo ramo alimentício, foi desenvolvendo percepções sobre como vender a paixão para os outros. “Eu sempre brinquei muito com os clientes e atendo cada um sabendo das necessidades. Isso porque se você ama algo, você vai vender de um jeito muito melhor. Precisa amar.”
Comprovando que o amor da sogra não é brincadeira, o genro Rodrigo de Queiroz Gorostides, de 28 anos, pontua que até um busto de Rosani vai precisar ser criado em algum momento para marcar a paixão pelas vendas de hambúrguer.
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